Uma noite memorável: são as únicas palavras que definem fielmente o espectáculo proporcionado pelo guitarrista moçambicano João Cabral na noite da última sexta-feira, onde não faltou cor, luz e adrenalina. É a terceira vez que o artista tocou no Sheik, tendo recebido, desta vez, muito carinho e rasgados elogios do público.
“Cabral é um músico brilhante, as suas músicas chegam-nos aos ouvidos com uma leveza impressionante”, comentou um espectador. O recinto do espectáculo estava relativamente cheio de fãs e admiradores daquele guitarrista moçambicano. Era visível no público que se fez presente no concerto de Jazz Standard a ânsia por um show inesquecível. E Cabral não defraudou as expectativas, fez jus à sua popularidade espalhando muita energia e charme. Acompanhado por Alcides Carlos na guitarra, Artur Matsinhe no baixo e Almeida na bateria, João Cabral provou que nasceu para a música.
O quarteto constituído por amigos brindou o público, na primeira parte do show, com os temas da banda. E os minutos que se seguiram foram preenchidos pelas músicas da figura de cartaz, com o seu “Rivers of Dreams”, álbum lançado em Setembro de 2009. Não faltou uma interacção com o público, onde Cabral sentiu o calor humano dos espectadores ávidos de o verem a apresentar as músicas do seu novo trabalho discográfico. Para começar, o músico serviu um tema bastante popular entre os amantes do estilo musical Jazz, “La Calibras”.
Trata-se da faixa número sete no álbum “River of dreams” e deixou o público num estado de puro delírio. A emoção era enorme e estava estampada no rosto dos presentes. Através de um solo e dedilhos, a “La Calibras” retrata que todo o ser humano “tem aquele bichinho, meio narcisista”, escondido algures no âmago do seu ser. O jovem guitarrista Artur Matsinhe também não deixou os seus créditos em mãos alheias, ou seja, esteve em grande estilo no show. No compasso do baixo, Artur foi ao encontro dos temas que perfazem o álbum “Rivers of Dreams”. Além da música “La Calibras”, compõem o “Rivers of Dreams” temas como “Invocation”, “Va jula kutsaka”, “Mama mina”, “African soul”, entre outros com os quais o JC brindou os seus fãs e admiradores.
Refira-se que Cabral largou a carreira de informático, após concluir os estudos na Universidade Eduardo Mondlane, a sua família e rumou para Cape Town, com o fim de realizar o seu sonho abraçando a carreira de músico profissional. Obteve a pós-graduação em “Jazz performance” pela reputada escola de música da Universidade da Cidade do Cabo. Mas diga-se, em abono da verdade, que Cabral desprende-se das fórmulas obtidas na carteira de uma escola.
(@VERDADE) – Qual é a diferença entre o Duas Caras de o “País da Marrabenta” e o que encontramos no CD “Linha da Frente”?
(Duas Caras) – Sem dúvida alguma há uma diferença enorme em vários aspectos. Acho que o facto de terem passado oito anos desde que fizemos o primeiro álbum da Gpro, “Um passo em frente”, muita coisa aconteceu. Já não tenho 25 anos e, por isso, acredito que muita coisa tenha mudado. Aliás, não apenas no que concerne à música, mas também ao indivíduo. Na verdade estou mais maduro, tenho 30 e já não penso da mesma forma, o que influencia, no meu entender, de algum modo a concepção da minha música. Há 10 anos falava de uma forma mais libertina e hoje sou mais cauteloso. Hoje não seria capaz de fazer o “País da Marrabenta”.
(@V) – Porquê?
(DC) – Por vários motivos: já não olho para o Ritmo Arte e Poesia (RAP) apenas como uma forma de expressar sentimentos, mas também como algo que me dê algum dinheiro; já não faço RAP só para os rappers ou para as pessoas que gostam do ritmo.
(@V) – No MMA disseste que há pessoas que fazem música com uma vertente política para ganharem dinheiro e que a Gpro já tinha feito isso…
(DC) – Não significa que ao se falar mal dos políticos ou quando se abordam temas de cariz político isso dê dinheiro. Quando disse isso as pessoas relacionaram as minhas palavras com o Azagaia, mas eu não acredito que ele tenha feito isso para ganhar dinheiro. Acho que o que aconteceu com ele foi uma consequência. Efectivamente, não conheço nenhum rapper que faz música naquela vertente que se tenha dado tão bem quanto o Azagaia, mas também devo reconhecer que não escuto muito o RAP nacional.
(@V) – Como é que o Duas Caras olha para um músico que critica o poder instituído e se diz representante do povo, mas que se associa a um partido político?
(DC) – É algo que dá que pensar. Acho que alguém como Azagaia se, por alguma razão, se envolver em política, vai deitar tudo aquilo que fez por terra.
(@V) – Qual é a tua melhor música?
(DC) – É difícil, mas cada música tem a sua história. Às vezes, as músicas de que as pessoas gostam menos são das que eu mais gosto. Por exemplo, gosto muito de “Sinais dos tempos”, Kara Boss, Geração Tv, País da Marrabenta.
(@V) – Nos últimos tempos, as tuas aparições são marcadas por um novo nome: Kara Boss. Isso é uma ruptura com o Duas Caras?
(DC) – Kara boss significa maturidade. Como disse no início, já não faço as mesmas coisas, já não acredito nas mesmas coisas. Fundamentalmente, Kara Boss, para além de ser a transição do rapper, é também tendo em conta que faz música para o mundo, e pela qualidade dos vídeos que nós fazemos, os quais podem ser ouvidos em qualquer parte do mundo.
(@V) – Para quando o lançamento do álbum de Duas Caras?
(DC) – É difícil responder a essa questão porque não depende apenas de mim. Se dependesse apenas de Duas Caras seria o mais breve possível. Trabalho como uma equipa e há aspectos que não são consensuais, entre as partes, penso que o disco ainda vai levar o seu tempo. Não porque não haja material suficiente porque tenho mais de 20 músicas, mas se calhar porque tenho de lançar um clássico, isso para não defraudar as expectativas das pessoas.
(@V) – Consegues viver da música?
(DC) – Ganho mais do que três salários mínimos, mas para um artista e para uma figura influente, acho que podia ter mais. Mas esta é a nossa realidade, acho que temos de trabalhar mais.
(@V) – O que os fãs que comprem um CD de Duas Caras esperam encontrar?
(DC) – Podem esperar um Duas Caras mais versátil possível, em termos de flow e temática, na verdade um bom álbum. Até porque neste momento sou apologista da boa música.
(@V) – Como olhas para o conflito com o Mega Júnior?
(DC) – Isso para mim é uma coisa que está ultrapassada, mas não nego que é algo que faz parte do meu currículo.