Os amantes do basquetebol já o admiravam, mas, na noite do passado Domingo (madrugada de Segunda-feira em Moçambique), grande parte do mundo passou a conhecer a incrível história de Jeremy Lin. Haverá alguém que ainda não tenha ouvido falar de Jeremy Lin?
Se vive em Moçambique e não assiste aos canais premium da televisão paga, que transmitem os jogos da Liga Norte-Americana de Basquetebol profissional (NBA), provavelmente nunca. Mas não sinta envergonha em dizer que nunca havia ouvido falar de Jeremy Lin.
Em duas semanas, o jovem base conquistou um espaço na equipa dos New York Knicks, tomou conta da NBA e tornou-se um fenómeno mediático à escala mundial – e quando acabar de ler este artigo ficará a conhecé-lo.
As camisolas com o nome dele, mesmo as pirateadas, esgotaram. “Linsanity” passou a ser uma palavra corrente nos jornais um pouco por todo o mundo.
Quando Carmelo Anthony e Amar’e Stoudamire lesionaram-se, quase ao mesmo tempo, os fãs dos Knicks pareciam encaminhados para mais uma época de frustração. Mas foi nesse momento de adversidade que o treinador Mike D’Antoni foi ao banco de suplentes buscar um tal Jeremy Lin. E assim começou a história de mais um digno representante da longa lista de heróis improváveis.
Antes de 4 de Fevereiro, Lin, um base de 23 anos de idade e 1,91m de altura, era um quase desconhecido no basquetebol profissional, com poucos minutos nos Golden State Warriors na temporada anterior e escasso tempo de jogo nos Knicks.
E então o destino aconteceu, tal como nos filmes. Com a equipa muito afectada por lesões, o técnico Mike D’Antoni olhou para o banco, mandou entrar Lin num jogo contra os Utah Jazz. Lin brilhou e os Knicks ganharam.
O Madison Square Garden adoptou imediatamente o jovem base. As boas exibições sucederam-se, mesmo quando enfrentou Kobe Bryant, cinco vezes campeão da NBA. Lin fez uns extraordinários 38 pontos, sete assistências e quatro ressaltos, na vitória dos Knicks sobre os Los Angeles Lakers por 92-85.
Aluno exemplar
Mas quem é Jeremy Shu-How Lin, natural de Palo Alto, Califórnia, cristão convicto, fanático de jogos de computador e apreciador de churrasco brasileiro? É um jovem formado em Economia pela Universidade de Harvard, filho de pais originários de Taiwan, que não era considerado suficientemente bom para jogar na NBA.
Só no seu percurso académico, Lin marca a diferença no que ultimamente tem sido regra nos jogadores de topo da liga, que não terminam o curso e, às vezes, saem directamente do liceu. Entrou em Harvard, que antes dele só havia dado três jogadores à NBA (forneceu mais presidentes aos EUA), sem uma bolsa atlética, terminou o curso com distinção e, apesar de ter escolhido o basquetebol como actividade, nunca foi eleito no “draft”.
Em 2010, acabaria por integrar a rotação dos Warriors, equipa que ficava mais perto de casa, mas, com os problemas laborais que afectaram a NBA em 2011, foi dispensado. Tentou a sorte nos Houston Rockets, que também não o quiseram, acabou nos Knicks, que o enviaram para uma equipa da D-League (liga de desenvolvimento).
Em Fevereiro de 2012 a hora de Lin chegou. Conquistou um lugar na equipa, brilhou, e foi seleccionado à última hora para o All-Star dos jogadores jovens. Ele que, até há pouco tempo, dormia no sofá da casa do irmão, por não ter a certeza de ficar nos Knicks.
O nome de Lin foi acrescentado à lista de jogadores seleccionáveis mesmo antes de Shaquille O’Neal e Charles Barkley, que vão orientar os dois conjuntos no NBA All-Star Weekend Rookie Challenge, começarem a fazer as suas escolhas para formar as equipas.
Batalha diplomática
Ter um jogador como Lin pode significar maravilhas para a NBA em termos de expansão de mercado. Ele próprio, que já foi convidado para jogar pelas selecções de Taiwan e da China (recusou as duas), tem tudo para ser uma poderosa arma de marketing para as marcas. E até já recebeu elogios do Presidente norte-americano, Barack Obama, que confessou estar “muito impressionado” com o jovem jogador.
A China reivindica Lin como herança sua, rivalizando com Taiwan nesse capítulo. Cai Qi, dirigente do Partido Comunista chinês na província de Zhejiang, que a avó materna de Lin deixou para ir para Taiwan, publicou uma mensagem no Weibo (o serviço chinês equivalente à rede social Twitter) a reclamar a “casa ancestral” de Lin para Jiaxing, uma cidade da província, contava o “The New York Times”.
Desde 1991 que a avó do Lin e outros elementos da família têm enviado milhares de dólares para a escola secundária da localidade.
Mas as ligações da família a Taiwan criam um embaraço aos esforços chineses, assim como o cristianismo fervoroso do Lin. Num artigo da revista “Time” apontava-se a impossibilidade de Lin ser um resultado do sistema desportivo chinês. Desde logo, porque o jovem base seria provavelmente considerado pouco alto para ser seleccionado.
A ascensão de Jeremy Lin colocou as questões de raça na ordem do dia nos EUA. Houve quem dissesse que a cobertura aos feitos do jovem base se deviam mais à etnicidade que às capacidades de Lin.
E os títulos não se resumiram a “Linsanity”. Há poucos dias, a rede de televisão ESPN despediu um elemento e suspendeu outro devido a um título na versão “online” que continha uma expressão insultuosa.
“A ESPN pediu desculpa. Não acredito que tenha sido de propósito. Como eles pediram desculpa, para mim o assunto acabou. Temos de aprender a perdoar. E nem sequer penso que tenha sido intencional”, disse Jeremy Lin sobre o assunto.
E com toda a euforia à sua volta, Jeremy Lin só quer manter a tranquilidade para si e para a sua família: “Tenho um pedido especial a fazer aos media em Taiwan: que dêem espaço à minha família. Porque eles não podem sequer ir trabalhar sem serem bombardeados e perseguidos. Quero que as pessoas respeitem a privacidade dos meus parentes em Taiwan”.