Os maus-tratos físicos e psicológicos a que as pessoas da terceira idade estão sujeitas, que consistem na acusação de supostas práticas de bruxaria, nos insultos, na responsabilização por alegados insucessos das suas famílias e até de terceiros, na privação de alimentos, na falta de garantia de condições de higiene, na falta de assistência médica, na exploração financeira, no abandono, entre outros males, não lhes permitem viver com dignidade no mundo, particularmente em Moçambique. Por mais rugas que o idoso tenha, ele é nosso pai, tio, avô, mãe, etc., e merece o respeito, o amor e o cuidado dos seus parentes. Porém, o desdém que se tem por este grupo parece ser cada vez mais notório, de tal sorte que ele passa por necessidades básicas.
A 01 de Outubro em curso celebrou-se o Dia Mundial do Idoso. Em Moçambique, a efeméride foi comemorada num ambiente de alegria e frustração porque a situação social e económica dos indivíduos da terceira idade é deveras deprimente. As autoridades governamentais estimam que no país existem pouco mais de dois milhões de idosos cujo grosso sobrevive com menos de 10 meticais por dia.
Se cada um de nós cuidasse do seu pai ou da sua mãe, dos seus tios ou avôs, talvez não teríamos uma legião de anciões a deambularem pelas artérias dos grandes centros urbanos, sobretudo, para pedir esmola. Pode ser uma ilusão esperar que o Governo consiga sozinho resolver esta situação porque os recursos de que dispõe nunca foram suficientes para todos os governados. E a sociedade não deve, nunca, relegar somente ao Estado a tarefa de cuidar das pessoas da terceira idade nem julgar que as pensões ou os subsídios atribuídos a esta classe pelas instituições do Estado podem resolver os problemas acima enumerados.
Um estudo recente sobre a protecção social em Moçambique, realizado pelo Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE), indica que o país não dispõe de uma pensão universal para os idosos porque ainda “não existem incentivos suficientes para se substituir um sistema selectivo, fragmentado, discriminatório e caritativo, por um sistema universal inclusivo e potencialmente estruturante de novas relações internacionais em prol de uma efectiva coesão social”.
“O sistema de segurança e assistência social moçambicano não obedece aos princípios de universalidade, progressividade, equidade, inclusão, eficiência, solidariedade, transparência, entre outros”, indica o IESE e acrescenta que “o sistema formal cobre e beneficia, ainda que numa forma fragmentada, selectiva e discriminatória, cerca de 10 porcento da população moçambicana“.
O país, de acordo com a pesquisa, possui a segunda maior taxa de participação de anciões na força de trabalho no mundo. A maioria dos idosos trabalha até morrer, mas devido ao facto de as suas contribuições para a economia nacional, durante a juventude e a fase adulta, não obedecerem a nenhum procedimento administrativo, e não garantirem uma poupança, eles não são elegíveis ao actual modelo durante a velhice. (…) Elege-se os chamados “vulneráveis”, “enquanto o resto, a grande maioria, que se arranje por si própria. Entretanto, quem mais tem sustentado e pago a manutenção do actual sistema formal são os doadores internacionais”.
O fracasso das políticas públicas
Para o IESE, muito provavelmente, o Estado moçambicano só vai assumir uma postura progressiva e positiva em relação às condições de vida dos idosos quando o risco e o custo da sua marginalização se tornarem maiores e mais prejudiciais do que são os benefícios actuais, principalmente para os decisores políticos e administradores da coisa pública.
“Ironicamente, quanto mais análises sistemáticos têm surgido sobre a alocação dos recursos públicos aos programas selectivos de assistência social, implementados em Moçambique, mais se confirmam a inoperância e a incapacidade dos mesmos se tornarem ‘pró-pobre’. (…) Tem pouco sentido esperar que algo se torne universal e inclusivo quando desde o início é concebido e projectado como selectivo e discriminatório”.
Os rostos da indigência
António Murrupa, cuja idade desconhece mas aparenta 80 anos, é um dos beneficiários do apoio disponibilizado pelo Instituto Nacional de Segurança Social (INAS) no distrito de Rapale, província de Nampula. Apesar disso, ele enfrenta uma batalha sem precedentes para sobreviver.
