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Jogos Pan Africanos – Presente envenenado…ou talvez não?

Jogos Pan Africanos - Presente envenenado…ou talvez não?

No autêntico “inferno” que caracteriza a cidade do Cairo, eu e o colega José Durbeque, da Rádio Moçambique, mandámos parar um táxi que nos levou a um hotel, a 50 quilómetros do centro da ruidosa cidade. Estávamos nas vésperas da V Edição dos Jogos Africanos, 1991. No fim do trajecto, perguntámos ao motorista o valor da corrida. Ele foi-nos dizendo que poderíamos pagar o que achássemos justo. Como não tínhamos referências quanto ao valor do serviço, insistimos.

Ele clarificou: “Porque vocês vêm aos Jogos, vou cobrar a taxa mínima, correspondente ao combustível. O que me importa é que saiam com boa impressão do Egipto”. Parecia uma atitude de excepção. Mas nos 15 dias que acompanhámos os Jogos Africanos, várias manifestações idênticas presenciámos. Por exemplo: no dia da abertura dos Jogos, com uma cerimónia de fazer inveja a uma Olimpíada, cujo início estava marcado para as 20 horas, saímos do hotel às 8 da manhã. Fomos entregues a uma jovem guia egípcia, que praticamente nos “levou ao colo”, criando condições para que nada nos faltasse.

Éramos sete, num “mini-bus” espaçoso: dois jornalistas moçambicanos, um francês e dois tunisinos, mais o motorista e a guia. Vencer o infernal tráfego era apenas o início da batalha, que levou mais de 8 horas. Depois veio a autêntica “guerra” para entrar no Estádio. Apesar dos crachás, éramos arrastados de volta, quando já estávamos bem perto do portão. Até nova ofensiva. E quando deu entrada o Presidente, Hosni Mubarak, com o seu aparato de segurança, fomos obrigados a recuar até ao ponto de partida. Conseguimos entrar no estádio após a cerimónia se ter iniciado, graças à dedicação e espírito de missão de Djamilia, a nossa guia, que chegou a entrar em pranto junto dos porteiros, pedindo-lhes para que abrissem espaço para os “seus jornalistas”.

À altura da mega-operação

Outro exemplo: o José Durbeque, no afã de garantir lembranças para a família, logo que chegou efectuou algumas compras. Um dia após o final dos Jogos, verificámos que os comerciantes estavam a alterar os preços. Indagámos e ficámos a saber que afinal repunham os preços reais, que haviam sofrido um abaixamento para facilitar a vida aos visitantes durante os Jogos Africanos. Sintetizando: os Jogos de 2011, mesmo que o nosso Governo faça bem a sua parte, “sobrará” a oportunidade para nós, cidadãos nacionais, demonstrarmos com atitudes idênticas às que relatei, se somos patriotas ou “caçadólares”.

E os efeitos – bons ou maus – irão reflectir-se no futuro, melhorando o nosso “ranking” como país a merecer, ou não, novas apostas de grande vulto. Não pode e nem deve ser uma oportunidade para cada um “fazer a sua vida” através da especulação, prejudicando a imagem de todos. Uma mega-operação destas só terá sucesso se o lado humano, afectivo, estiver na crista da realização.

À base do voluntariado

O Conselho Superior do Desporto Africano, ao ceder os direitos de organização ao nosso país, não quererá, certamente, baixar a fasquia de qualidade dos jogos, relativamente aos anteriores. Bem pelo contrário. Mas o nosso país está longe de possuir as condições dos países atrás citados. Os recursos, por mais apoios que se mobilizem, estarão longe de ser suficientes. Resta a opção, internacionalmente utilizada neste tipo de situações, do voluntariado. Pondo de lado diferenças ideológicas, políticas e regionalistas, cada um deve responder ao apelo e dar um pouco de si. Estudantes no estrangeiro podem (e devem) programar para esse período as suas férias, para fazerem de tradutores; técnicos de informática, enfim, como detentores de qualquer nível de conhecimentos, devem abraçar a causa e dar, voluntariamente, algumas horas de trabalho. Cada um a seu nível e à medida das suas capacidades. O resultado será um legado melhor para todos.

Os visitantes, por exemplo, deverão vir encontrar os bairros limpos e engalanados com flores previamente plantadas, cujos efeitos representam os nossos símbolos. Estas e outras manifestações não caberão ao Governo, mas a todos e a cada núcleo ou organização. Pensemos nas cerimónias de abertura, e de encerramento. Em regra, são espectáculos de encantar, ricos em surpresas, fruto de criatividade e imaginação. Mas no cerne de tudo, serão mostras da cultura e hábitos do país inteiro. O glorioso passado, o actuante presente e o radioso futuro com que sonhamos, serão os pontos focais. Um passo largo para vencer o “coitadismo”, na maior e mais diversificada festa africana!

Invasão pacífica

A notícia da aceitação dos Jogos apareceu como um coelho que nos saiu da cartola. Não creio que o nosso país se tenha candidatado a um desafio tão grande, para preparar em tão curto espaço de tempo, apenas porque a Zâmbia desistiu, Angola teve o CAN e a África do Sul o Mundial.

