Centenas de milhares de munícipes vivem à mercê dos fontenários que não jorram o preciso líquido – um problema que já perdura há vários anos e não se vislumbra uma solução a curto prazo. Sem amparo das autoridades locais e tão-pouco esperança de dias melhores, todos os dias os moradores dos bairros periféricos da cidade de Cuamba lutam para sair do drama de não terem água para beber.
O nome é Abubacar. Mas prefere que seja tratado por Abu. Ele tem oito anos de idade e vive com os pais numa pequena casa no bairro de Matia, um povoado que dista pouco mais de 10 quilómetros do centro do município de Cuamba. A interminável crise de água que assola a sua comunidade e grande parte dos bairros da cidade deixa Abu e a sua família sem opção.
O rio, que era a principal fonte de água, secou, restando apenas viver à mercê da chuva que não cai ou ter de percorrer pelo menos quatro quilómetros a pé até ao poço mais próximo. O único furo que existe nas redondezas há muito que deixou de fornecer o preciso líquido a população.
Agachado diante de uma poça de água turva, criada pela chuva que caiu no domingo passado (4 de Dezembro), e com uma pequena garrafa de plástico, Abu vai enchendo uma panela. A finalidade é o consumo, apesar de ser imprópria. Mas isso parece não inquietar o rapaz de oito anos, até porque, na lógica do ditado popular segundo a qual “na falta do melhor, o pior serve”, há-de servir para alguma coisa. “Não temos água em casa, o rio fica muito longe”, comentou.
O problema da falta de água potável é recorrente em Cuamba. O sistema de abastecimento ainda é defi citário e, com efeito, milhares de famílias vivem sob ameaça de não ter o que beber dia após dia.
Entretanto, todos os dias, pelas manhãs, dezenas de mulheres e crianças desdobram-se pela urbe e aglomeram-se nos poucos furos de água que existem em alguns bairros da cidade na esperança de garantir pelo menos um balde do precioso líquido. Muitas vezes, tem sido um verdadeiro martírio.
Alguns munícipes de Cuamba ainda consomem água regularmente, muito menos do que gostariam, que o diga Florinda Vicente, de 26 anos de idade, a quem pedimos um copo de água e ofereceu-nos apenas metade. “Há vários dias que não sai água, temos de ir à FIPAG, mas, muitas vezes, é quase impossível voltar para casa com o balde cheio”, justificou.
Resolver o crónico problema de água que afecta quase todos os munícipes continua a ser a principal promessa dos políticos em Cuamba, mas pouco ou quase nada é feito para se reverter a situação. As pessoas ainda têm de percorrer longas distâncias à procura do preciso líquido, além de consumer água imprópria.
“Alegria que nos falta”
Não são ainda 6h30, mas no furo de água no bairro de Mutxora, arredores de Cuamba, já se encontram dezenas de residentes ajuntados. Ornélia, 21 anos de idade, acordou cedo para ser um das primeiras pessoas da fila, mas nem sempre a ordem de chegada é respeitada, pois, há vezes que, quando os ânimos se exaltam, se instala uma confusão e a lei do mais forte vinga.
Até às 4h00, Ornélia já está de pé e caminha pelo menos 500 metros até ao furo de água. “Quando cá chego sempre encontro uma enorme fila”, disse, mas o que mais a preocupa é o facto de passar o dia inteiro à espera para obter apenas 20 litros de água.
“Todos queremos água, pois é a alegria que nos falta”, garantiu. O tormento de não ter água para o consumo deixa Josefa Gune revoltada. Residente no bairro de Adine 3, afi rmou que “falta sensibilidade” aos dirigentes do distrito de Cuamba. “A crise de água não é de hoje, já faz muito tempo que temos vindo a viver assim. Não há vontade por parte das autoridades em resolver este problema”, desabafa.
Aos habitantes de Cuamba continua sendo negado o direito à água. Os dados existentes dão conta que, num total de 43,290 agregados familiares que o distrito dispõe, somente 0.6 porcento têm água canalizada dentro de casa, aproximadamente nove têm fora, quase 34 porcento recorrem aos poços (a céu aberto) e 31 socorrem-se dos rios. Em cada bairro, um furo de água serve mais de mil moradores.