No passado fim-de-semana, imperativos de ordem profissional fizeram com que me tivesse de deslocar à província nortenha de Nampula. Uma vez lá, pensei: hoje, ir à capital do norte e não ver Afonso Dhlakama só encontra paralelo na expressão ir a Roma e não ver o Papa.
Deste modo, decidi tentar o furo jornalístico que, nos dias que correm, uma entrevista com o líder da oposição constitui. Para concretizar tal intenção, abordei um táxi junto ao Hotel Girassol. Não sabendo o nome da rua tive de dizer quem lá vive e foi então que recebi um acenar de cabeça negativo acompanhado de um “é muito perigoso”. Por momentos, talvez devido à expressão de pânico do taxista, pensei que ainda estávamos em guerra e que em lugar de lhe pedir para me levar à residência do líder da oposição de um país democrático estava a pedir que me levasse à Casa Banana nas matas da Gorongosa ao encontro do líder dos rebeldes ou melhor dos “bandidos armados”.
Insisti mais duas vezes, esgrimindo argumentos que nem de perto nem de longe convenceram o jovem que só me dizia que a polícia que estava a montar a vigilância à casa de Dhlakama iria marcar o táxi e exercer represálias no futuro. Despedi-me do rapaz sem voltar a insistir mas lembro-me de dar comigo a pensar como é que isto ainda hoje é possível na nossa democracia. Pouco tempo depois, fiz a mesma abordagem a um colega de praça. Este, num sussurro quase imperceptível, disse que aceitava mas logo foi dizendo que não podia parar à porta mas sim mais à frente e do outro lado da rua que, agora, sei que se chama das Flores, esses seres vivos tão singelos que inspiram a paz. À medida que nos aproximávamos da Rua das Flores cresceu a minha certeza de que não regressaria de lá de mãos a abanar, isto é, Dhlakama, mais que não fosse pelo respeito pela distância entre Maputo e Nampula, iria receber-me.
Quando começámos a subir a rua divisei a tal carrinha da PRM que desde que o líder da oposição assentou arraiais em Nampula mantém-se permanentemente à sua porta, do outro lado da via. Para a Polícia, trata-se de defender um membro do Conselho de Estado – como se fizesse o mesmo com todos os outros. Para os seus partidários esta acção mais não é do que uma vigilância permanente dos seus passos, principalmente depois de o líder da Renamo ter dito que iria promover manifestações de protesto contra os resultados das últimas eleições. Chegados à Rua das Flores, o motorista do táxi para um pouco mais à frente, já bem depois da carrinha da polícia e da casa alvo, uma residência geminada sem grandeza especial.
À saída do táxi fiz menção de cruzar a rua em direcção à residência vigiada. Uma mão estendida fez-me sinal para eu não atravessar ao mesmo tempo que vem rapidamente ao meu encontro. Expliquei ao que vinha. Dei a minha credencial do jornal onde uma foto faria com que Dhlakama facilmente me reconhecesse e encostei-me ao muro do outro lado da rua e, enquanto aguardava, conversava com três homens da segurança pessoal do líder.
Distribui @ VERDADE que foi sofregamente devorada. Passou uma boa meia hora até o enviado ao interior da residência atravessar novamente a estrada para me vir informar de que Dhlakama pede muitas desculpas mas não pode receber-me porque está a preparar um seminário que irá preencher totalmente o seu tempo nos próximos dias. Insisti, contudo a posição do homem correio foi irredutível. Despedime com um simpático obrigado mas fazendo-lhe ver que dificilmente haveria outra oportunidade. Finalmente, fui ao encontro do carro da Polícia e, depois de lhes dar o último exemplar d@ VERDADE, meti conversa e percebi que a maioria estava ali a fazer um grande frete.
Entre sono e bocejos, disseram-me que Dhlakama quase não saía de casa e quando o fazia, o carro das autoridades, tal como os espiões da CIA ou do KGB na Guerra Fria, seguia-o para todo o lado. No fim dei por mim a pensar que estávamos todos ali a perder tempo. E eu, comparativamente a ambos os vigilantes, só perdi uma hora e meia. Eles, sobretudo os da PRM, já perderam meses. E para quê, alguém me diz? Não seria mais útil direccionar esses agentes para o combate ao crime cada vez mais em alta na província.