Os familiares pouco se importam com a sua existência, razão pela qual o seu dia-a-dia é pautado por muito sofrimento. Murrupa defende a necessidade de se apoiar as pessoas da terceira idade pelo facto de não possuírem capacidade física para desenvolver qualquer tipo de actividade que lhes propicie o melhoramento das suas condições de vida. Mas o que acontece, actualmente, é o contrário.
Os idosos são, efectivamente, abandonados e deixados à sua própria sorte. Em consequência dessa situação, o nosso entrevistado sobrevive com base em pequenos campos de cultivo de produtos alimentares, uma actividade que não tem sido fácil realizar devido à sua idade. Mas, ele afirmou que não tem alternativa, porque deve continuar a trabalhar para que possa garantir o seu sustento diário, embora com capacidade diminuída de produzir o suficiente.
“Eu acho que nós (pessoas idosas), merecemos o mesmo tratamento, os mesmos cuidados que uma criança. Com esta idade, sou obrigado a levar nas costas uma enxada e trabalhar a terra para o meu próprio sustento”, lamentou.
Relativamente ao subsídio básico social oferecido pelo INAS, o nosso interlocutor considerou-o insuficiente para suprir as necessidades diárias dos seus beneficiários. Segundo apurámos, os valores variam entre os 250 e 700 meticais, dependendo do número do agregado familiar. O idoso é viúvo e vive isolado. Neste momento, recebe no fim de cada mês 250 meticais.
Com o valor, ele não consegue obter mais do que um litro de óleo que custa entre 80 e 90 meticais, um quilograma de açúcar ao preço de 45 meticais e quatro quilogramas de arroz a 112 meticais. “Fazendo o somatório do dinheiro que recebemos e os produtos através do qual é possível adquirir pode-se afirmar que, na verdade, o valor é uma ninharia, pois não chega para comprar mantimentos para uma pessoa com uma idade avançada e que nada pode fazer para o seu sustento”, lamentou.
O quotidiano de Murrupa torna-se cada vez mais desconfortável e difícil, pois, vê-se na obrigação de procurar água para o seu consumo, transportar lenha, cozinhar, entre outras actividades caseiras. Às vezes, os vizinhos e pessoas de boa-fé têm prestado ajuda ao ancião. Aquela que é considerada “biblioteca” ainda viva do distrito Rapale entende que o Governo deve estudar a questão dos valores destinados ao subsídio social básico para os idosos e a fixação das taxas devia ser feita de acordo com o custo de vida em curso no país.
Nessa ordem de ideias, o nosso entrevistado é da opinião de que o dinheiro tinha de ser acima de 750 mil meticais para cada agregado familiar, pois isso iria ajudar a cobrir as suas despesas básicas para um período de cerca de 30 dias. Para o nosso entrevistado, há necessidade de, igualmente, se melhorar o processo de atendimento aos idosos a nível das unidades sanitárias.
Os direitos a assistência médica e medicamentosa tornam-se uma miragem na medida em que as farmácias públicas debatem-se com sérios problemas de falta de fármacos. Além disso, ele denunciou a falta de respeito por parte de alguns profissionais da Saúde que permitem que pessoas da terceira idade fiquem horas a fio nas filas para serem atendidas, contrariando a política de prioridades definidas pelo Executivo moçambicano para aquela classe social.
Rosa Roque: uma idosa que sobrevive ao deus-dará
Aos 86 anos de idade, Rosa Roque, mãe de um filho deficiente, moradora no bairro de Namicopo, Unidade Comunal Palmeiras-2, arredores da cidade de Nampula, é deficiente visual e vive em extrema pobreza. Além da deficiência, ela está impossibilitada de caminhar devido a uma fractura na perna. A sua condição de vida é agravada pelas frequentes acusações de prática de feitiçaria, o que condicionou o seu abandono pelos vizinhos e familiares.
Em consequência disso, Rosa Roque invoca a Deus para que lhe conceda a morte no sentido de se livrar do sofrimento por que tem passado. Presentemente, a idosa vive ao deus-dará. Na verdade, a história da anciã é semelhante à de vários outros cidadãos da sua faixa etária. Ela nunca beneficiou do fundo de subsistência para a pessoa da terceira idade disponibilizado pelo INAS. Amordaçada pela vida e humilhada pelos familiares e vizinhos, Rosa Roque encontra razões para continuar a viver mercê do apoio prestado pelos membros da Comunidade de Sant’Egídio na província de Nampula.
