“Corta mato”
Na prática são degraus de betão que constituem a escada colocada no meio de uma encosta que se ergue entre as zonas alta e baixa da Cidade de Maputo. A escada parte da zona mais conhecida por Museu, em referência ao Museu da História Natural, e desce até às traseiras da Televisão de Moçambique (TVM).
Estamos a descrever as famosas “Barreiras” que, na verdade, têm dupla fama. Uma porque o seu topo, ali ao lado do Hotel Cardoso e quase em frente à Escola Secundária Josina Machel, oferece uma magnífica vista do mar e do belo traçado arquitectónico da baixa da Cidade. A outra, porque percorrer os seus degraus pode significar um risco, não tanto pela sua degradação, mas pelos amigos de alheio que fazem do atalho seu palco de investidas.
Há três semanas, foi reportado um caso de corpo sem vida encontrado nas “Barreiras”. A Polícia da República de Moçambique (PRM) não soube dizer se o homicídio terá ocorrido ali ou se o corpo fora transladado para aquele lugar. Fora a sua magnitude, esta ocorrência seria mais uma no meio de tantas outras que frequentemente tomam curso nas “Barreiras”. A insegurança naquela via deve muito à presença de pessoas cuja conduta social é digna de suspeitas. Mas elas partilham responsabilidades com a PRM que ainda se permite o luxo de não destacar agentes para proteger os transeuntes que usam a via “rápida”. Isso apesar das constantes queixas sobre o crime que espreita as “Barreiras”. Praticamente, quase todos os transeuntes que sobem e descem a longa e degradada escada estão avisados sobre o perigo que a circulação representa. Pois o espectro do roubo, furto, violação, agressão e outras formas de violação da propriedade e da privacidade sobrevoa toda a extensão das “Barreiras”. Do topo à base.
Mas por que razão as pessoas insistem em usar as Barreiras? “Para encurtar a distância”, respondeu-nos às pressas e envolta em meio de tanta desconfiança uma jovem que descia a escada. A nossa insistência em nos apresentar não foi suficiente para atenuar a desconfiança da jovem vestida com uniforme da “Josina Machel”.
“Aqui ninguém confia a ninguém, não é fácil descobrir quem é bandido e quem é pessoa normal”, explica-nos um trabalhador de uma empresa de construção civil. A sua empresa está a erguer uma obra onde termina a escada.
“Eu uso as barreiras porque a minha paragem é Museu”, disse o trabalhador que desce a escada às 6 horas da manhã e sobe-a as 17 horas. A fonte disse que nunca foi testemunha ocular, muito menos vítima de um crime nas “Barreiras”. “Mas acompanhei muitos casos e agora que estou a trabalhar aqui vi duas pessoas a chorarem porque foram roubadas telefones e carteiras”, contou. Já à noite, a circulação é praticamente impossível. “Já acompanhei casos de violação de mulheres”, disse uma fonte que usa a via há 15 anos.
As pessoas temem revelar a sua identidade e deixar-se fotografar porque “os bandidos conhecem as pessoas que sempre circulam por aqui”. Praticamente as “Barreiras” são mais usadas pelos peões como atalho que encurta a distância entre as zonas alta e baixa da cidade de Maputo. Isso para quem não quer seguir a Avenida Patrice Lumumba para depois descer pela Vlademir Lénine. Um pequeno exemplo que justifica a opção de muitos peões pelas “Barreiras”, apesar do risco: Para quem parte do Museu para TVM usando as “Barreiras” pode levar aproximadamente 10 minutos, contra os cerca de 45 que podem ser necessários para o peão que segue pela Patrice Lumumba, desce pela Vlademir Lénine para depois seguir em linha recta a 25 de Setembro. Sob ponto de vista turístico, as “Barreiras” não são aproveitadas, apesar de se situar entre um hotel e um jardim (presentemente em obras). Basta dizer que o seu topo serve de urinol.
Contactado pelo @verdade, Arnaldo Chefo, porta-voz da Polícia no Comando da cidade de Maputo não se pronunciou sobre o assunto, tendo apontado Abílio Quive como a pessoa indicada para falar da segurança nas “Barreiras”. Chefo forneceu o contacto pessoal de Quive. Estabelecida a ligação, Abílio Quive também não se pronunciou sobre as “Barreiras” e, tal como Chefo, indicou outra pessoa para “falar do assunto”. “Sobre esse assunto só podem contactar a Primeira Esquadra, porque as Barreiras estão na sua jurisdição”, respondeu Vaz, o agente que Abílio Quive prometera que ia esclarecer o assunto.