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Edwin, o recriador da natureza!

Edwin

O domínio intelectual que possui sobre a natureza – sobretudo a humana – enriquece a sua pintura. Explorando o caos social que se vive no país, o artista plástico moçambicano, Edwin Filipe, promove, em cada pincelada, muita harmonia e compreensão mútua entre diferentes partes “em conflito”.

Com uma originalidade pictórica invulgar, o pequeno artista retrata preferencialmente o tema do naturismo, nas suas entranhas. Edwin Filipe é um verdadeiro recriador da natureza. Não obstante, a (grande) pujança (que nos apresenta) ainda tem muito que percorrer na pista das artes. Sobretudo porque a exposição individual “Mata-bicho” – estreada a 10 de Agosto – é o seu primeiro registo oficial nos meandros da arte pictórica.

De uma ou de outra forma, as 26 telas que constituem a mostra trespassam a dimensão de um mero resultado de labuta oficinal. Ou seja, as inúmeras pinceladas e de cores cravadas nos quadros absorvem em si histórias de vidas humanas. Problemas e sentimentos que fazem com que tais obras de arte sejam um espaço de/para profundas reflexões e questionamentos. Como tal, as perguntas que a seguir expõe: “Onde está a solução para os nossos problemas?

Como resolvê- -los?”, por exemplo, feitas diariamente por mulheres de pessoas no mundo (em jeito de reflexão e introspecção) podiam muito bem preencher o título desta narrativa. Pois é a indagações desta natureza que o mais novo artista plástico moçambicano, Edwin Filipe, procura (à sua maneira) responder.

Não o fizemos porque reconhecemos que o Criador original da natureza – humana, animal ou ambiental – fê-la perfeita.

Sendo que Edwin Filipe em obras como “possibilidades infinitas” ainda que resgate o tema da natureza, aproximando-se cada vez mais à sua forma original, para realçar a sua perfeição, fá-lo como um recriador. Mais importante ainda, demonstra, por essa via, como a acção humana tem sido fatal para o equilíbrio do ecossistema.

Trabalha-se pouco reclama-se muito

Edwin apresenta-nos, na sua pintura um planeta genuíno, puro, sem mácula ainda que até certo ponto altamente “industrializado”. E tem mérito porque tal industrialização da terra não ofende a natureza.

Na mostra – que se chama Mata-bicho – o criador carrega uma série de motivos (artísticos) pessoais que se fundamentam na necessidade de “encontrar-me, como artista, e expressar a minha concepção sobre a sociedade, os aspectos gerais e específicos do ser humano, e transmiti-los de modo a ganhar liberdade de falar acerca de qualquer assunto”.

Mata-bicho é, portanto, “um alimento para a alma destinado a libertar-nos de certos fantasmas que nos percorrem na mente: racismo, marasmo ou alguma tendência de algumas pessoas pensarem que as coisas surgem por si sós” o que imediatamente faz com que “nada se trabalhe e se reclame muito”.

Pior ainda, é que quando isso sucede “a gente prende-se no falar de coisas e não no fazer as coisas surgirem”. Eis a razão por que a mostra se torna um “incentivo para que as pessoas comecem a pôr as mãos à obra, fazendo com que a obra, por si só, ganhe reconhecimento”, afirma Edwin.

Ainda na sua relação com a tinta, o pincel e a paleta de cores o artista explore preferencialmente o tema que se prende com o carácter fisiológico humano, da terra, o relevo, a vida animal – nas suas componentes mais complexas – este recriador promove ainda através da sua obra alguma interacção intercultural entre os habitantes do terceiro planeta do sistema solar – a Terra.

Para o efeito, desliga-se de todos os elementos separadores: preconceitos raciais, de cor, de origem, étnicos, por exemplo – o que faz com que a sua obra seja universalista e inclusiva.

Reconstruir o cenário das artes no país

Para muitos o dia 10 de Agosto pode, por diversos motivos, ser insípido. Para Edwin e para as artes moçambicanas, a data é de um significado profundo. É que é nesta efeméride que nasceu – com uma (primeira) exposição individual – mais um militar das artes visuais.

Estando a nascer – na/para a arte – Edwin possui uma grande predisposição para absorver às vicissitudes e idiossincrasias da vida artística. “Sobretudo a nível comercial porque não basta que o artista consiga espaço para expor as obras”. O mais importante é “a recepção pública que as obras terão”, comenta Edwin lamentando o facto de em Moçambique não se valorizar o artista. Ou seja, “valoriza-se mais os que trabalham em gabinetes”, diz.

De qualquer modo, porque o expositor não está alheio à realidade do país pensa que “é preciso rebuscar-se e construir o cenário da arte para Moçambique”. Afinal, ainda que haja muita produção e artistas talentosos, “o cenário das artes encontra-se obscurecido e esquecido” – o que faz com não se dispense a devida atenção a este universo criativo.

A referida atenção à arte só pode ser dispensada à medida que se for muito agressivo em relação à produção de um trabalho cada vez mais sério por parte dos criadores.

Por sua vez, os outros actores sociais (cujas acções implicam a arte ou que são implicados por esta) – como por exemplo, a imprensa e os mecenas culturais –, deverão ser mais honestos e sérios no trabalho que fazem. “Respeitar o artista é evitar gerar situações que o marginalizem”, exorta.