Correríamos o risco de, ao tentar impensadamente colocar bem a nossa Zona, darmos uma imagem má do nosso país e – o que seria mais grave – marcarmos passos atrás nos grandes objectivos de desenvolvimento, com enfoque para o combate à pobreza. Muita gente terá dificuldade em entender e “pesar” o que será isso dos Jogos Africanos. Tratase de uma Olimpíada continental, prova bem mais problemática de organizar que um CAN.

Normalmente, à semelhança dos Jogos Olímpicos, a preparação leva oito anos. E mesmo em países poderosos e rotinados na organização de grandes eventos, “pára tudo” para acolher as competições. Serão cerca de 20 modalidades, evoluindo na terra e nas águas.

Muitas delas, para a maioria de nós, totalmente desconhecidas. Atletas, à volta de 5 mil, com regras alimentares, hábitos religiosos, culturas e formas de estar, das mais multifacetadas. É o desfile-mor da “raça” africana. Bonito de ver: atletas musculados, jovens delgadas (ginastas), homens e mulheres altíssimos (basquete e voleibol), narizes amachucados (boxe), braços compridos (natação e pólo aquático), pescoços mais largos que a cabeça (luta) e por aí fora.

A todos se irão juntar técnicos e acompanhantes, dos mais simples cidadãos a governantes de alto nível. Um número não fácil de calcular, mas que representará, seguramente, a maior “invasão” – felizmente pacífica – de que te(re)mos memória. Cor, luz, alegria, confraternização, com componentes positivas de um lado, mas trazendo também os inevitáveis vícios que vão exigir reforço de segurança, para um eficaz controlo e repressão.

O sonho das medalhas

As condições logísticas que estão a ser criadas, pelo facto de sermos anfitriões dos Jogos da CPLP e vizinhos do Mundial 2010, irão ser favoráveis. Porém, desportivamente e quanto ao ditado que reza que na nossa casa mandámos nós, aí “a porca vai torcer a cauda”.

As medalhas não irão andar muito perto do peito dos nossos atletas, porque não há milagres no desporto. Lurdes, que era a única certeza, já deixou a competição. O basquete feminino continua com hipóteses, pode pensar-se também no judo e pouco mais. Mas vai ser positivo tomarmos o pulso à distância que ainda nos separa da elite continental… e aprender, vivendo os duelos entre as potências, dentre os quais, em algumas especialidades, virão os maiores do Mundo.

O segredo estará na transformação de um antes quase impensável desafio, numa oportunidade de dar um salto em frente. Dentro, mas sobretudo fora dos recintos, onde o desporto de hoje em dia não triunfa sem rigor e profissionalismo. O Governo foi audaz, diria mesmo atrevido. Resta-nos aceitar o repto e executarmos a nossa parte, afinal a mais importante e decisiva.

Infra-estruturas que não temos

Pista de Atletismo: É oficial, a pista do Parque dos Continuadores, assim como a do campo da Académica, não apresentam condições para albergar os Jogos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), segundo constatação dos responsáveis técnicos dos jogos, que visitaram recentemente os locais propostos por Moçambique, na qualidade de anfitrião.

Em face disso, falta saber qual será a pista que vai albergar os Jogos Pan-Africanos.No entanto, sabe-se, que o Estádio Nacional, cujas obras terminam em Agosto de 2010, contará com uma pista de atletismo.

Vila Olímpica: 136 novos edifícios de quatro pisos cada, totalizando 1088 apartamentos do tipo três, serão erguidos na Cidadela Desportiva de Maputo, sita no Bairro do Zimpeto, tendo como finalidade albergar os atletas que tomarão parte na décima edição dos Jogos Africanos.

As obras de construção da vila olímpica terão o seu início no próximo dia 1 de Junho e com uma duração de um ano, pelo que serão concluídas três meses antes dos Jogos Africanos, já que estes decorrerão de 3 a 18 de Setembro de 2011.

O extenso terreno, localizado por detrás do Estádio Nacional, compreenderá a construção, para além da vila olímpica, de outras infra-estruturas complementares, tais como pavilhão multiuso, piscina olímpica, “courts” de ténis, campo de futebol e pista de atletismo para treinos.

A prenda da Zâmbia

Os Jogos Africanos de 2011 haviam sido, inicialmente, atribuídos à Zâmbia. Todavia, invocando razões de natureza económica, o Governo deste país comunicou ao Conselho Superior do Desporto de África (SCSA) a sua desistência, abrindo-se, assim, uma embaraçosa brecha, tendo em conta, na altura, o pouco tempo disponível para a organização de um evento desta magnitude.

Efectivamente, a decisão da Zâmbia não foi motivada apenas por razões económicas, constando que, para além da depreciação da moeda local face ao dólar, questões de ordem política também foram determinantes. O Executivo zambiano afirmou que 100 milhões de dólares, valor previsto para organização dos jogos, seriam canalizados para a luta contra a pobreza.

Refira-se que há 22 anos, a Zâmbia teve a oportunidade de organizar o CAN ‘88 e, para o efeito, foi demolido o Estádio Dag Hammarskjold, em Ndola, para dar lugar à construção de um novo recinto desportivo. Porém, esse empreendimento não passou do papel e os jogos acabaram por se realizar em Marrocos.

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