Pessoalmente, assinaria de bom grado a Carta Aberta posta a circular na última quarta-feira, assinada por 13 personalidades dos oito países lusófonos. Na missiva lia-se: “Defendemos um não inequívoco à admissão da Guiné-Equatorial como membro de pleno direito da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) na medida em que o país não preenche os requisitos para entrar”. […] A entrada da Guiné-Equatorial constituiria um precedente inaceitável – com amplas consequências políticas – na prática e na ética da organização e levaria à sua grave descredibilização”, sustentam os signatários.
O nosso Mia Couto – um dos 13 – foi mais longe e disse, em declarações à RDP África, que “a CPLP não pode ser mais uma organização que está aberta sem princípios a todos os países e a todas as candidaturas que baterem à porta.”
Mia, afirmou ainda que “todos conhecem a história da Guiné-Equatorial”, lamentando que “os países que proclamavam a defesa dos direitos humanos os “tenham esquecido” assim que se descobriu petróleo na Guiné-Equatorial. “Esta má companhia não vem ajudar o bom nome da CPLP.”
Vem tudo isto a propósito porque hoje tem início, em Luanda, a VIII Cimeira de Chefes de Estado e de Governo da CPLP e a adesão da Guiné-Equatorial à organização – já é membro observador desde 2006 – é um dos temas em cima da mesa.
O país localizado sobre o equador já fez a sua parte: há meia dúzia de dias o todo-poderoso Teodoro Obiang, Presidente desde 1979, decretou o português como a terceira língua oficial do país – o castelhano e o francês são as outras duas – respondendo às exigências da organização dos países lusófonos que tem inscrito, nos seus princípios de adesão, a necessidade de o português figurar como língua oficial.
Agora, preenchido este requisito, a Guiné-Equatorial, a única ex-colónia espanhola da África subsaariana, está inscrita para o “exame” de Luanda. E neste teste parece que os doutos professores não estão interessados em fazer perguntas difíceis.
Seguramente, que não irão perguntar pelos constantes desaparecimentos de opositores políticos; pelas violações mais elementares dos direitos humanos; pelas fraudes eleitorais – Obiang chegou a ganhar com 96% dos votos –; pela asquerosa corrupção; nem porque é que os guinéus-equatorianos vivem com 30 dólares por mês quando podiam viver com 4160; nem o que é que o Estado faz com o dinheiro das receitas petrolíferas quando 50% da população nem tem acesso a água potável nem a electricidade e o único hospital da capital só tem gases para estancar as feridas; nem pelo encerramento da imprensa que se atreve a criticar, ainda que subtilmente, a família do Presidente; nem porque é que Teodorito, o filho mais velho de Presidente e já colocado em primeiro lugar na linha de sucessão, tem um fetiche por casas em Malibu. Nada disto será questionado no exame de Luanda.
Ao senhor Obiang interessa perguntar pela percentagem de comissão levada por ele nos contratos para a exploração de petróleo, pelas concessões de madeiras, de carvão, de pesca, de cacau, etc. No Iraque, trocava-se petróleo por alimentos, aqui troca-se princípios por petróleo. Senhores examinadores, sugiro que, antes de colocarem o Aprovado a azul no espaço destinado à Guiné Equatorial na pauta do exame, leiam “La Tribo” de Manuel Leguineche, “Los Olvidados” de Eduardo Soto-Trillo e “Los Poderes de la Tempestad”.
Depois disso, talvez pensem duas vezes antes de admitir este novo parceiro. Porque, tal como Cristo disse, “nem só de pão (petróleo) vive o homem”.