Diante do desespero, a anciã lamenta por causa do facto de não poder locomover-se, pois o seu desejo era de ir às lojas com vista a pedir esmola como fazem as outras pessoas que se encontram nas mesmas condições. Segundo a nossa interlocutora, a decisão nesse sentido não significa que o apoio da comunidade de Saint’Egídio seja insuficiente para satisfazer as suas necessidades, mas seria uma forma de mostrar à sociedade a sua maneira de protestar contra a falta de consideração para com os idosos nos dias que correm.
Madalena Sagasta: Uma luta contra o desamparo
Madalena Sagasta, de 74 anos de idade, natural do distrito da Maganja da Costa, província da Zambézia, centro de Moçambique, é mãe de oito filhos dos quais três perderam a vida e os restantes cinco fixaram residência na cidade de Maputo. A septuagenária é uma mulher que luta contra enormes adversidades no seu quotidiano.
Votada ao desamparo e sem meios de sobrevivência, ela vive na incerteza do que há-de comer a cada novo dia. A idosa mora com três netos órfãos de pais e tem sido um verdadeiro calvário garantir alimentação regular aos menores. O estranho é que em redor da anciã vive toda a sua família, mas ninguém ousa prestar-lhe apoio. Além disso, ela não é beneficiária do fundo de assistência social do INAS.
“Se todos os filhos tivessem o mesmo sentimento de amor, caridade e solidariedade para com os progenitores, eu não estaria nessas condições e a lamentar da vida”, disse, referindo que as cinco filhas que, actualmente, residem na cidade de Maputo nunca pensaram em visitá-la e, muito menos, prestar-lhe assistência.
Em 2008, o secretário do bairro Bala-Murotone levou os documentos da idosa com o intuito de inscrevê-la no INAS em Maganja da Costa de modo a colocar o seu nome na lista dos beneficiários do subsídio social básico, mas até este momento nem água vai, nem água vem. Na verdade, ela sente-se excluída até pelas autoridades do governo distrital.
“Não sei que tipo de azar eu tenho. Os chefes do bairro levaram os meus documentos e até hoje nunca fui chamada”, disse a idosa num tom de tristeza. A situação de exclusão é, segundo a nossa interlocutora, uma realidade na Maganja da Costa. Por exemplo, no Dia Internacional do Idoso, assinalado a 01 de Outubro, o governo distrital ofereceu um almoço de confraternização, tendo, para o efeito, convidado apenas os beneficiários do fundo de subsídio social básico.
Sem ter o que comer, ela luta todos os dias para se manter viva. A idosa contou que, durante a sua vida, nunca se dedicou a nenhuma actividade de subsistência e, muito menos, se sentou no banco da escola, facto que ela acredita ser um dos principais motivos do seu sofrimento, associado à perda precoce dos seus filhos.
“Muitas vezes, para ter o que comer, tenho de bater à porta de algumas casas desta zona para pedir farinha de mandioca”, diz. Apesar da dor a que está sujeita, a anciã diz que em nenhum momento pensou em dirigir-se aos estabelecimentos comerciais e à via pública com o objectivo de pedir esmola, o que considera algo que não dignifica um ser humano. “Não quero pedir esmola, e nunca farei isso apesar de estar a enfrentar estas dificuldades”, afirmou.
Dos maus-tratos ao centro de acolhimento
Artur Muruha, que aparenta ter mais de 55 anos de idade, natural de Nanhupo Rio, no distrito de Mogovolas, e Luciano Mualeti, que não sabe em que ano nasceu, mas aparenta ter mais de 70 anos, oriundo de Nétia, distrito de Monapo, são dois idosos que partilham o mesmo espaço no único Centro de Apoio à Velhice da Cidade de Nampula, há anos.
As razões da sua estadia nesta instituição são as mesmas: foram humilhados, maltratados e rejeitados pelos seus próprios parentes, incluindo os filhos, que os acusam de feitiçaria. Apesar de terem sido abandonados pela família, os nossos interlocutores afirmam que se sentem bem no asilo e desde que lá estão têm amparo, dignidade e as suas vidas mudaram para melhor. Os anciãos declararam, de forma unânime, que estão satisfeitos na “nova casa” mas não se esquecem jamais dos momentos difíceis pelos quais passaram nas suas zonas de origem.
