Formalmente o espaço aéreo moçambicano está aberto desde 2008. Contudo não surgem concorrentes às Linhas Aéreas de Moçambique(LAM) porque “a burocracia do Instituto da Aviação Civil arrasta todo o processo” nas rotas domésticas e o acordo bilateral com a África do Sul “mata o negócio” na ligação Maputo à Joanesburgo, explicou ao @Verdade o vice-presidente do pelouro de Transportes na Confederação das Associações Económicas (CTA), Alves Gomes.
A liberalização do espaço aéreo moçambicano é uma realidade desde há oito anos quando o Governo decidiu aplicar a 5ª liberdade do ar, que preconiza “o direito de transportar passageiros e carga entre o território de outro Estado Contratante e o território de um terceiro Estado no âmbito de um serviço aéreo destinado a, ou proveniente do Estado de registo da aeronave” e nas rotas onde não existem operadores que usufruam do “direito de transportar passageiros e carga do território do Estado de registo da aeronave para o território de outro Estado Contratante” e do “direito de transportar passageiros e carga do território de outro Estado Contratante para o território do Estado de registo da aeronave”, mas na verdade o nosso País tinha assumido esse compromisso quando assinou a Declaração de Yammoussoukro, em 1991, que advoga a liberalização gradual dos serviços de transporte aéreo dentro do continente africano.
Porém os empresários moçambicanos que tentaram iniciar negócios no sector de aviação civil enfrentam variados entraves burocráticos que atrasam o início da sua actividade e acabam por matar o negócio onde os concorrentes são empresas participadas que tem Estados como accionistas: a LAM e a South African Airways(SAA).
“O caso mais emblemático disso tudo é a privatização da TTA (os principais accionistas eram a STA, JV Consultores, Aeroclube) que foi feita em 1997, com a condição a companhia teria acesso a fazer voos regulares dentro de Moçambique e para a África do Sul. Feito o negócio com o Governo era preciso licenciar, a empresa deu início a todo o processo para iniciar a operação de voos regulares e o Ministério e Aviação Civil condicionam ao não uso da chamada linha dorsal, Maputo – Beira – Nampula” esclareceu Alves Gomes acrescentando que também ficou condicionada, “com base no acordo bilateral com a África do Sul, a entrada na rota Maputo – Joanesburgo”.
“Segundo eles o acordo limitava a operação na rota a uma quota que a LAM já transportava. Por outro lado a South African Airways não estava interessada que outro operador de Moçambique entrasse porque isso implicaria a entrada de outro operador sul-africano, portanto os dois lados barraram” referiu Gomes.
Em entrevista ao @Verdade o representante dos empresários do sector da Aviação Civil afirmou que este caso, anterior a legislação que liberalizou o espaço aéreo, acabou por ser dirimido pelo Tribunal Administrativo que, em 1998, decidiu que “o Governo tinha que permitir que a TTA voasse, mas nada se passou”.
Acordo bilateral entre Moçambique e a África do Sul impõe limites às empresas de aviação comercial
Entretanto em 2010, a Sociedade de Transporte e Trabalho Aéreo de Moçambique (TTA SARL) “continuou a lutar e fez uma parceria com a South African Airlink para a rota Maputo – Joanesburgo. A empresa fez os pedidos mas surge a questão que está a usar o nome de Airlink e não podia, segundo o IACM”.
Um comunicado do Instituto de Aviação Civil de Moçambique(IACM) na altura esclarecia que a TTA Airlink recebera uma Licença Provisória e o Certificado de Operador Aéreo mas não lhe foi atribuída a rota Maputo – Joanesburgo nem a respectiva licença de exploração pois os direitos de exploração dessa rota haviam sido concedidos à TTA SARL.
Um alegação falsa, de acordo com Alves Gomes que acrescentou que o caso foi esclarecido em tribunal à favor da TTA, “mas entre o falso e verdadeiro morreu o negócio”.
Anos mais tarde outras empresas, estrangeiras, iniciaram voos nesta que é considerada umas das rotas mais rentáveis do nosso País mas acabaram por fechar as suas operações alegadamente devido a imposição de quotas que limitavam o número de passageiros que podiam transportar o que não garantia a viabilidade do negócio.
