As mudanças climáticas são um termo desconhecido para a maioria dos moçambicanos. Já as secas, cheias e calamidades naturais são recorrentes, pois muitos de nós já vivem na pele os seus efeitos. Moçambique, não só pela sua localização geográfica, mas também pelas opções políticas de quem nos tem governado ao longo de 40 anos é bastante vulnerável a qualquer chuva ou vento mais forte ou mesmo a pequenos atrasos na queda de precipitação. A partir desta segunda-feira (30) líderes do mundo inteiro, o nosso país estará representado pelo Primeiro-Ministro, reúnem-se na capital da França para tentarem chegar a um acordo para lutar contra as mudanças climáticas e conter o aquecimento global, para que não ultrapasse os dois graus centígrados. Se é verdade que nenhum país pode resolver o problema sozinho também é verdade que propostas que Carlos Agostinho do Rosário leva para a Cimeira do Clima (COP 21) não são muito promissoras. “Nós não temos que estar a pedir esmola ou a querer fazer negócio no meio desta crise”, afirma a ambientalista Anabela Lemos para quem existe “obrigação dos países ricos pagarem o que eles fizeram, não foi África que criou a situação da crise climática”.
A partir dos dados recolhidos entre Janeiro e Setembro deste ano, cientistas britânicos determinaram que no final deste ano a temperatura média no planeta terá sido 1,02 grau maior que a média registada entre 1850 e 1900.
“Sabemos que a acumulação de emissões de dióxido de carbono (CO2) será fundamental para determinar o aquecimento que veremos no futuro”, ressalta o relatório da agência de meteorologia britânica (Met Office), que considera que “ainda é possível” conter o aumento das temperaturas.
Os pesquisadores afirmam que o recorde que será superado previsivelmente neste ano se deve às emissões de CO2 combinadas com o impacto do fenómeno climático El Niño, relacionado com o aquecimento do oceano Pacífico e que este ano atravessa um ciclo especialmente activo.
“Está claro que é a influência humana o que levou o clima moderno rumo a um território inexplorado”, disse o director do escritório para a mudança climática da Met Office, Stephen Belcher, citado pela agência EFE.
PROSAVANA
É certo que África está a ser afectada por uma crise climática para a qual não contribuiu significativamente, afinal, segundo estudos científicos, o aumento da concentração na atmosfera de gases de efeito estufa resultam principalmente da queima de combustíveis fósseis (carvão mineral, petróleo e gás natural) e do derrube de florestas tropicais.
Mas o desenvolvimento baseado na exploração de recursos minerais fósseis e na desflorestação tem sido responsabilidade dos governantes africanos, como tem acontecido, e deverá continuar a acontecer, em Moçambique.
É que enquanto os Governos de Guebuza e Nyusi apostam no PROSAVANA como solução para a nossa agricultura a ONU recomenda, desde 2011, uma forte mudança em direcção às tecnologias verdes na agricultura como forma de superar a crise alimentar endémica e incrementar o apoio para abastecer a população do planeta.
“A segurança alimentar deve agora de ser obtida por meio da tecnologia verde para reduzir o uso dos insumos químicos – fertilizantes e pesticidas – e tornar mais eficiente o uso da energia, da água e dos recursos naturais”, refere o relatório Levantamento Económico e Social Mundial da ONU que acrescenta que é essencial um distanciamento dos sistemas agrícolas intensivos e em larga escala para reduzir a degradação ambiental e do solo.
Por outro lado, o Executivo moçambicano, nos compromissos e contribuições que levou para a Cimeira do Clima (Intended Nationally Determined Contribution of Mozambique to the United Nations Framework Convention on Climate Change) refere o REDD como um dos programas a aplicar para mitigar as mudanças climáticas.
Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal
Ora, segundo os ambientalistas, a Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal (REDD) não reduz as emissões de carbono nem detém o desmatamento, é uma nova forma de colonização, obrigando as comunidades a dedicar as suas energias a plantar e a cuidar de árvores, e fornecendo campos de cultivo ao invés de produzir comida.
Esta situação é agravada pelo facto de as mesmas comunidades não beneficiarem de nenhuma remuneração com esta actividade. Nos casos em que há remuneração, os valores são irrisórios e não permitem o desenvolvimento das populações.
