Quase nunca te digo o que sinto por ti porque te conheço bem, minha querida Mariazinha. Se te disser que gosto muito de ti, vais pensar que te amo para sempre.
Se te confessar que tenho saudades tuas e penso em ti quase todos os dias, vais pensar que estou apaixonado. Se te contar que à noite sonho com o teu corpo e que viro a cabeça nos aeroportos sempre que passa uma mulher que usa o teu perfume, vais acreditar que és a mulher da minha vida e que um dia destes te bato à porta com um cesto de laranjas e o coração embrulhado num presente.
É verdade que gosto muito de ti, que tenho saudades tuas, que penso em ti quase todos os dias e que à noite desejo teu corpo na minha cama. É verdade que já pensei que te amava, já me senti apaixonado por ti e que a minha cabeça roda atrás de um perfume que me lembra o teu, mas não sei se te amo nem tenho a convicção que sejas a mulher da minha vida porque não vivi o suficiente e nunca vivi contigo.
Tu és uma espécie de sonho, uma personagem da Jane Austen, um ideal encomendado de mulher; tens um corpo magro e certo, uma pele que não é deste mundo, um cabelo que canta quando ondula e o olhar mais perdido que já vi, como se tudo o mundo perfeito que te rodeia não chegasse para te proteger. Não és só bonita; és elegante. Não és só inteligente, és clarividente e sabes ler-me como ninguém.
Não és só querida; és talvez a pessoa mais dedicada que conheci. Tens um je ne sais quoi que me dá a volta à cabeça. E por seres assim, é que tenho tanto medo de ti. Tenho medo de não ser como tu e de não te dar o que mereces. Tenho medo de te desiludir e de te enganar com as minhas dúvidas e defeitos. Tenho medo que um dia deixes de olhar para mim como se fosse o teu príncipe, porque ninguém pode ser um príncipe para sempre, e se eu descer do cavalo tu vais ver os meus defeitos horríveis; os dias negros, o mau feitio, a intolerância, o sarcasmo e outros fantasmas.
Mas eu gosto de ti, Mariazinha. Gosto de ti mais do que pensas e de formas que nem imaginas. Gosto de pensar que podia viver ao teu lado sem nunca me aborrecer e que, juntos, seríamos invencíveis. Gosto de te imaginar sentada junto à lareira a ler, em silêncio. Gosto de pensar que os anos te vão fazer ainda mais serena e que nunca vais envelhecer. Gosto do teu filho e gostava de ter um filho assim.
Gosto de pensar que, de uma forma qualquer, vais fazer sempre parte da minha vida, porque podias ser minha irmã, ou a minha melhor amiga de uma infância imaginada por nós. Mas não sei se isto é amor, porque só amei uma vez e nunca fui feliz. Não aprendi a juntar as peças e sou demasiado orgulhoso para permitir que alguém ensine. Mesmo que me desenhes mapas e me proves axiomas, mesmo que estendas aos meus pés um dominó perfeito que me leve até ti, sou eu que tenho de descobrir o meu caminho.
Pode ser que um dia volte, nem que seja para te dizer que não fico. Ou pode ser que um dia fique, sem saber que já voltei, sem perceber que descobri o meu lugar. Ou pode ser que o meu lugar seja aqui, no mundo que construí à medida dos meus medos e do qual não sei que quero, ou posso sair.
Mas por favor nunca deixes de acreditar que podes realizar tudo o que desejas, nunca percas a cintura de vespa e o olhar de criança, nunca desistas de ser assim, corajosa e temerária, como um guerreiro que descansa depois de todas as conquistas, sem nunca deixar de sonhar com a vitória, porque preciso de me guiar por essa força e essa luz que há tantos meses me protege no escuro e vai matando, sem saber, todos os fantasmas que ainda me prendem.