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Desmandos no Tribunal Administrativo da província de Nampula

Desmandos no Tribunal Administrativo da província de Nampula

Um grupo de trabalhadores do Tribunal Administrativo a nível da província de Nampula denuncia desmandos e maus-tratos protagonizados por três juízes de direito daquela instituição. Os funcionários acusam, sobretudo o juiz-presidente Amade Limua, de abuso de poder, uso abusivo dos bens do Estado, perseguição aos seus colegas, além da abertura de concursos públicos para empregar pessoas da sua confiança.

No interior do novo edifício do Tribunal Administrativo Provincial de Nampula (TAPN), vive-se um ambiente turvo. Um grupo de funcionários daquela instituição que não quiseram ser identificados acusa a juíza Alda Canda, o juiz-presidente, Amade Limua, e os seus subordinados dos Recursos Humanos de terem instalado “um regime de terror”. Maus-tratos, abuso de poder e processos disciplinares irregulares são algumas situações apontadas numa lista infindável de desmandos perpetrados por aqueles três juízes de direito.

“Contra todas as expectativas, antevendo-se que o TAPN devia demonstrar um ambiente de maturidade relativamente aos demais tribunais do mesmo fórum, surpreendemo- nos com uma situação lamuriante, resultante de clara ignorância, de infantilismo jurisdicional e de atitudes de magistrados verdadeiramente déspotas”, lê-se a dada altura numa carta-denúncia, enviada à Redacção do Jornal @Verdade em Nampula.

Segundo os trabalhadores, os três juízes, nomeadamente Amade Limua, Judite João e Ivan Lisboa, não trabalhavam na magistratura, razão pela qual era de esperar os atropelos registados naquela instituição. “Nós, como funcionários, compreendemos bem isso devido à maneira como eram efectuados os procedimentos administrativos e jurisdicionais dos juízes a nível interno do TAPN”, afirmou o grupo de funcionários.

Em conversa com o @Verdade, os servidores públicos afirmaram que acreditavam que as dificuldades por que passam fossem ultrapassadas e o comportamento viesse a mudar para melhor, uma vez que o Conselho Superior da Magistratura Judicial Administrativa (CSMJA) se sentiu obrigado a alterar os dados do xadrez, com a transferência precoce do juiz Ivan Lisboa para o Tribunal Administrativo da província de Maputo. Lisboa não tinha ainda cumprido os três anos recomendados pelo Estatuto dos Magistrados.

Processos disciplinares

O Tribunal Administrativo Provincial de Nampula transformou-se numa espécie de laboratório de processos disciplinares contra os funcionários. A título de exemplo, um auxiliar administrativo, exercendo a função de motorista, foi sancionado por recusar levar uma guia ilegal do chefe dos Recursos Humanos para o campo para que a mesma fosse carimbada e servisse de justificativo de ajudas de custo.

Por motivos não conhecidos, um motorista que andava com a viatura do juiz-presidente também não escapou da acção, tendo sido penalizado disciplinarmente. Em 2012, por ter reclamado as suas férias de 2011, em plena reunião de funcionários com os magistrados, um funcionário foi sancionado com um processo disciplinar. Um outro trabalhador, afecto à Secretaria-Geral do TAPN, por ter dado boleia a um amigo na motorizada da instituição, foi acusado de usar os meios do Tribunal Administrativo para exercer a actividade de mototáxi.

O @Verdade soube ainda que uma funcionária que exerce a função de oficial de diligências, doente há sensivelmente seis meses, foi notificada a responder em processo disciplinar, não obstante ter apresentado todos os justificativos médicos. No mês de Janeiro, a visada viu o seu salário reduzido numa quantia correspondente a pouco mais de 20 dias, tendo recebido apenas um ordenado inferior a 1.500 meticais, alegadamente porque o juiz-presidente, em coordenação com o chefe dos Recursos Humanos, não concordava com a Junta Médica.

Um outro funcionário, em carreira de Técnico Profissional em Administração Pública, afecto à Secretaria-Geral do TAPN, tem vindo a enfrentar problemas sociais. Ele candidatou-se a uma vaga na Autoridade Tributária, tendo sido apurado e, posteriormente, chamado por aquela instituição para tratar de documentos que permitiriam a sua transferência e uma formação específica em Maputo. Mas o juiz-presidente postergou a oportunidade do indivíduo, o que criou frustração no funcionário.

Presentemente, aquele trabalhador está a sofrer de problemas mentais, tendo alguns intervalos de lucidez, facto que o afastou do trabalho há dois meses. A família reportou o caso ao TAPN, mas ele não escapou a um processo disciplinar. Recentemente, na segunda semana do mês de Março, um agente foi sancionado com um processo disciplinar, por razões desconhecidas. O visado, além de cuidar da relva nas casas dos juízes e limpar as instalações do tribunal, responde pela área de reprografia da instituição.

