Em Novembro, alguns espaços culturais da cidade de Maputo serão palco de mostras de obras de teatro. Caso o estimado leitor deparar – no seu bairro, inclusive na prisão – com uma manifestação artística do género, não se surpreenda, pois trata-se da celebração dos 25 anos do Grupo Teatral Mutumbela Gogo.
De acordo com os mentores da iniciativa, pela celebração dos 25 anos do primeiro grupo de teatro profissional em Moçambique, serão dedicadas cerca de 200 horas para a exibição de obras teatrais, numa mescla de actores, romancistas e dramaturgos moçambicanos, alemães, portugueses, bem como austríacos.
Alguns grupos emergentes e semiprofissionais nacionais como o Teatro Haya-Haya da Beira, Grupo Mbeu, Mahamba, e Luarte são as atracções deste festival de caris internacional em que se irá associar a realização de exposições fotográficas e a projecção de filmes documentários com o intuito de denunciar os momentos mais simbólicos do percurso do Mutumbela Gogo.
“O objectivo do presente festival é dar uma mais-valia em termos organizacionais aos outros grupos, bem como a possibilidade de os outros grupos assistirem ao teatro de outros países”, assinala o Mutumbela em nota enviada ao @Verdade.
Para o efeito, mais do que realçar o contributo da mulher na actividade artística, o seminário “o papel da mulher na vida artística do país”, a ter lugar na ocasião, irá envolver personalidades nacionais e internacionais bem entendidas nas artes e literatura designadamente a activista social, Graça Machel, e conceituados romancistas moçambicanos como Mia Couto e Paulina Chiziane, a actriz Lucrécia Paco, protagonista do monólogo “Mulher asfalto”, bem como os visitantes Henning Mankell e Edith Golber.
Espera-se que o seminário seja não somente um momento para se debruçar sobre a mulher, uma figura sempre presente e activa no teatro moçambicano, mas, acima de tudo, uma forma de instigá-la a apostar na arte nas suas acções tendentes a remover o país do subdesenvolvimento.
O Café Bar Modaskavalu, anexo ao Teatro Avenida, onde se realizarão espéculos de rua, a Fortaleza de Maputo, o Centro Cultural Brasil Moçambique, a Prisão da Machava, o Paços do Conselho Municipal de Maputo, o Centro Cultural Municipal Ntsindya, no bairro suburbano de Xipamanine, são alguns locais que irão acolher o festival que irá durar uma semana, concretamente de 06 a 13 de Novembro vindouro.
Porque pela sua história de formação, bem como por alguma tendência temática que quis abordar nos primeiros anos, o Mutumbela Gogo não se pôde dissociar das causas nacionalistas moçambicanas, daí contar com o apoio de Marcelino dos Santos, uma figura política incontornável na luta armada de libertação nacional.
Aliás, sobre Marcelino dos Santos, o colectivo afirma ser “alguém que nos acompanhou desde a primeira hora de formação, dando alento ao desenvolvimento da nossa actividade artística”.
Mutumbela Gogo
O Grupo de Teatro Mutumbela Gogo não é a mais antiga colectividade teatral do Moçambique independente – como erroneamente se costuma escrever – mas é o primeiro a ascender à categoria profissional.
Criado a 06 de Novembro de 1986, o Mutumbela apostou imediatamente em fazer teatro de forma profissional e permanente, tendo levado ao palco as obras “Qual é a coisa, Qual é ela?”, “Funeral de um Rato”, respectivamente escritas por Maria Arminda Falabella e Mia Couto, mas sob direcção artística de Isadora Dias e exibidas no ano seguinte da sua criação.
“Os Governadores do Orvalho” de Jacques Romain, “Eu, Eduardo Sonhei a Terra” cujo texto e encenação são da autoria de Henning Mankell, bem como “Nove Hora”, do poeta moçambicano Rui Nogar e encenado por Manuela Soeiro, encerraram a década de ´80.
De lá a esta parte, o grupo conta com cerca de 70 peças teatrais apresentadas no país e em diversas partes do mundo, sendo que obras como “A Filha do Polígamo” (de Nassour Attoumane, com encenação de Graça Silva), “Um Eléctrico Chamado Desejo” (de Tenesse Williams, sob direcção de Henning Mankel), “Confissões dos Adolescentes”, (de Mariana, dirigida por Manuela Soeiro), “Menina Júlia” (de August Strindberg, com encenação de Henning Mankel), “Há Tigres no Congo” (de Bengt Ahlfors, encenada por Graça Silva), “Nove Hora” (de Rui Nogar, readaptada e encenada por Lucrécia Paco), constituem algumas das obras que nos últimos tem apresentado ao público.
Pela sua contribuição para o desenvolvimento do teatro em Moçambique, o Mutumbela Gogo recebeu o “Prémio de Mérito Teatral Lusófono” em 1996. Oitos anos depois, em 2004, as actrizes Lucrécia Paco (2004) e Graça Silva (2005) foram laureadas como melhores actrizes moçambicanas pela Revista TVZINE. No mesmo ano, a RDP – África conferiu uma distinção teatral ao grupo.
Mutumbela Gogo é, assim, uma escola para as pessoas que ainda encontram nas artes dramáticas, não mais do que uma diversão mas, acima de tudo, um ofício, uma profissão. Na próxima edição @Verdade publicará uma entrevista feita à dirigente do teatro Avenida e principal directora artística do grupo, Manuela Soeiro, em que se aborda não somente o percurso do Mutumbela, como também a forma como a sociedade absorveu tal colectividade.