Despertar No local onde decorre a amostra – Centro Cultural Brasil – Moçambique, em Maputo – encontra-se entre as 26 obras expostas a proeza “Despertar”. O artefacto é algo simplesmente onírico, rico em imagens e figuras. Nele encontram-se alguns órgãos de sentido como, por exemplo, a visão e olfacto. Em mais: está patente – em combate contínuo – o dia e a noite. O escuro e o claro. Múltiplas mensagens se podem extrair desta tela, sobretudo porque o artista afirma que é o “Despertar”. Mas o que é o “Despertar”?

O facto é que os seres humanos têm duas componentes: “uma luminosa e/ ou escura. No entanto, pode ser que a íntima – a que pouco partilhamos com o próximo – pode possuir alguma razão para o encontro, a compreensão mútua. Sobretudo porque quando nos assumimos – azuis, pretos, brancos, amarelos – tal e qual somos, as nossas intenções ficam mais claras”. Ou seja, “decorre a abertura total de um indivíduo em relação ao outro, criando- -se uma harmonia ou respeito mútuo”.

Com uma aplicação sapiente do óleo sobre tela, o artista apresenta nas suas telas, entre outros, o sistema digestivo e circular que constitui o organismo humano. E fundamenta: “o organismo humano reflecte perfeitamente o nosso meio exterior: árvores, água, o vento, etc. Por exemplo, o coração bombeia o sangue para o corpo inteiro. É uma espécie de motor ou gerador que sustenta o corpo – o que faz com que tenha uma responsabilidade acrescida. Mas o coração não funciona só. Tão-pouco para si, – não é egoísta – funciona para a cabeça, o sistema nervoso, etc.”

No exposto, Edwin faz uma metáfora do ideal, em termos da forma como funcionam as nossas instituições sociais. De qualquer modo, “o que é que significa esta figura?”, questionámos.

Significa a necessidade de nós, os cidadãos, trabalharmos para produzir – através das nossas acções – alguma harmonia como acontece com o organismo humano. Ou seja, encontrar, em nós mesmos, o nosso papel na sociedade e dele fazer jus.

Oferecer ou receber?

Segundo Edwin Filipe, há diversas maneiras de ser moçambicano. De qualquer modo, tudo se resume ao que cada pessoa tem para oferecer, e engrandecer o sentido de moçambicanidade. Sucede, porém, que as pessoas gostam muito que lhes ofereça coisas ou actos mas pouco oferecem o que possuem – o seu valor próprio.

O interlocutor que – no exposto – faz uma leitura da base para o topo para perceber como é feita a transmissão de estímulos entre as nossas instituições sociais, considera que nós, os moçambicanos, porque possuímos uma diversidade cultural e étnica – o que segundo algumas correntes nos enriquece – podemos ser muito mais ricos se “soubermos utilizar essa divergência, separação, da melhor forma. Ou seja, se conseguirmos inserir toda a gente no mesmo contexto, afastando os fantasmas que nos circundam e nos habitam.

É que “o contexto social moçambicano é muito caótico. É um contexto em que temos muitas influências de várias culturas e religiões. Mas além disso, temos ainda a influência política. Todas estas influências fazem com que certos indivíduos – por vezes – percam a sua obrigação como cidadãos”.

Ou seja, há uma necessidade de as pessoas se abstraírem das “influências (por meio de introspecção) para encontrar a sua identidade – como indivíduos com alguma função social, oferecendo serviços mas igualmente têm necessidade de receber. Posto isso, pode-se se fazer uma reentrada para este contexto social amplo, observando-se as obrigações, deveres e direitos”.

Fazendo jus à teoria do caos, Filipe convidou os apreciadores da sua arte a desvincularem- se de todas as suas preocupações para contemplarem o belo contido em cada uma das obras, extraindo uma infinidade de mensagens. E justifica- se:

“É como se as pessoas fossem um recipiente cheio no qual se pretende introduzir mais objectos. Antes de esvaziar não podem consumir mais nada. A arte é um alimento que nos alivia das grandes pressões que encontramos nas relações familiares, no trabalho, outras ainda que decorrem das ambições pessoais”.

Explorou a massa cinzenta

O artista plástico moçambicano Tinga, que acompanhou todo o processo criativo de Edwin Filipe, ficou maravilhado com a mostra. Tanto que afirmou que “esta mostra não é comum. A direcção do Centro Cultural Brasil – Moçambique sentiu-se pressionada pela beleza e originalidade das obras. O Edwin tem talento e mérito. Consegue produzir faces diferentes nas suas obras. Não é repetitivo. É um criador que tirou um pouco de tudo que tinha na sua massa cinzenta”, disse finalizando.

Edwin Filipe é oriundo da cidade da Beira. Nasceu a 05 de Março de 1984. Fez todo o ensino primário e secundário em Maputo. Frequentou até o 2º ano do curso de Medicina na Faculdade de Medicina de Porto, até que percebeu que a sua vocação tendia para as artes. É por essa razão, em parte, que explora na sua pintura preferencialmente a profundidade da vida.

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