Montanhas de votos nulos de todo o país estão agora a ser reavaliados pela Comissão Nacional de Eleições, CNE, em Maputo. O processo é aberto à imprensa e observadores.
Este processo é necessário porque muitos presidentes das mesas de voto são demasiado estritos nas suas decisões durante a contagem dos boletins de voto, rejeitando votos onde o X ou impressão digital saiem do quadrado ou há um gatafunho em vez do X. A lei diz que um voto é válido se a intenção do eleitor é clara, e normalmente um terço dos votos “inválidos” são aceites pela CNE porque a escolha do votante é óbvia.
Muitos são obviamente inaceitáveis. Um eleitor escreveu “ladrão” junto de um candidato, outro escreveu “assassino” ao lado de outro. Alguns eleitores marcam todos os quadrados.
Assim as decisões são relativamente automáticas e os membros da CNE e do STAE parecem ser consistentes nas decisões, não favorecendo nenhuma das partes. É uma atmosfera relaxada, com pessoas exibindo os boletins mais bizarros e discutindo com os colegas aqueles que em que a decisão é menos óbvia.
Os boletins de voto são tratados província por província e dentro destas, um distrito de cada vez, de modo a que os votos válidos possam ser correctamente adicionados a cada distrito. As pilhas de papéis são enormes – centenas de milhar de boletins devem ser reconsiderados dentro dos próximos dias.
… o que também evidencia a fraude …
Mas olhando para a requalificação também dá indícios de viciação de boletins de voto, e portanto de fraude cometida por membros da mesa de votação. Ontem, muito do trabalho incidia na Zambézia e surgiram duas fraudes óbvias.. Um exemplo que já foi largamente relatado, e ocorreu pelo menos nas últimas três eleições, é que alguém na mesa de voto põe uma impressão digital extra num voto da Renamo, para parecer que o eleitor votou por dois candidatos diferentes e invalidar assim o voto.
Um jornalista da AIM revelou ontem um grupo de votos nulos do Alto Molocué que apresentavam um padrão flagrante. “Uma série de boletins de voto tinha sido marcada para Afonso Dhlakama, ou com uma cruz ou com uma impressão digital.
Imediatamente acima, no espaço do presidente incumbente Armando Guebuza, alguém tinha acrescentado outra impressão digital. Isto continuava em boletins sucessivos. Muito claramente tinha sido aposta a mesma impressão digital para marcar Guebuza dando a impressão que os eleitores em causa tinham tentado votar por dois candidatos..” E o Boletim noticiou uma nova fraude, que só tínhamos visto pela primeira vez no ano passado.
Em votos para o assembleia em Quelimane, um conjunto de 175 boletins eram todos para a Frelimo e todos obviamente válidos – nem mesmo o mais rígido dos presidentes de mesa de voto podia tê-los rejeitado. Depois de uma breve discussão foi decidido que os votos eram válidos e tinham de ser aceites.
Mas parece provável que, quando os boletins estavam a ser colocados nos sacos de plástico, às 3 da manhã e no escuro de alguma mesa de voto, alguém simplesmente pegou numa mão cheia de votos da Frelimo e meteu-os no saco dos votos nulos. Nunca ninguém pode saber porque votos válidos não são verificados de novo, mas boletins de voto válidos, dentro do saco dos nulos, certamente serão contados – e assim estes 175 boletins de voto foram provavelmente contados duas vezes.
Esta manhã a CNE trabalhou nos votos de Manica para a Assembleia da República. Num curto espaço de tempo vimos mais de 100 boletins de voto que tinham um X ou + muito nítidos para a Renamo e depois uma impressão digital muito suspeita noutro sítio qualquer do boletim de voto. Parece provável que tenham sido invalidados centenas de votos para a Renamo por membros das assembleias de voto na província de Manica.
… e a fraude resultou
Membros da CNE e dezenas de assistentes estão concentrados a reconsiderar centenas de milhar de boletins de voto em poucos dias. Mas isto significa que não estão à procura de fraude e que não têm nenhuma maneira de lidar com isso mesmo que a descubram. Só respondem a uma pergunta: se o voto é válido ou não. Eles não estão direccionados nem treinados para procurar por grupos de boletins obviamente inapropriados, nem para lhes dar seguimento.
O primeiro problema é que os nulos chegam em sacos de plástico que identificam a mesa de voto, mas há pessoas que abrem os sacos e arrumam os nulos em grandes pilhas, despejando os sacos no chão. Não há nenhuma maneira de ver donde veio um determinado monte de boletins de voto.
Os boletins do Alto Molócuè eram suficientemente evidentes para ter sido possível identificar a impressão digital e se a mesa fosse identificada só era preciso pedir algumas impressões digitais – 7 membros das mesas, 2 delegados de partido e alguns jornalistas e observadores que tivessem estado presentes. – para saber quem tinha cometido o crime.
Mas fora do seu saco, não há maneira de identificar a mesa de voto. O mesmo se passa com os 175 votos extra. Assim, os membros corruptos da mesa de voto podem ter a certeza de que a localização dos seus actos nunca será seguida e eles não podem ser identificados. Por outras palavras, a fraude funciona.