O vice-presidente do pelouro de Transportes na CTA explica que embora o espaço aéreo esteja liberalizado, também nessa rota, o acordo bilateral entre Moçambique e a África do Sul impõe limites que são extrapolados para acordos comerciais pelas dominantes companhias de bandeira nacional – da mesma forma que a LAM é participada pelo Estado moçambicano a SAA também é detida pelo Estado sul-africano.
“Não é por aí” refutou em entrevista ao @Verdade o presidente do Conselho de Administração(PCA) IACM, João de Abreu Martins, citando como exemplo da abertura do espaço na rota para Joanesburgo o facto recente de uma companhia aérea que vai entrar “ter pedido 400 lugares por semana e nós demos” referindo ainda que “a CTA vinha com discursos de estudos feitos pela USAID e nós demonstramos que aqui está tudo aberto desde 2008”.
Fly Africa Moçambique não está a voar devido “a burocracia do Instituto da Aviação Civil”
Contudo Alves Gomes, que tem acompanhado a tentativa de surgimento de outros operadores na aviação civil comercial, explicou que o que acontece é que desde que Moçambique foi colocado na chamada lista negra Europeia, aumentaram os requisitos exigidos pelo IACM, “mas às LAM não são exigidos esses requisitos, já está a operar é só fazer anexo aos manuais. Os outros quando apresentam os seus documentos falta mais isto e mais aquilo e o que era mais um passo são mais cinco passos e nunca mais se completam”.
“Eu duvido que a Fly Africa tenha capacidade financeira para aguentar isso, nem para começar nem para aguentar e desistiu” revelou Alves Gomes referindo-se a outra empresa privada de capitais da neo-zelandeses que até o início do ano tinha cumprido com quatro das cinco fases de avaliação da sua aptidão para operar em Moçambique.
Faltava apenas a última etapa disse em Janeiro o PCA do IACM que perspectivou, “Se tudo correr bem, penso que dentro de três meses teremos a Fly Africa a voar nas rotas domésticas em Moçambique”.
Alves Gomes afirmou que a Fly Africa não está a voar devido “a burocracia do Instituto da Aviação Civil que arrasta todo o processo”.
“Eu tenho o caso do Aeroclube, quer operar uma escola para formar pilotos mas está lá (no IACM) há três anos. O Aeroclube tem uma licença para formar pilotos, já formou pilotos no passado, agora como entramos na lista negra surgiram novos requisitos que ninguém detalha antecipadamente quais são todos”, acrescentou Gomes.
Não é possível concorrer com as LAM que “é uma sucursal do Ministério das Finanças”
Mas João de Abreu reitera que o espaço aéreo stá liberalizado e mostrou ao @Verdade documentos oficiais que corroboram as suas afirmações. Por outro lado o PCA do IACM referiu que poderá haver falta de capacidade do empresariado nacional para criar empresas de aviação que possam concorrer com as Linhas Aéreas de Moçambique.
O representante dos empresários moçambicanos do sector da aviação civil rebateu afirmando que não é possível concorrer com uma empresa como as LAM que têm o Estado como sócio, “é uma sucursal do Ministério das Finanças”.
“A única coisa que se pode operar em Moçambique com relativa facilidade é o charter mas começando a colidir com o negócio da LAM fecham logo, dizem não pode sair a essa hora porque é horário da LAM, imposto pelo próprio regulador”, conclui Alves Gomes.
Entretanto o PCA do IACM explicou ao @Verdade que a operação das rotas domésticas “é reservada apenas e exclusivamente aos operadores nacionais”, caso as grande companhias mundiais desejem opera-las devem registar-se em Moçambique “e pagar impostos aqui em Moçambique, dar trabalho aos moçambicanos”.
Questionado sobre a razão de nenhuma das grandes companhias internacionais entrar no mercado de aviação civil moçambicano João de Abreu clarificou que “É preciso dar o apetite(aos potenciais passageiros) como em qualquer negócio para que os passageiros comecem a fluir, olhem para o transporte aéreo não como um transporte de elite. Nós ainda vemos pessoas que quando vão viajar para Nampula usam gravata, noutro lado já vão de calção e chinelos, é um transporte de massas como outro qualquer”.
O presidente do Instituto de Aviação Civil de Moçambique concluiu afirmando que “qualquer companhia de aviação voa para um destino para fazer lucros, não é para perder dinheiro. Moçambique assinou vários acordos bilaterais(que permitem as companhias aéreas desses países voarem para cá e as moçambicanas voarem para lá) mas são poucos os países que estão a exerce-los”.