Terminaram, nesta semana, as matrículas para o ano lectivo de 2011, um processo caracterizado no início por uma afluência a conta-gotas e, no final, por uma torrente de rebentar comportas. Muita procura para pouca oferta. Resultado: uma vez mais, muitos jovens e crianças não vão estudar nas escolas públicas, apesar de o Ministério da Educação ter garantido o contrário.
Das 9 às 15 horas da quinta-feira, 6 de Janeiro, até o dia 11, data limite das matrículas, viveram-se momentos anormais nas escolas e bancos que levaram a cabo o processo em todo o país, segundo reportaram os meios de comunicação social ao longo da semana. Era uma corrida contra-relógio.
Na segunda-feira, dia 10, quando o processo atingiu o auge, muitas pessoas na cidade de Maputo começaram a abandonar os bancos alegando que o fariam mais tarde. “ Quero matricular o meu filho, mas nada mais me resta senão desistir. Veja só como a fila é enorme. Fica para depois”, disse uma mulher de 40 anos que tentava fazer o depósito numa das agências da Avenida Eduardo Mondlane, na zona do ponto final.
Enquanto uns desistiam, outros procuravam a sorte em pontos diferentes. Fernando Mateus, aluno da 11ª classe da Escola Secundária da Polana foi um deles.” Vou batalhar numa agência da baixa. Lá tenho um conhecido que me vai facilitar a vida”, disse visivelmente apressado. “Continuar a esperar aqui pode trazer-me mais dissabores”, acrescentou.
As agências do Alto-Maé e Ponto Final foram os locais mais concorridos e que registaram as maiores enchentes. “ Escolhi este lugar porque é estratégico. Vivo em Hulene e ao longo daquela área, incluindo os bairros Magoanine, Laulane, CMC e Albasine não existe qualquer agência deste grupo”, disse um munícipe, apoiado por vários outros.
De quem é a culpa?
Segundo opiniões, tudo correu mal porque as pessoas têm o hábito de deixar as coisas para o fim e também por causa da frequente falta de estratégias adequadas ao país. De Nampula, por exemplo, vieram informações dando conta de que pais, encarregados de educação e alunos de diversas escolas de ensino secundário ficavam longas horas nas filas dos bancos comerciais, à espera da vez para efectuar o pagamento das taxas.
Vários cidadãos acham que o problema resulta da decisão das autoridades da Educação de recorrer aos bancos ao invés do sistema anterior em que as próprias escolas faziam a cobrança. “Não dá para continuar a entregar uma missão destas aos bancos, sobretudo um que tenha uma cobertura residual como este”, comentaram.
Em Lichinga, cidade que acolhe a única agência do banco na província do Niassa, não faltaram reclamações. Em Tete também. Consta que as restantes províncias não foram excepção. A gerente de uma das agências situadas na Avenida 24 de Julho, na cidade de Maputo, disse que nessa situação só se pode responsabilizar as escolas, que não impõem limites. “Como banco, apenas nos cabe a missão de gerir o processo em termos monetários”, disse acrescentando que “até ao momento está tudo a correr bem. Vamos efectuar todos os depósitos”
Escassez de vagas
Desde o princípio, o Ministério da Educação, através do porta-voz Manuel Rego, reconheceu a falta de vagas sobretudo nos níveis da oitava e 11ª classe. Sem adiantar números, Rego disse que muitos ficariam sem estudar nas escolas públicas, restando-lhes a alternativa de recorrer ao ensino técnico-profissional ou privado.
Por outro lado, muitos pais tentaram em vão inscrever pela primeira vez os filhos. Segunda-feira às 13 horas, num panfleto escrito em letras maiúsculas e colado na entrada da Escola Primária da Coop na cidade Maputo lia-se: “Já não há vagas”.
“Todos os anos são assim, mas desta vez foi rápido. Até às 11h3o já não tínhamos um lugar sequer”, disse um funcionário local. Para 2011 estava previsto matricular 150 novos alunos naquela escola.
Na Escola 3 de Fevereiro as vagas terminaram 30 minutos depois de as matrículas terem iniciado, ou seja, às 12 horas do mesmo dia, um estabelecimento que tinha disponíveis apenas 134 lugares, o que provocou a ira de alguns pais e encarregados da educação. “Algo falhou e acho que não houve transparência”, comentaram.
A directora da escola reconheceu a redução de vagas e justificou que tal aconteceu porque a 3 de Fevereiro introduziu o sistema de dois turnos para garantir que as crianças fiquem mais tempo na escola, contrariamente ao que acontecia com o sistema de três turnos que terminou no ano passado.
Às 11 horas da terça-feira, dia 4, a Escola Primária Completa Estrela do Oriente, em Laulane, que tinha 300 lugares para alunos nascidos em 2005 não recebia mais ninguém. “Não é verdade. Ainda existem vagas. Querem candongar as que restam. Já assistimos a isso noutros anos”, comentavam as pessoas em surdina, o que se foi repetindo nas escolas primárias de Maxaquene “C”, Sete de Setembro, Polana Caniço, Magoanine, a Luta Continua entre outras. Em todo o país existia 1.2 milhão de vagas para a primeira classe, não se sabendo ainda quantas foram preenchidas.
“Nenhuma criança ficará sem estudar, sobretudo na primeira classe”, garantiu o porta-voz do Ministério da Educação no princípio das matrículas. A realidade no terreno, sobretudo nos bairros suburbanos onde vivem os que não tem posses, traça cenários de famílias aflitas, desesperadas e sem alternativa para garantir um dos direitos elementares para qualquer cidadão: a educação.
MINED e escolas têm a palavra
O Ministério da Educação e as escolas reiteram a existência de mais lugares para todos, sobretudo nas primeiras classes. Como e onde? Não se sabe, mas haverá soluções. Em contacto com @Verdade esta quarta-feira, a substituta do porta-voz do Ministério voltou a manifestar optimismo. Em relação às preocupações dos que não fizeram os depósitos em tempo útil assegura-se que as escolas darão uma oportunidade, bastando apresentar-se o talão de depósito.
“Vamos inscrever mesmo depois de uma semana, mas não basta ter o talão, é preciso também constar nas listas que nos vieram das escolas”, disse o funcionário de um estabelecimento escolar de Maputo. Algumas escolas cumpriram as metas na data limite, outras prolongaram por um dia, mas a procura foi menor. Tal aconteceu na Escola Secundária da Polana.
Quanto aos problemas bancários, o MINED entende que é uma questão de estruturação e coordenação. “De facto um banco só não é suficiente, mas isso depende mais de cada escola e os bancos por que optam. Mas há locais onde tudo correu bem”, reitera. Pelos dois dias de luto pela morte de Malangatana, o Ministério da Educação alterou de 14 para 17 a data de abertura do ano lectivo escolar. As aulas arrancam no dia 18 de Janeiro.