Ao cabo de 15 anos a explorar gás natural em Pande e Temane a multinacional sul-africana Sasol nunca contratou directamente serviços ou comprou bens a uma das Micro, Pequenas e Médias empresas (MPME) existentes na província de Inhambane. “O que nós percebemos é que realmente nunca houve boa vontade da Sasol em colaborar com o empresariado local”, disse ao @Verdade o presidente do Conselho Empresarial de Inhambane, Amade Osman.
Há duas semanas a Sasol realizou em Maputo, e em Inhassoro, o lançamento de uma iniciativa denominada programa de conteúdo local dedicando “um dia aberto” para que representantes de empresas moçambicanas, fornecedores actuais e potenciais pudessem interagir directamente com a empresa. “Esta foi a primeira vez em 15 anos que existe um encontro do género e graças a insistência do sector privado da província”, disse em entrevista telefónica o presidente do Conselho Empresarial de Inhambane.
“Nós fomos criando todas as condições mas nestes anos todos não conseguimos encontrar espaço de diálogo com a Sasol” afirma ainda Amade Oman revelando que encontro só foi possível graças a intervenção do novo Governador da província Daniel Chapo.
A Sasol, que beneficia de grandes isenções fiscais em Moçambique e ainda revende o gás natural que explora em Pande e Temane desde 2000 a sua empresa “mãe” na África do Sul a preços considerados abaixo do mercado, divulga num prospecto distribuído no evento que tem como oportunidades de negócios para as MPME´s moçambicanas serviços de manutenção, fornecimento de bens, serviços de segurança, saúde e meio ambiente, gestão de instalações entre outros.
Porém só neste encontro que aconteceu em Junho é que os empresários de Inhambane tiveram acesso pela primeira às condições gerais para concorrer às oportunidades de negócios com a Sasol. “O que nós percebemos é que realmente eles têm várias linhas para este tipo de empresas mas de acordo com aquilo que nos disseram em princípio é necessário que a empresa esteja inscrita na base de dados deles e para que isso aconteça há certos requisitos que devem ser observados. Agora também o que podemos perceber é que mesmo querendo estas empresas aqui (PME´s locais) vão ter muitas dificuldades porque há uma série de exigências que para as nossas empresas actualmente muitas delas ainda não reúnem os requisitos todos” explica o presidente do Conselho Empresarial de Inhambane.
“Eles dizem que como são empresa de nível internacional há algumas normas que devem ser observadas. Em termos práticos eles exigem muita qualidade e dentro da qualidade existem alguns pressupostos quer devem ser observados que para o nosso nível, aqui localmente, é um pouco difícil, talvez possa trazer vantagens para um grupo de empresas se se juntarem com as suas próprias vantagens”, acrescenta Amade Osman clarificando que os empresários de Inhambane nunca tiveram conhecimento destes pré-requisitos.
“Até blocos de construção não recorrem aos que existem na zona”
“A dado momento fomos ficando surpreendidos por ver empresas estrangeiras a entrarem aqui no país e a trabalharem com a Sasol sem que nós pudéssemos ter essas informações do que é que a Sasol afinal precisa e como aceder a esses serviços e a essas oportunidades” declara ainda o representante dos empresários de Inhambane.
De acordo com um prospecto da gigante petrolífero sul-africano quando se trata da contratação de serviços e bens abaixo dos 40 milhões de meticais não há lugar a concurso público, a empresa emite “uma solicitação de cotação quer para as empresas registadas na Sasol quer para outras empresas que tenham mostrado interesse em fazer negócios com a Sasol”.
Contudo o presidente do Conselho Empresarial de Inhambane afirma que os empresários locais não sabiam “que era necessário cadastrar a empresa então também se tornava impossível saber o que se podia fazer. O primeiro passo que foi dado aos presentes foi o preenchimento de umas fichas para se cadastrarem e dizem que vão introduzir na base de dados deles”.
