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Indústria do gás não tem beneficiado os “manhambanas” que continuam a viver em casas de caniço, sem água potável nem retrete e trabalham na agricultura

Foto de ArquivoDesde que a crise económica e financeira agudizou-se os membros do Governo não se cansam de repetir que Moçambique precisa de aumentar a produção interna, incrementar as exportações e reduzir as importações para que a economia estabilize. Porém, além de não mencionarem o impacto da dívida pública na crise, também não se têm referido à pouca contribuição da indústria extrativa na melhoria da vida dos moçambicanos. Tal como indústria do carvão não melhorou a qualidade de vida dos tetenses e dos beirenses, a indústria do gás também não tem criado riqueza para os cerca de 1,5 milhão de manhambanas que continuam a ser, na sua maioria, camponeses que vivem em habitações de caniço e zinco, sem água canalizada e com latrinas não melhoradas.

O calvário dos manhambanas é a falta de emprego, apesar conviverem com a multinacional Sasol Petroleum Temane que há doze anos explora o gás natural existente em Pande e Temane. O Inquérito sobre o Orçamento Familiar(IOF) 2014/2015 apurou que 67,1% dos moçambicanos na província de Inhambane continua a trabalhar na agricultura, silvicultura e pesca com a despesa mensal de cerca de 6.154, meticais, um aumento de pouco mais de 100% em relação ao IOF de 2008/2009, contudo seis vezes menos do que os rendimentos dos maputenses (residentes na cidade e província de Maputo).

Em mais de uma década poucos manhambanas deixaram de ser camponeses, embora a multinacional sul-africana tenha investido só na fase inicial de 1,2 bilião de dólares norte-americanos. Aproximadamente 10% entraram para um ramo de actividade denominado no inquérito de “outros serviços”, 4,6% passaram a trabalhar no “comércio e finanças” e 3% trabalha na “indústria transformadora”.

Mais de 66% são trabalhadores por conta própria sem empregados, “pessoas que ao exercer a sua profissão o fazem sem empregados e o rendimento do seu trabalho reverte para si. Por exemplo, um camponês que trabalha na sua machamba sem empregados” segundo a definição do Instituto Nacional de Estatística.

A indústria extractiva e minas registou um pequeno aumento de trabalhadores moçambicanos em Inhambane, passou de 0,2%, em 2008/2009, para 0,8, em 2014/2015.

Sasol tem permissão do Estado para não fazer lucros em Moçambique

A Sasol Petroleum Temane, que em Novembro de 2015 anunciou um novo investimento de 210 milhões de dólares(para duplicar a capacidade do gasoduto que transporta gás de Temane, em Moçambique, para Secunda, na África do Sul) emprega apenas 147 trabalhadores moçambicanos que não são necessariamente manhambanas.

Inquérito sobre o Orçamento Familiar 2014/15

SasolNão bastasse os poucos postos de trabalho que cria a Sasol Petroleum Temane também paga poucos impostos. “O gás natural é tido como sendo o futuro de Moçambique mas o primeiro projecto de gás – Pande Temane – não gerou, praticamente, nenhuma receita ao Estado moçambicano”, constatou o Centro de Integridade Pública(CIP), num relatório divulgado em Outubro de 2013, onde argumentou que “Com a remoção da cláusula de partilha de produção do acordo de exploração firmado com a Sasol e a aceitação de uma fórmula de preços abusivos, o Governo cedeu, ao desbarato, logo de início, parte considerável da fonte das suas receitas.”

“No caso do gás, o acordo prevê que o Estado venda o gás à Sasol aos preços mais baixos possíveis. Quer dizer, além de beneficiar de incentivos fiscais, a Sasol tem permissão do Estado Moçambicano para não fazer lucros em Moçambique”, refere o economista Carlos Nuno Castel-Branco num artigo inserido no livro Desafios para Moçambique de 2013.

Na altura o Governo de Joaquim Chissano alegou que o mau negócio visavam atrair investimento estrangeiro no pós-guerra civil, e era preciso “demonstrar que as ´portas de Moçambique estavam abertas para os negócios´”, posição apoiada pelo Banco Mundial por isso “projecto de Pande Temane nunca foi concebido para gerar receita para o Estado”.

Manhambanas vivem em casas de caniço, sem água potável nem retrete

Foto de ArquivoSem trabalho e com poucas fontes alternativas de rendimentos significativos – os Inquérito sobre o Orçamento Familiar não incluem o turismo como um ramo de actividade – os moçambicanos na província de Inhambane continua a viver em casas de construção precária à mercê das calamidades naturais que cada vez mais se fazem sentir em Moçambique: 64,9% vive em habitações com paredes de caniço ou paus maticados, 39,5% delas cobertas por capim e 56,6% cobertas com zinco, revela ainda o IOF 2014/2015, realizado pelo Instituto Nacional de Estatística.

Nestas casas de construção precária o saneamento existente é de latrinas não melhoradas em 53,1% dos agregados e 23,2% nem sequer têm latrina. Apenas 14,9% dos agregados familiares em Inhambane têm acesso a energia eléctrica.

O drama é agravado pelo dificuldade em ter acesso à água potável canalizada, que é um privilégio de 15,7 manhambanas – que estão ligados ao sistema de abastecimento da cidade capital provincial (13 mil ligações domésticas) e na Maxixe (12 mil ligações domésticas) -, enquanto 35,4% obtém-a em poços, 26,8% usa poços protegidos ou furos com bombas manuais.

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