Segundo os ambientalistas o REDD+ é uma solução falsa para a mudança climática promovida pelas Nações Unidas, pelo Banco Mundial e pelas grandes multinacionais que exploram recursos minerais como a Shell, ENI, Vale, Jindal ou BHP Billiton. “O REDD foi basicamente concebido como um escape para os poluidores de países industrializados poderem continuar a poluir enquanto assumem que a poluição é compensada com florestas noutros lugares”.
“As plantações da Portucel e da Green Resource estão em áreas com muita água e essas plantações vão dar cabo dessa água toda, uma árvore de eucalipto precisa no mínimo de 20 a 25 litros de água por dia para crescer, imagine isso na escala das necessidades de uma plantação. Depois são plantas exóticas que vão completamente descontrolar o ambiente e destruir o nosso ecossistema nativo” afirma Anabela Lemos, da organização não-governamental Justiça Ambiental.
Economia Verde
Os executivos do partido Frelimo também falam muito em Economia Verdade mas em termos práticos pouco ou nada tem sido feito em Moçambique para que se reduza o uso de combustíveis fósseis (gasolina, carvão, diesel, etc.) e se utilizem mais fontes limpas e renováveis de energia.
São visíveis os poucos investimentos públicos nos transportes urbanos, por exemplo, o que tem contribuído para o aumento do parque automóvel nos centros urbanos o que, a médio e longo prazo, além do caos, irá continuar a propiciar as emissões de carbono dos veículos movidos a gasolina ou diesel.
Também são necessários mais investimentos públicos, e não pequenos projectos como têm sido efectuados, nas energias renováveis como a solar ou eólica, uma vez que Moçambique possui um grande potencial.
A Economia Verde também é caracterizada por uma eficiente utilização de recursos naturais, mas na prática o que se vê são mais explorações intensivas desses recursos como a terra, o carvão mineral ou mesmo o gás.
“Nós os africanos estamos a ser um bocado ingénuos, ninguém está a pensar em nós, nós é que temos de pensar por nós. Nós é que temos que ver o que nós queremos, quais são os impactos que vamos ter e exigir tecnologia e apoio financeiro sem condicionalismos. A obrigação é os países ricos pagarem os que eles fizeram, não foi África que criou a situação da crise climática. Não temos que estar parece a pedir esmola ou a querer fazer negócio no meio desta crise” acrescenta a ambientalista moçambicana da Justiça Ambiental.
O tratamento adequado do lixo com sistemas eficientes de reciclagem é outro quesito de uma Economia Verde. São visíveis os resultados das políticas a esse nível em Moçambique em que nem o próprio Governo cumpre as suas próprias leis como é o caso da Lei de Ordenamento do Território que existe desde 2007 mas em termos práticos as províncias, os distritos e os municípios ainda não têm até hoje tal ordenamento aprovado.
A existirem, os Planos de Ordenamento Territorial permitiriam o aproveitamento racional e sustentável dos recursos naturais, a preservação do equilíbrio ambiental, a valorização dos diversos potenciais de cada região, a promoção da qualidade de vida dos cidadãos, o equilíbrio entre a qualidade de vida nas zonas rurais e nas zonas urbanas, o melhoramento das condições de habitação, das infra-estruturas e dos sistemas urbanos e a segurança das populações vulneráveis a calamidades naturais ou provocadas.
Por outro lado, as prioridades dos sucessivos governos do partido Frelimo não têm sido investir em estradas de qualidade, por exemplo com quotas maiores nas regiões de maior risco de cheias. É só contar os troços que ficam submersos nas épocas chuvosas na única estrada que liga o Sul, ao Centro e ao Norte do país. E quando as águas secam as obras de reabilitação que são efectuadas não têm qualidade, nem mesmo na zona mais nobre da capital moçambicana que desde as cheias do ano 2000 aguarda por uma reabilitação decente da avenida Julius Nyerere.
Os olhos do mundo já estavam em Paris, por causa dos atentados que a 13 de Novembro mataram 130 pessoas, mas continuam para lá virados com a esperança de que a Cimeira do Clima termine com um acordo que marque uma mudança decisiva para longe da crescente dependência de combustíveis fósseis e em direcção a energias mais limpas, como a eólica e a solar.
Por cá, além de esperarmos e lutarmos por melhores políticas governamentais, cada um dos moçambicanos é chamado a ter mais atenção ao impacto que as suas acções no quotidiano têm no clima global.