Já foi um dos lugares mais cobiçados da costa paradisíaca da província de Inhambane. Pela sua discreteza. Pela arrebatadora paisagem. Pela brancura e chiar das areais que vestem os pés nus dos veraneantes e não só. Pelo deslumbrante azul esverdeado das águas que são constantemente despejadas pelas ondas. E logo devolvidas para o lugar de onde vieram.
Provavelmente não evocássemos esta beleza hoje, nestas linhas, não fosse o incêndio trágico registado semana passada, 07 de Agosto, numa das estâncias turísticas que se estendem pela orla da “Barra”. Eram aproximadamente 23h:00 quando o fogo deflagrou no “Barra Cuda”, como é chamado o local de acomodação, que foi literalmente lavrado pelas chamas até ficar em cinzas. Não se conhecem exactamente as causas da destruição, mas há fortes suspeitas de que tenha havido fogo posto.
De acordo com Ricardo Bata Covela, gerente da empresa, citando os guardas em serviço na altura do incêndio, terá aparecido no local, por volta das 22h:00, um homem de raça branca a avisar os sentinelas para que saíssem dali se não quisessem ficar carbonizados. Para Bata Covela, é inexplicável o que aconteceu depois do aviso do intruso. Os guardas abandonaram o seu posto de trabalho e não puseram em alerta os vizinhos ou a Polícia.
Para criar mais estranheza no caso, já tinha sido dado o sinal através de fogo de pequenas proporções que, momentos antes, havia tomado conta do muro de vedação construído em material local, fogo esse imediatamente extinguido. Na altura, ninguém desconfiou que o pior estivesse ainda por vir. Foi depois de apagarem esse fogo diminuto que apareceu o homem estranho a avisar os guardas para abandonarem o local, mas, mesmo assim, de acordo com Bata, os homens da guarnição não despertaram.
Por volta das 23h:00 deu-se o irreversível. Foram incendiadas duas casas feitas de madeira e colmo, apetrechadas com quarto e casa de banho privativa com água quente aquecida num esquentador a gás, cozinha com congelador, geleira e fogão, tudo concebido ao nível das exigências de um turismo de ponta. Eram trinta quartos. E todo esse empreendeimento foi absolutamente devorado a partir das duas casas. Fazia vento, que vinha do Oceano, o que permitiu o fácil alastramento das labaredas, que semearam livremente o caos. Não deixando nada, senão a cinza como vestígio. E o “Barra Cuda” já não existe, assim como foram afectadas mais duas estâncias próximas do foco principal.
Mas esta situação não é nova. Já aconteceram mais casos nas praias de Inhambane, e as explicações que se dão para isso são variadas e estranhas. Por exemplo, nesta situação, segundo o gerente, para além de ter aparecido o homem de raça branca a dar o aviso, foram detectadas pegadas de um pé descalço na manhã seguinte, a perder-se pela costa, partindo do lugar do incêndio. Fala-se ainda de ter sido visto logo a seguir ao sinistro um carro partindo a alta velocidade em direcção ao cruzamento da praia do Tofo e da Barra.
Os proprietários da estância são sul-africanos e quando se deu o incêndio não estavam em Inhambane. O gerente, para além de não poder estimar o valor dos prejuizos causados, desconhece o móbil do crime. “Não sei o que estará por detrás desta maldade”. Perguntámos a Bata se não será isto um ajuste de contas ou algo propositado para se conseguirem ganhos com o Seguro, segundo se fala por aí: “Também não posso afirmar nada sobre isso, os patrões quando chegarem é que poderão esclarecer tudo, provavelmente. O que posso dizer é que as perdas são elevadas, a sorte é que na altura não estava nenhum hóspede acomodado”.
Entretanto, quando a nossa reportagem já batia em retirada, chegava um grupo de turistas que havia feito reservas e, o que eles encontraram, espantosamente, foram os escombros dos quartos onde deviam ser alojados para desfrutarem do prazer de estar numa praia que, mesmo sem ter perdido todo o seu esplendor, já não é a mesma.
O “Flamingo” está murcho
A Praia da Barra nunca foi um grande ponto de encontro. O centro das atenções é a Praia de Tofo. Todos vão para lá. E continuam a ir, mesmo sabendo-se que depois de seduzidos não ficarão eufóricos. A não ser pela sensação de liberdade quando a praia não está abarratoda. A “Barra”, apesar de nunca ter sido um grande chamariz, provavelmente pela sua então inacessibilidade, era um lugar de verdadeiro paraíso. As suas águas parecem mais lindas que as do Tofo. As suas areias também. Brancas e sonoras. Quando se está de costas para o oceano, olhando-se para o verde das palmeiras e de outras árvores verdejantes, a conquista é total. Ao fazer-se o contrário, dando costas ao verde, o mar, com as ondas em permanente ondular, parece uma almofada para a alma.
Mas a “Barra” parece meio abandonada. E o Complexo Flamingo pode ser o exemplo mais flagrante. De exuberante, outrora, passou para uma estância quase vulgar. Pela perca de brilho. Não existe a menor dúvida de que o projecto arquitetónico é invejável. Quem o fez respeitou na plenitude a natureza. Estar no Flamingo é como estar no mato cerrado, tendo as casas como cogumelos desenhando a beleza em si. Oferecendo-nos uma tranquilidade absoluta. Porém, ficámos com a sensação de que não há reinvestimento para manter o reverberar de um lugar amanhado com inteligência. Ontem, quem fosse ao Flamingo queria ir outra vez. Hoje, se calhar, é diferente. A piscina, que exige cuidados especiais, já não nos chama para o mergulho. Está suja. Descuidada.
Mas “Flamingo” é apenas o exemplo de toda a Praia da Barra que, para além de estar, aos poucos, a ser colocada para depois, está a sofrer os efeitos da erosão. E não se sabe o que é que se pode esperar amanhã, de uma zona com conflitos de terra por sanar.