Abuso de poder

Os funcionários do TAPN acusam o juiz-presidente de abuso de poder. Júlia Marcos Pajume Saíde, concorrente admitida para a carreira de operária na categoria de cozinheira com o visto de nomeação provisória de 26/06/2013, passou a exercer as suas funções na casa de Amade Limua. Ela foi vítima de humilhações, de maus-tratos e de torturas psicológicas por alegadamente não saber preparar “mahéu e badjias”. A visada foi obrigada a redigir uma carta de pedido de demissão e, imediatamente, foi afastada. Em 2012, a secretária do juiz-presidente guardou um lote de processos no seu gabinete e foi de férias. Esta situação causou transtornos a outros trabalhadores que se viram obrigados a explicar o facto por escrito.

Recentemente, o TAPN recebeu uma viatura de marca Nissan Hardboy. O veículo, que se supõe servirá um novo magistrado, tem sido usado pelo chefe da Secção de Administração e Finanças (SAF). “Acontece que, em menos de dois meses, o mesmo carro já está espatifado na parte traseira do lado direito e com o guarda-lama descolado. Não houve nenhum processo disciplinar contra o indivíduo”, afirmaram os funcionários, acrescentando que ”ele é amigo pessoal do juiz-presidente, desde os tempos em que ambos trabalhavam na Direcção Provincial de Saúde de Nampula”.

Os funcionários daquela instituição vão mais longe ao afirmarem que se sabe que o chefe da SAF está no TAPN a convite de juiz Amade Limua cumprindo as funções que lhe são adstritas, facto que elucida a montagem de uma rede de amigos para a usurpação de poderes e saque dos fundos públicos. “Trata-se de um triunvirato: Limua-Gemusse-Ibraimo”, disseram ao @Verdade.

Em 2012, o juiz-presidente do TAPN mandou abrir um concurso de ingresso de novos funcionários, no qual, entre outros, foi admitido um antigo motorista pessoal. Em Dezembro do mesmo ano, os funcionários acusam Limua de ter montado um esquema de dilapidação de fundos do Estado, via pagamentos de ajudas de custo, e num mês submeteu a capacitação todos os trabalhadores e, de forma repetida, os chefes e coordenadores que uma semana antes tinham participado no mesmo curso.

A aludida formação, segundo os funcionários, não trouxe nenhum ganho aos trabalhadores, pelo contrário, prejudicou os serviços da instituição, uma vez que os cidadãos viram os seus processos estagnados em tramitação bastante protelada. Os sectores importantes da instituição estiveram paralisados devido à ausência dos técnicos que se encontravam na suposta formação. Na carta envidada à nossa Redacção em Nampula, os funcionários denunciam ainda que o juiz-presidente e os seus pares, reunidos em encontros de programação que têm tido lugar todas as segundas-feiras com a presença de representantes de cada sector, decidiram pela abolição de pagamentos de horas extras aos técnicos da Contadoria do Visto e respectivo Cartório.

Mudanças de carreiras

O juiz Ivan Lisboa é acusado, por aquele grupo de funcionários, de ter sido usado pelo juiz- -presidente do TAPN para fins obscuros. No dia 06 de Fevereiro de 2013, ele sancionou mudanças de carreiras. O chefe de RH e o da Secretaria Geral mudaram de carreira de Técnicos Profissionais em Administração Pública para Técnicos de Administração de Justiça, dois dias depois viajaram para Maputo para participarem num curso com outros quatro técnicos, sendo um deles um concorrente legal a Técnico Superior de Administração de Justiça que até hoje ainda não começou a trabalhar.

No entender dos funcionários, as razões dessas mudanças estão aliadas à questão do aumento de salários. “Como as ilegalidades tomaram conta deste tribunal, talvez daqui a pouco os mesmos poderão mudar de carreira para juízes de direito, ainda que não reúnam requisitos para o efeito”, disseram.

Juiz-presidente tem a palavra

Instado a pronunciar-se sobre as acusações que pesam sobre si, o juiz-presidente do Tribunal Administrativo Provincial de Nampula, Amade Limua, considerou infundadas as acusações, pois as mesmas não são do seu conhecimento. “Não tenho conhecimento desse assunto”, disse. Refira-se que, desde que foi inaugurado o TAPN em Dezembro de 2010, o Estado tem vindo a gastar milhões de meticais em arrendamento do edifício do tribunal supramencionado, residências para os magistrados, aluguer de viaturas para os mesmos, apetrechamentos da instituição e os respectivos serviços, capacitação de alguns funcionários e dos próprios magistrados, ora em Maputo, ora em Portugal. Presentemente, o TAPN adquiriu três novas viaturas, que perfazem cinco, após a reabilitação de raiz do edifício onde, actualmente, este órgão funciona.

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