Consideram que hoje levam uma vida digna e regrada, cumprem os horários das refeições, devendo recolher aos dormitórios até às 20 horas o mais tardar. No Centro de Apoio à Velhice onde se encontram acolhidos não exercem nenhuma actividade devido à sua incapacidade física, mas passam o tempo de forma descontraída e a participar nos cultos religiosos. Todavia, nunca foram visitados pelos familiares.
Há um ano, Artur Muruha e Luciano Mualeti disseram à nossa Reportagem que, para além de não estarem capacitados para realizar nenhuma actividade que assegure a sua sobrevivência sem que tenham de depender necessariamente do apoio do centro, a cegueira atingiu um estágio severo que já não lhes permite reconhecer as pessoas; por isso não sabem se têm família ou não, até porque nunca ninguém os foi visitar e identificar-se como seus parentes.
Fórum da Terceira Idade em Nampula: “Os idosos são descriminados”
Embora o Governo esteja a redobrar esforços com vista a criar melhores condições para a sobrevivência da pessoa da terceira idade, os idosos continuam a viver numa situação deplorável. Os visados são, cada vez mais, vítimas de descriminação, sobe o índice de violação do seu direito de prioridade, para além de serem física e psicologicamente violentados pelos seus familiares, acusados de práticas de feitiçaria, facto que condiciona o bem-estar desta camada social.
Esta realidade que não só preocupa as autoridades governamentais, mas também a sociedade em geral, foi manifestada pelo Fórum da Terceira Idade, em Rapale, província de Nampula, na passada quarta-feira (01), à margem da celebração de mais uma passagem do Dia Internacional do Idoso com o lema “Valorizemos a pessoa idosa: respeitar, amar e proteger é o nosso dever”.
A mensagem apresentada por aquela organização, que tem por objectivo promover os direitos do idoso e a sua inclusão social, estava centrada na protecção social dos anciãos para o seu bem-estar, tendo igualmente espelhado que o idoso não se sente minimamente realizado devido a vários factores a que está sujeito como descriminação e rejeição, agressões físicas, o não atendimento adequado nas unidades de saúde, difícil acesso ao transporte, entre outros.
Óscar Julião, falando em representação do Fórum da Terceira Idade, disse que o Governo devia encontrar um meio-termo para facilitar a vida do idoso, providenciando acesso fácil aos serviços básicos como a assistência médica e medicamentosa, e caso nas farmácias públicas escasseiem os fármacos prescritos, que se estipule um desconto de 50 porcento em benefício da pessoa idosa, e a observação do direito à prioridade.
Num outro desenvolvimento, Julião disse que outro problema dos idosos prende-se com o abandono dos visados por parte dos familiares, incluindo os seus próprios filhos, que os acusam de feitiçaria. Por seu turno, Filipe Augusto Bô, delegado do Instituto Nacional de Acção Social (INAS) em Nampula, lamentou o facto de os idosos serem, cada vez mais, vítimas de rejeição por parte dos seus parentes e apelou à população para que valorize sempre os seus progenitores.
Por outro lado, Bô reconheceu que o valor estipulado para o subsídio básico alocado aos idosos é irrisório, tendo afirmado que se deve à condição económica, à extensão do país e ao propósito de atingir um número maior de beneficiários. “Na verdade, gostaríamos de dar mais aos nossos idosos, mas, como sabemos, somos um país vasto e com muitas pessoas a viverem na pobreza absoluta. É por causa disso que tentamos partilhar com todos o pequeno bolo que temos”, disse.
Os filhos venderam a casa
Rosário Matsinhe, de 67 anos de idade, residente em Matendene, na cidade de Maputo, disse que passou a frequentar a rua como mendigo desde 2011, quando os seus filhos venderam a sua casa sem o seu conhecimento. Quando procurou saber o que se passou a ponto de ficar sem tecto foi acusado de feitiçaria e de ser a causa dos insucessos de parte dos seus parentes. O ancião contou que passou a depender de pessoas de boa vontade para comer e dormir. A dado momento, tentou regressar à sua terra natal (Chimoio) mas nunca concretizou esse desejo porque julga que lá a sua situação financeira se pode deteriorar ainda mais.
