O Presidente da República, Filipe Nyusi, perdeu mais uma oportunidade de esclarecer aos moçambicanos se foi incompetente – não vendo os empréstimos da Proindicus, EMATUM e MAM a serem contraídos dentro do Ministério que dirigiu entre 2008 e 2014 -, ou se foi conivente – participando da criação do Sistema Integrado de Monitoria e de Protecção da Zona Económica e Exclusiva de Moçambique que culminou nas dívidas ilegais que precipitaram a crise em que o país está mergulhado desde 2016.
Questionado pelo jornal Canal de Moçambique “Qual foi o seu papel nas dívidas ocultas”, o Presidente Nyusi respondeu enumerando realizações durante o seu mandato como Ministro da Defesa Nacional: “Agora temos o 1008, que é um tipo de helicóptero que está a voar. Foram reparados no meu tempo, alguma vez me fez pergunta?”.
“Foram comprados no tempo do antigo Presidente Samora, mas pararam. O seu país tinha meios para voar. Quem fala desses, fala de outros meios. Então o ministro da Defesa é feito para resolver os problemas da Defesa. Quantos quartéis? Se for ver o quartel dos comandos ou se for ver a base naval de Pemba. Foram reabilitados no meu tempo e nunca ninguém me perguntou. Vamos lá a coisa mais simples, o avião da Força Aérea que eu as vezes uso foi adquirido no meu tempo, porque é que nunca houve pergunta”.
Diante da insistência do jornalista Matias Guente o Chefe de Estado afirmou: “Agora você está a julgar”.
“Até porque isso é embaraçoso para quem está a dirigir, porque eu não quero embaraçar o processo que está a correr ao nível da Justiça. Eu dei-lhe o exemplo de algumas coisas que aconteceram. Eu já adquiri um navio na Espanha e até compramos por mil dólares porque era um valor residual, reabilitamos e fiscaliza o mar. Então são coisas que não precisamos de procurar. As coisas serão explicadas. O tempo é responsável. Até porque eu ficaria mal embaraçar a justiça”, declarou ainda na primeira entrevista que concedeu a um órgão de comunicações social moçambicano desde que se tornou Chefe de Estado.
Nyusi recorda-se de barco que custou mil Dólares mas não tem memória das embarcações que custaram centenas de milhões de Dólares
Acontece que a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à Dívida Pública, a Auditoria realizada pela Kroll e até o antigo Presidente Armando Guebuza afirmaram que os empréstimos foram arquitectados na Proindicus, uma empresa titulada pelo Ministério dirigido por Filipe Nyusi no âmbito da criação do Sistema Integrado de Monitoria e de Protecção(SIMP) da Zona Económica e Exclusiva de Moçambique.
Pelo menos um dos assessores do ministro da Defesa Filipe Nyusi, Eugénio Henrique Zitha Matlaba, rubricou, em Fevereiro de 2013, uma dos primeiros empréstimos à favor da Proindicus.
Ademais o @Verdade revelou documentos que mostram que o ministro da Defesa Filipe Nyusi esteve envolvido na criação do Sistema Integrado de Monitoria e de Protecção da Zona Económica e Exclusiva de Moçambique.
Relativamente a melhoria das condições das Forças de Defesa e Segurança, que Nyusi reclama o seu mérito, importa recordar que o ex-Presidente Guebuza declarou à CPI que os empréstimos foram contraídos porque o Governo da altura teve “que tomar medidas de natureza estratégico-militar” e a violação da Constituição da República, furtando-se a imperativa aprovação da Assembleia da República, foi necessária para que a Renamo não se apercebesse dos mesmos pois envolviam a aquisição de equipamento militar.
Por outro lado, e à parte dos subornos que terão sido pagos e são de domínio público existem 500 milhões de Dólares norte-americanos, dos 2,2 biliões, que a consultora Kroll afirma estarem “sem explicação”, contudo do espião e Presidente do Conselho de Administração da Proindicus, EMATUM e MAM declarou que o dinheiro “foi utilizado para aquisição de equipamento militar” pelo Ministério da Defesa.
É irónico que o Chefe de Estado tenha memória e vanglorie-se do barco comprado por mil Dólares a Espanha mas não se recorde de ter pago 7,2 milhões de Dólares norte-americanos por um Interceptor DV15, ou 19,4 milhões por um Interceptor WP18, 32,7 milhões por um Interceptor HSI32, 22,3 milhões por um barco de pesca Palangreiro ou mesmo 73,4 milhões de Dólares por um Ocean Eagle comprados à França.
Se é compreensível que o Presidente Filipe Nyusi não queira falar sobre a parte criminal das dívidas ilegais existem questões administrativas, já apontadas pelo Tribunal Administrativo no Parecer sobre a Conta Geral do Estado de 2015, que podem e devem ser comentadas, afinal trata-se de uma auditoria às contas do Estado aprovada pela Assembleia da República. Além disso há responsabilidades políticas que devem ser assumidas pelos políticos que governavam Moçambique durante a contratação dos empréstimos violando a Constituição da República.