“Nós temos empresas aqui ligadas aos vários tipos de serviços, agora de acordo com aquilo que é a exigência do momento, por exemplo até blocos de construção não recorrem aos que existem na zona. Não vão dizer que os blocos não têm qualidade, o problema para eles é que essa empresa para fornecer-lhe tem que estar lá cadastrada e sendo elegível. Muita das vezes estes materiais todos são importados e em algum momento para o empresariado local que julgava que a Sasol poderia trazer alguma mais valia realmente há qualquer coisa que aqui não está bem. Nós pensamos que este encontro só não foi suficiente, nós vamos tentar persuadir que existem outros onde com um pouco mais de detalha possamos ir percebendo como é que paulatinamente as nossas pequenas e médias empresas possam reunir estes requisitos e tornem-se elegíveis para estes serviços da Sasol”, refere Amade Osman.
Para a aquisição de bens e serviços cujos contratos ultrapassem os 40 milhões de meticais a Sasol refere que “os requisitos comerciais serão anunciados no jornal local, bem como a proponentes de pré-qualificados”.
Acontece que para os jornais que a Sasol usa para divulgar esses concursos ou chegam tarde ou nem são vendidos na província de Inhambane, declarou ao @Verdade o presidente do Conselho Empresarial de Inhambane. “Eles disserem que precisávamos de ter mais encontros para procurarem encontrar uma outra maneira, talvez possam ajudar fazendo algum consultoria às empresas poderem responder às suas exigências de elegibilidade para o fornecimento de serviços à Sasol”, acrescenta o nosso entrevistado.
“Nunca houve boa vontade da Sasol em colaborar com o empresariado local, nestes 15 anos”
Pesquisas académicas realizadas por investigadores do Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE) concluíram que “O desenvolvimento de conteúdo local permite aumentar a contribuição dos megaprojectos de investimento directo estrangeiro para a economia por via de absorção adicional de recursos e pode constituir uma das fontes de fomento da industrialização e de alargamento da base produtiva da economia moçambicana, caracterizada por limitadas oportunidades de negócios e de emprego formal. No entanto contrariando as elevadas expectativas, as ligações estabelecidas entre megaprojectos e fornecedores locais até agora são poucas e têm um impacto reduzido”.
Em Fevereiro desde ano a multinacional sul-africana iniciou a abertura do primeiro poço de petróleo no nosso país, nas reservas de Pande e Temane, na província de Inhambane, onde a Sasol actualmente produz e processa gás natural.
A Sasol e o Governo de Filipe Nyusi não divulgaram os detalhes do contrato de Partilha de Produção ou do acordo de Produção de Petróleo deste novo empreendimento estimado em 2 biliões de dólares norte-americanos. Não se sabe também que incentivos fiscais este novo empreendimento beneficia.
“O que nós percebemos é que realmente nunca houve boa vontade da Sasol em colaborar com o empresariado local, nestes 15 anos quero acreditar que já deveriam ter-se aproximado do sector privado. Se nestes 15 anos nunca houve esta vontade e só aconteceu agora porque nós fomos pressionando significa que eles não estavam muito interessados nisso”, lamenta o presidente do Conselho Empresarial de Inhambane que no entanto afirma que os empresários vão continuar a trabalhar “para que consigamos sentir que vale a pena termos aqui uma empresa como esta, que possa trazer ganhos para os moçambicanos. Não estamos a dizer as empresas só de Inhambane mas que as empresas de Moçambique que possam ter oportunidade para ganhar com estes projectos cá implantados”.
De acordo com a Confederação das Associações Económicas de Moçambique nesta década e meia somente cinco empresas nacionais tiveram essa oportunidade, “Praticamente, tudo trazem de fora” disse Eduardo Sengo, director executivo adjunto.
Além de não gerar negócio directo para as Micro, Pequenas e Médias empresas (MPME) a Sasol não tem criado empregos para os moçambicanos, empregava apenas 147 cidadãos nacionais sendo que nem todos são naturais da província de Inhambane por isso 67,1% dos manhambanas continuam a ter como principal fonte de rendimento a agricultura, silvicultura e pesca.
O impacto deste megaprojecto no desenvolvimento da chamada “terra da boa gente” tem sido quase nulo, de acordo com o Instituto Nacional de Estatística a maioria dos manhambanas continua a viver em casas de caniço e zinco, sem água canalizada e electricidade e com latrinas não melhoradas.