Idosa brutalmente espancada pelo filho
Em Março deste ano, no bairro do Aeroporto, na cidade de Maputo, uma anciã identificada pelo nome de Rosa Amoche, de 79 anos de idade, foi brutalmente agredida e escorraçada da sua residência pelo filho, identificado pelo nome de Beto, de 29 anos de idade, em resultado de a mãe ter descoberto que ele havia escondido uma porção de soruma e haxixe no seu quarto. Na altura, a vítima declarou ao @Verdade que não era a primeira vez que isso acontecia.
Após a morte do seu marido, o filho passou a consumir bebidas alcoólicas de forma indiscriminada e excessiva, apodera-se de bens alheios, droga-se e interrompeu os estudos para fazer parte de numa gangue que se dedica ao roubo de viaturas e ao tráfico de droga. Rosa Amoche considerou que o filho se transformou numa pessoa rebelde, temível e que não tem vergonha de “medir forças” com a sua mãe que, para além de estar debilitada devido à sua idade avançada, o criou com bastante sacrifício.
A senhora conta ainda que o jovem instalou no bairro um lugar para o comércio de estupefacientes, recrutando crianças e jovens de pouca idade para o mesmo efeito. Devido a esse problema e aos maus-tratos de que se queixava, a anciã recorreu, várias vezes, à Polícia para pedir socorro mas o seu esforço foi vão porque tanto ela como os agentes da Lei e Ordem não conseguiram travar o consumo de drogas por parte do filho e dos amigos.
Desgastada com a situação, Rosa chegou a afirmar o seguinte: “Estou cansada de viver com um bandido”, desabafa a idosa cuja dor de ser violentada por alguém que a devia proteger faz com que ela almeje a morte do próprio descendente: “Se Deus tivesse tirado a vida dele (Beto) e não a do meu marido talvez não estivesse a sofrer desta maneira.”
Abandonado pelos filhos
Pai de dez filhos e residente no bairro da Mafalala, na cidade de Maputo, António Magaia cuja idade não se recorda, depende de esmola para sobreviver. Ele contou que passou a frequentar as esquinas mais movimentas da urbe depois de a sua família lhe ter abandonado.
“Os meus 10 filhos passaram a viver na África do Sul. Há quatro anos vieram buscar a mãe e não sei por que razão me deixaram”, disse o nosso interlocutor, o qual, num tom de tristeza, acrescentou o seguinte: “levaram a mãe deles e deixaram-me (…) Eduquei-lhes, estudaram e, agora, abandonaram- me (…). Eles nunca mais quiseram saber de mim”.
António Magaia disse-nos que por dia colecta cerca de 300 meticais. O valor é muito pouco mas tem sido suficiente para fazer a barba; comprar algumas peças de roupa, de vez em quando, e a comida para a sua segunda esposa (desempregada) e com a qual tem seis filhos. No total, o nosso entrevistado tem 16 descendentes.
Magaia narrou que não beneficia de pensão mensal que o Governo atribui a outras pessoas da sua faixa etária, por exemplo, devido à falta de documentos para o efeito. Natural da província de Inhambane, Laiza Macie, cuja idade não quis revelar, é viúva e mãe de três filhos. Ela reside no bairro de Magoanine. A anciã contou-nos que passou a viver de mão estendida quando o seu marido faleceu, há 10 anos.
“Não é fácil viver de ofertas. (…) Fico na rua a pedir esmola por falta de condições para sobreviver. (…) Aqui as pessoas ajudam-me mas há dias em que saio sem nada”, disse Laiza, que frequenta a esquina entre as avenidas 25 de Setembro e Karl Max uma vez por semana e noutros dias vai à machamba. Ela também não é beneficiária do subsídio atribuído pelas instituições governamentais, apesar de estar inscrita, por motivos que não soube explicar com clareza.
A falta de ocupação
Ricardo Nuvunga, residente no bairro da Machava Socimol, no município da Matola, tem 57 anos de idade e é pai de quatro filhos, todos eles desempregados. Ele narrou que caminha daquele ponto do país ao centro da cidade de Maputo e vice-versa para pedir esmola e procurar emprego. No passado, o nosso interlocutor foi combatente da Luta de Libertação Nacional e trabalhou nas minas da África do Sul.
Ricardo queixa-se da falta de uma ocupação através da qual pode obter meios para sustentar a sua família. De acordo com o nosso entrevistado, enquanto ele pede esmola (obtém entre 100 e 300 meticais por dia) os filhos fazem pequenos trabalhos remunerados para ajudarem nas despesas de casa.