O treinador moçambicano do Desportivo de Maputo, Artur Semedo, que já conquistou três títulos nacionais, dos quais dois ao serviço da Liga Muçulmana e outro ao comando do Ferroviário de Maputo, disse, em entrevista ao @Verdade, que “o futebol moçambicano é uma grande comédia”. Para aquele técnico, a sua equipa é a única que pratica um futebol vistoso em Moçambique.
Em 2012, Artur Semedo aceitou o desafio de abraçar um Desportivo de Maputo em queda livre. Aquando da sua chegada, aquele técnico era tido como um “salvador” mas as aspirações daquela colectividade de garantir a manutenção no Moçambola foram goradas no planalto de Tete, naquela fatídica tarde de 11 de Novembro. No jogo contra o Chingale, os alvinegros perderam por 1 a 0 e foram “despachados” para a segunda divisão.
Em 2013, Semedo envolveu-se no projecto daquele emblema na luta pelo regresso ao “lugar de onde nunca deveria ter saído”. Sagrou-se campeão da cidade e venceu a Poule Sul de Apuramento para o Moçambola. Nesta semana, aquele técnico contou ao @Verdade como foi comandar uma equipa na segunda divisão e fez uma radiografia, ainda que na esteira duma opinião, daquilo que é o futebol moçambicano na actualidade.
@Verdade – Depois da queda do Desportivo de Maputo em 2012 surgiram rumores de que Artur Semedo ia para o Costa do Sol ou outro clube do Moçambola como é o caso do HCB de Songo. O próprio mister confirmou que recebeu vários convites, sendo alguns tentadores. O que o levou a optar pela segunda divisão?
Artur Semedo – Foi melhor para mim continuar no Desportivo de Maputo. Ademais, constituiu um grande desafio. Nunca havia disputado uma prova daquela natureza e com várias adversidades. Disse, na altura, que estava disposto a ir até às últimas consequências e que o meu futuro dependia simplesmente de mim e nunca dos outros. Fiquei no Desportivo para agradar aquelas pessoas que me empurraram para a segunda divisão, e jurei para mim mesmo que ia devolver este emblema ao lugar de onde nunca deveria ter saído.
@V – E como foi essa experiência de trabalhar num campeonato de segundo escalão?
AS – Foi uma grande experiência. Disputar o Campeonato de Futebol da Cidade de Maputo fortaleceu-me como homem e como treinador. Digo isto com algum fanatismo porque achei simpático ter que disputar o Torneio de Abertura, o Campeonato da Cidade e a Poule de Apuramento para o Moçambola numa época. Para mim essas três são competições bastante emocionantes, mais do que a primeira divisão. Ali os adeptos vivem intensamente as emoções dos jogos. É como se fossem de um campeonato inglês em que se canta desde o primeiro até ao último minuto.
@V – E olhando para o plantel que tem, acha que está em condições de ombrear com as grandes equipas do Moçambola?
AS – Perspectivámos esta temporada com cautela. Partimos do princípio de que será muito difícil, olhando para o plantel que temos, maioritariamente composto por jogadores jovens. O nível de exigências no Moçambola é superior em relação à Poule e ao próprio Campeonato da Cidade. É um facto que temos um núcleo coeso. Temos um pilar constituído por jogadores com alguma qualidade.
@V – É dono da célebre expressão “futebol medíocre” quando se caracteriza o estágio actual desta modalidade desportiva em Moçambique. Continua a pensar assim?
AS – Para mim o futebol moçambicano nunca deixou de ser uma fraude. Como disse anteriormente, os gestores do nosso futebol são um bando de trapaceiros que apoiam uma determinada equipa e que tudo fazem para que ela ganhe tudo, manifestamente prejudicando as outras que trabalham humilde e honestamente para ganhar os jogos.
@V – Quem são esses gestores?
AS – Não podemos perder o nosso precioso tempo a citá-los. O povo moçambicano sabe quem são eles.
@V – Moçambique tem sido o “El Dorado” de treinadores estrangeiros, sobretudo portugueses, que encontram aceitação em vários clubes nacionais. Em termos técnicos, será que não temos treinadores nacionais competentes para orientar esses clubes?
AS – Em Moçambique há vários treinadores com competência para treinar qualquer clube nacional. Infelizmente, estamos num momento em que os gestores dos clubes ambicionam conquistar títulos e acham que a solução é contratar treinadores estrangeiros. Só que o único benefício que podemos encontrar nesses técnicos estrangeiros é que eles acabam por ajudar a melhorar a estrutura dessas colectividades muitas das quais não passam de rudimentares.
@V – Mas em termos técnicos, que mais-valia eles trazem aos clubes nacionais?
AS – Esses treinadores estrangeiros tentam remar contra a maré o que é, de per si, benéfico. É só olharmos para alguns clubes que no passado jogavam a bola para a frente e que hoje até conseguem sair com a bola trocada entre os jogadores.
@V – Artur Semedo é muito controverso. Em cada aparição pública lança duras farpas a qualquer agente desportivo. Será que podemos considerá-lo um treinador perfeito, o espelho daquilo que ele pretende que seja o futebol moçambicano?
AS – Ainda não. Tenho muito a dar e por isso não me considero um profissional realizado. Felizmente, conquistei o meu lugar no futebol moçambicano. Foi com muito suor e, acima de tudo, com muita humildade que hoje sou uma pessoa reconhecida em Moçambique.