“O último voo do Flamingo”, película baseada no romance homónimo de Mia Couto, é a primeira longa-metragem de João Ribeiro, que é simultaneamente realizador e coprodutor do filme em parceria com Luís Galvão Teles da produtora portuguesa ‘Fado Filmes’.
João confessou, na apresentação, que o início das filmagens era a concretização de um sonho que durou nove anos. O orçamento ronda o milhão de euros. “O João sonhou com este filme. Esse sonho tornou-se realidade, estamos agora aqui a arrancar com ele, e ao mesmo tempo agora é que o sonho vai recomeçar. Esta realidade vai passar a ser sonho outra vez, porque fazer o filme e vivê-lo é o cumprir desse sonho”.
Foi desta forma que o co-produtor Luís Galvão Teles resumiu o desafio que todos têm pela frente na apresentação do filme “O último voo do Flamingo” que decorreu em Marco de 2009 no Hotel Girassol, em Maputo.
Efectivamente, o sonho do realizador João Ribeiro, que teve início há nove anos, tornou- se realidade desde ontem quando começaram as filmagens de “O Último Voo do Flamingo”, película baseada no romance homónimo do escritor moçambicano Mia Couto.
Esta é a primeira longa-metragem de João Ribeiro que é simultaneamente realizador e produtor, embora a produção seja em parceria com Luís Galvão Teles, da produtora portuguesa ‘Fado Filmes’.
A película, cujas filmagens estão previstas durar seis semanas, será rodada na vila de Marracuene, a 45 quilómetros de Maputo. Marracuene pretende ser Tizangara, uma pequena vila perdida no interior de Moçambique. “Escolhemos Marracuene porque, tal como Tizangara, está um pouco parada no tempo. Entre a reconstituição e a destruição, está ali no meio. Possui todos os condimentos que na história Tizangara tem: recebe muita influência da cidade mas não está na cidade, sofreu com a guerra mas não ficou destruída por ela, está ali no meio”, explica João Ribeiro que garante que haverá muita envolvência com a comunidade local, mesmo a nível de figuração.
O mote para o filme, cuja acção decorre pouco depois da assinatura do Acordo de Paz de Roma (1992), é dado por cinco misteriosas explosões que matam outros cinco soldados da força de manutenção da paz da ONU. As provas resumem-se a pénis decepados e a emblemáticos capacetes azuis. Este é o ponto de partida para a enigmática investigação conduzida pelo oficial designado pelas Nações Unidas, o italiano Massimo Risi.
Em relação aos demais actores, destacamse os moçambicanos Eliot Alex, Gilberto Mendes, Mário Mabjaia, Cândida Bila, Alberto Magassel, Matias Xavier e Eduardo Gravata; a portuguesa Cláudia Semedo e a brasileira Adriana Alves. Ribeiro fez questão ainda de dizer que “o filme, pelas suas próprias dinâmicas e pelo seu formato, não será o livro do Mia. Tivemos que fazer opções dramáticas, estéticas e de produção em que num livro o autor da obra escrita não tem de pensar. Será uma nova visão, porque cada um de nós é um autor no momento em que choca com a obra. Não espero fazer um filme igual ao livro. Nos diálogos, não temos muitas opções: iremos seguramente buscá-los ao livro”, esclareceu.
Um mês e meio é a previsão de tempo destinado à pós-produção e o realizador pretende estrear o filme, que está orçamentado em um milhão de euros, em Dezembro próximo. “Era uma excelente prenda de Natal para todos nós”, refere, entre risos, Ribeiro. O financiamento, que virá fundamentalmente de Portugal, França e Brasil, ainda não está todo reunido. “Não tem sido fácil reunir este valor (um milhão de euros). Este montante ainda está em construção. Já temos dinheiro assegurado até à fase da pós-produção mas ainda falta algum”, revela Ribeiro.
Actores e personagens principais do “O último voo do flamingo”
Actor – Carlo d’ Urs / Personagem – Massimo Risi Massimo nasceu no norte de Itália. Diz a lenda, ou conta ele, que é fruto da relação entre um homem muito velho e uma prostituta, o que o leva a dizer “sou filho do meu avô”. Teve uma infância solitária que o leva a embarcar numa viagem à procura de esquecer as raízes: entra como voluntário na ONU e acaba na Missão de Paz do pós-guerra civil em Moçambique (ONUMOZ). A sua missão é resolver o misterioso caso das explosões de Tizangara, que nos últimos dois meses mataram cinco soldados das Nações Unidas. A tarefa vai, contudo, revelar-se bastante complicada, pois é composta por muito mais do que factos e acontecimentos, e o italiano rapidamente compreende que até pode perceber a língua local, mas tudo o resto naquele canto esquecido do mundo precisa de legendas: “Uma terra em que nem tudo o que parece é…”
Actor – Eliot Alex/Personagem – Joaquim Joaquim é o verdadeiro filho da contradição. O seu pai, o Velho Suplício, era o líder tradicional de Tizangara, mas Joaquim nasceu no seio da luta pela independência de Moçambique e na consequente revolução de todo o paradigma social. Joaquim ganha a consciência de que não se pode passar a vida a fugir das suas origens e, no dia da assinatura do Acordo de Paz decide regressar à sua aldeia natal, Tizangara. Só que a paz, mais do que uma palavra, é um conceito difícil de implementar, e Joaquim vai reencontrar uma terra em tudo semelhante à das suas memórias de infância: dividida pelas lutas internas, numa encruzilhada entre o passado e o futuro, a tradição e a modernidade, ainda e sempre o berço da contradição que o viu nascer. A nomeação como tradutor oficial de Massimo Risi na investigação dos soldados mortos será o motivo determinante que lançará Joaquim na Missão de Paz pessoal: um percurso para se reencontrar com o seu passado e os ensinamentos dos seus antepassados.
Actriz – Cláudia Semedo / Personagem – Jovem e Velha Temporina Um rosto enrugado de 88 anos sustido por um corpo virginal de 19 anos é a maldição que habita a alma de Temporina, preço a pagar por não ter escolhido marido no tempo devido. Descobre pela primeira vez o amor nos braços de Massimo, mais um mistério para este resolver no seu percurso para a compreensão total da natureza do país que a todo o custo pretende abandonar.
Actriz – Adriana Alves / Personagem – Ana Deusqueira Tem 30 anos e é a prostituta da vila. “Ana Deusqueira sou eu, meretriz por mérito próprio, promotora da iniciativa local, conhecedora íntima de todos os homens de Tizangara.” Será peça fulcral de toda a investigação levada a cabo por Massimo Risi.
Actor – Gilberto Mendes / Personagem – Padre Muhando O sacerdote da região. Paradoxalmente, detém a missão de orientação espiritual da vila mas a reputação de louco descontrolado vai fazer dele o primeiro suspeito detido por responsabilidade nas explosões. Mas “nesta terra nem tudo o que parece é…”, e a detenção pode não passar de uma manobra: “O meu objectivo é simples e claro. Esta terra há muito que não compreende a minha religiosidade. Quero partir para mundos que me compreendam”.
Actriz – Cândida Bila / Personagem – Ermelinda Auto-intitulada Primeira-Dama de Tizangara. Enamorada pelo poder, que, costuma dizerse, é como o perfume: quem o tem não o sente. Mas Ermelinda delicia-se com a fragrância, e a sua maior preocupação é a aparência que daí resulta. “Temos de mostrar ao mundo que aqui em Tizangara também temos tradução simultânea.”
(Artigo publicado na @Verdade em 2009)