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Dunga vs jornalistas brasileiros

Para além das crónicas dos jogos de futebol que têm sido disputados na África do Sul as manchetes desportivas da imprensa mundial têm dado destaque a uma outra disputa: a dos atletas e técnicos contra os jornalistas. Um dos casos mais comentados, e que pude viver como actor secundário, é o do seleccionador brasileiro (agora ex-seleccionador) Dunga que insultou alguns jornalistas brasileiros depois da vitória da sua equipa sobre a Costa do Marfim.

Conhecido pelo estilo durão, Dunga balbuciou palavrões para o jornalista Alex Escobar, da TV Globo, que abanou a cabeça durante a conferência de imprensa que se seguiu ao jogo enquanto o técnico falava.Vários jornalistas afirmaram que por trás do atrito estava a recusa do técnico em aceitar um acordo garantindo à rede Globo entrevistas exclusivas com jogadores. Mas Dunga, cuja maior conquista foi como jogador no Mundial de 1994 onde como capitão foi campeão com o escrete canarinho, chegou a seleccionador brasileiro em 2006, substituindo Carlos Alberto Parreira, sem ter nenhuma experiência profissional no cargo. E, apesar das vitórias na Copa América de 2007 e na Taça das Confederações de 2009, e mesmo tendo vencido a arqui-rival Argentina nas eliminatórias para este Mundial, Dunga nunca foi o técnico que os adeptos desejaram e jamais chegou a ser aprovado pelos jornalistas brasileiros.

Habituados a assistem aos jogos dentro do campo, atrás da linha de fundo e das laterais, os jornalistas brasileiros muitas vezes conseguem comentários de técnicos e jogadores em momentos importantes durante os jogos na sua terra. Mas no Campeonato do Mundo, tudo é diferente, só os fotógrafos podem pisar o relvado e os jornalistas da imprensa, rádio e televisão têm de se contentar em acompanhar os jogos do seu lugar na tribuna ou mesmo de uma sala de imprensa e apenas entrevistar jogadores, na conferência de imprensa depois dos jogos.

Para agravar o drama não há espaço para todos nas salas de imprensa, e resta a alguns jornalistas a frieza de uma tela. Como se isso não bastasse, enquanto a selecção brasileira esteve no Mundial da África do Sul, a imprensa enfrentou as rígidas regras impostas pelo técnico Dunga, que impediu os jogadores de falarem individualmente com os jornalistas. As entrevistas estiveram limitadas às conferências de imprensa após os jogos, numa sala com cerca de 400 outros jornalistas.

Conheci pessoalmente Carlos Caetano Bledorn Verri, o Dunga, durante um voo de Johanesburgo para a cidade do Cabo onde ambos fomos presenciar o sorteio da fase final do Mundial da África do Sul. Durante o voo trocámos breves impressões, tal como com outros passageiros; à saída tentei arrancar algumas declarações mas Dunga foi lacónico: “só na conferência e imprensa”. Novato nestas lides nem consegui retorquir! Mais recentemente reencontrei Dunga, na cidade de Durban, no treino que antecedeu o jogo contra Portugal, poucos dias depois do episódio com o jornalista da TV Globo e, à parte o aparato que sempre circunda a selecção brasileira, senti o ambiente entre os mais de duas centenas de jornalistas presentes, brasileiros e de várias outras origens: muito frio e tenso.

Pouco depois de a selecção chegar ao Estádio Princess Magogo, no subúrbio de KwaMashu, um funcionário da FIFA anunciou que o treino seria todo aberto à imprensa contrariando a prática até aí aplicada. Seguiu-se um misto de espanto e apreensão dos jornalistas que não acreditaram no que estavam a ouvir. Depois Dunga entrou e os jornalistas receberam instruções para se afastarem para o lado da bancada mais distante de onde os jogadores treinaram – “estava a ser bom demais para ser verdade” comentaram alguns jornalistas brasileiros.

Depois do fraco jogo a que pudemos assistir no Moses Mabhida, afinal o Brasil já estava apurado e Portugal só precisava de não perder, Dunga entrou para a sala de imprensa, depois do jogo a balbuciar: “será que ele vem rezar para enfrentar-nos ou só está a cantarolar!?”, ouvi a comentarem dois jornalistas brasileiros sentados ao meu lado. Nos jogos que se seguiram o enredo foi praticamente similar até que o Brasil sucumbiu à Holanda. Na conferência de imprensa que se seguiu ao jogo, o treinador brasileiro começou por assumir a maior parcela da responsabilidade da derrota e afirmou que “todas as decisões que tomei foram em prol da selecção” tendo acrescentado que sempre havia respeitado o trabalho dos jornalistas “agora ele já respeita o nosso trabalho!”, comentaram vários colegas brasileiros à minha volta.

O futebol é assim, entre uma vitória e uma derrota, muito depressa se passa de bestial a besta. Dunga nunca foi bestial e ainda por cima desafiou o quarto poder, e perdeu!

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