Para continuarmos  a fazer jornalismo independente dos políticos e da vontade dos anunciantes o @Verdade passou a ter um preço.

“Chapa 100”: um sofrimento que nenhum aumento de preço atenua

“Chapa 100”: um sofrimento que nenhum aumento de preço atenua

Viajar num “Chapa 100” do centro da cidade de Maputo para o bairro Abel Jafar, no distrito de Marracuene, vice-versa, para além de ser dispendioso é um autêntico calvário. Durante o trajecto há ligações desnecessárias e típicas de uma anarquia promovida pelos “chapeiros” e que só existe em comprovação da inoperância de quem por obrigação devia refreá-la. Por causa do encurtamento e desvio das distâncias regulamentares, um percurso que, em norma, podia ser feita a um custo de 30 meticais no máximo, ida e volta, chega a exigir o dobro deste valor

Abel Jafar tem a particularidade de ser um bairro, como tantos outros, cuja movimentação dos seus habitantes é condicionada pela falta de transporte. Salvo quem tenha viatura própria. Depois das 19horas e trinta minutos só se chega a pé porque a partir de Albanize ou de Magoanine a essa hora não há “chapas”. Estes terminam de circular muito cedo. Caso contrário deve-se contar com a boleia de pessoas benevolentes, mas que nem sempre andam por aquela zona.

No domingo passado, o @Verdade fez uma simulação do impacto do custo de transporte (ligações por causa dos vulgos encurtamentos e desvios de rotas) com a finalidade de perceber como tem sido a vida de um pacato cidadão que, por exemplo, aufere um salário mínimo mensal estimado em 2.300 meticais. Para além das suas deslocações diárias, o mesmo custeia as despesas de dois filhos que frequentam a 7ª e 10ª classes respectivamente, algures na cidade de Maputo.

Entretanto, para além da via Albazine–AbelJafar, há um outra opção, a mais complicada: Gwava–Mateque, mas chegado neste último bairro são cerca de três quilómetros a pé para Abel Jafar, com o prejuízo de ser objecto de agressões protagonizada pelos amigos do alheio.

De Abel Jafar para o centro da capital do país, vice-versa, ainda não existe nenhum “chapa 100” nem autocarro. Uma das alternativas é partir daquele bairro apanhar um meio de transporte, geralmente carinhas de caixa aberta, com destino a Albazine. Daqui para os restantes pontos da urbe é necessário fazer muitas ligações.

Aliás, apenas a Empresa Municipal de Transportes (outrora Transportes Públicos de Maputo – TPM) a Federação Moçambicana dos Transportadores Rodoviários (FEMATRO) possuem alguns machibombos que partem de Museu e Baixa para aquele ponto, que embora tenha sinais claros de progresso, ainda se ressente da falta de meios circulantes para que os residentes possam viajar incondicionalmente para onde queiram.

Nos dias chuvosos a situação é deveras lastimosa. Aquele é um bairro onde é proibido ter pressa, mesmo com dinheiro para fazer ligações, os “chapas” são sobremaneira escassos. É normal ficar-se 1hora e meia à espera de um “chapa”. Nos domingos fica-se duas a 3horas. Depois deste tempo às secas, aparece um caixa aberta superlotado, mas por falta de opção é só pendurar-se nele e pagar uns 10 meticais.

Um cidadão que vive em Abel Jafar enquanto trabalha na cidade de Maputo para chegar ao serviço deve no mínimo apanhar três “chapas”. Daquele bairro para Albazine, deste para Mogoanine CMC. Daqui para a rotunda de Magoanine e daqui para Museu ou Baixa.

Isto com sorte, porque o normal tem sido daquela rotunda para o terminal Xiquelene e deste para um dos dois destinos dependendo da localização do seu posto de trabalho. No fim desta viajem já gastou algo como 20 meticais só de ida. No regresso o trajecto é o mesmo, o que totaliza 40 meticais. Por mês o saldo deste sofrimento todo é de 1.200 meticais.

Sem procurar saber quanto é que este cidadão gasta com as restantes despesas inerentes à sua sobrevivência, percebe-se que no seu salário de 2.300 meticais só restam 2.100.

Será que cobre o rancho mensal que alimente uma família de quatro membros? Todavia, se ele fosse poupado das ligações, caso quem de direito não se rendesse ao caos que caracteriza o sector dos transportes, pouparia metade do que tem gasto nas suas amargas deslocações.

Enquanto a edilidade de Maputo ensaia, retraidamente, quando é que a nova tarifa de transporte público de passageiros deve entrar em vigor, a desordem dos “chapeiros” na via pública aniquila qualquer expectativa de, a curto prazo, os utentes desses meios circulantes públicos voltarem a viajar cómoda e seguramente como um dia o fizeram.

FMI adverte o Governo

Enquanto os cidadãos sofrem como seu próprio dinheiro, o representante do Fundo Monetário Internacional (FMI) para Moçambique, Victor Lledó, advertiu o Governo para ter “muito cuidado com o aumento dos preços dos transportes, para não penalizar os cidadãos mais pobres”.

De acordo com Victor Lledó, as decisões relacionadas como o aumento da tarifa de transporte são difíceis de tomar porque que “têm um impacto forte no custo de vida da população. Devem ser tomadas com muito cuidado e bem pensadas de modo a que possam ser defendidas as camadas mais pobres”.

Num outro desenvolvimento, aquele responsável disse que o Executivo deve recordar as lições dos protestos de 05 de Fevereiro de 2008 e de 01 e 02 de Setembro de 2010.

“As lições dos protestos de 2010 mostraram que a necessidade dos reajustes desses preços sejam extremamente bem comunicados à sociedade como um todo. Acredito que o Governo aprendeu essas lições e está a tentar ao máximo comunicar as futuras decisões”, comentou.

Para Lledó, o sector privado tem um poder incrível de se adaptar a situações de controlo de preços. No caso dos “chapas”, os crónicos encurtamentos e desvios de distâncias regulamentares, que às vezes ocorrem “nas barbas” dos fiscais de trânsito na via pública, significam que há tempo que o cidadão está a pagar um aumento que não lhe foi oficialmente comunicado.

“Já houve um aumento implícito das tarifas, e mesmo do transporte público através do encurtamento de rotas. Então, de certa forma, a população já vem sofrendo do aumento do custo de transporte, sem que necessariamente tenha havido um aumento oficial das tarifas”, concluiu.

Facebook
Twitter
LinkedIn
Pinterest

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Related Posts