Chano, oito anos de idade, magro e cabeça rapada, pousa o braço do “sócio” no seu ombro e guião para pedir esmola através das ruas do Chimoio, Centro de Moçambique, onde ganha a vida como “guia de aluguer”. Com o esfarrapado português, explica que dispensa o seu tempo de escola para “girar” pelas ruas do Chimoio, capital de Manica, para mendigar com o parceiro.
A receita diária é repartida a dois, valor que serve para colocar comida em casa e comprar roupa. “Não é minha família, só vive perto da minha casa. Veio-me pedir para ajudar a andar com ele a pedir esmola e no fim ele me dá também dinheiro ou aquilo que formos a receber”, conta Chano, que não faz ideia de quanto ganham por dia, mas garante: “Dá para comprar comida”. Alguns invisuais, sem ninguém para os conduzir, alugam “crianças guias”, seus vizinhos ou amigos, orientando-os nos peditórios, situação que se coloca como um novo desafio para o Governo e seus parceiros no combate à mendicidade.
“É um desafio, pois entre eles é uma forma de ajuda, porque (as crianças) guias alugadas encontram a forma de ganhar algum, por pertencerem a famílias vulneráveis e sem rendimento, mas temos acautelado os seus direitos”, disse Eugénio Tomás, chefe da repartição da Acção Social, na Direcção Provincial da Mulher e Acção Social de Manica.
Geralmente, os portadores de deficiência visual levam os filhos, para os guiar na prática de mendicidade, mas uma campanha governamental recolheu as crianças com idade escolar para estudar. Actualmente, os filhos guiam os pais no período em que estiverem livres, mas muitos abandonam a escola para se dedicar à mendicidade.
Em 2010, 13.896 crianças desamparadas, órfãs e vulneráveis estavam inscritas nos 40 centros abertos e fechados, além de uma aldeia SOS e um infantário provincial. A Associação dos Cegos e Amblíopes de Moçambique (ACAMO) em Manica garantiu que estão em curso trabalhos para assegurar que “Crianças Guias” alugadas ganhem de forma justa no fim das actividades.
A ACAMO tem 254 membros inscritos. “Por vezes, os portadores de deficiência pedem filhos dos vizinhos e amigos para os guiar e dividem a receita no final do dia, mas não são membros da associação, e temos trabalhado para que a recompensa seja justa”, afiançou Francisco Tembo, presidente da ACAMO, em Manica. Ainda segundo Tembo, uma campanha de registo dos deficientes está em curso para apurar o grau de necessidade e vulnerabilidade de cada um, para melhor direccionar as actividades da associação.
Entretanto, o Governo está preocupado igualmente com a taxa de natalidade entre os casais deficientes visuais, facto que leva a que muitas crianças cresçam num ambiente de mendicidade. “O nível de natalidade preocupa-nos. Há muitas crianças pequenas que vão mendigar com os pais porque não têm com quem ficar em casa, para os cuidar. Então acaba indo uma família inteira, por vezes com oito pessoas”, explica Eugénio Tomás.
No Chimoio a pobreza “sai” à rua todas as quintas-feiras, quando os mendigos vão receber ofertas nas portas das lojas. Uma iniciativa do Governo pretende reduzir a proliferação da mendicidade com a construção de três centros de aglomeração, aonde serão direccionadas as ofertas. Nos centros, serão desenvolvidas actividades de geração de rendimento.