Era impossível, ou quase impossível, uma pessoa qualquer estar ao pé daquela criança isolada numa enfermaria minúscula, padecendo de uma doença que os próprios médicos desconheciam. Ela exalava um cheiro mais do que horrível, impregnando todo o cubículo com a própria abominação, obrigando o pessoal da Saúde – que perscrutava nela o tipo e a causa daquela ferida maligna – a usar máscaras reforçadas.
A criança tinha uma ferida que envolvia todo o pescoço, deitando pus a todo o instante, que depois sujava o corpo franzino da criatura, despida de todas as roupas, e molhava os lençóis que tinham de ser mudados de 30 minutos em 30 minutos, até ao momento em que os enfermeiros e os serventes, se cansaram de fazer aquele trabalho, deixando tudo à responsabilidade da mãe, que estava ali, olhando para a criança, passando de quando em vez um pano húmido sobre a ferida para enxugar o pus, que mesmo assim teimava em sair, sem poder fazer mais nada.
Já tinha chorado todas as lágrimas e não sentia o mau cheiro emanado da criatura que ela própria gerou. Esta criança também, graças a Deus, já não defecava aquelas fezes que também saíam envolvidas em pus ensanguentado, agravando ainda mais o cheiro que já era por demais insuportável. O pessoal médico também já estava cansado daquele drama todo e chegou a um momento em que não sabia o que fazer. Mas a mãe estava ali, limpando constantemente o pus que saia da ferida que envolvia o pescoço da criança, deitada de costas como se fosse um cadáver de tempos remotos.
Ela não pestanejava, não se mexia, parecia não respirar e a mãe não tinha outra saída senão esperar pela ordem dos médicos, que nunca mais vinha e, enquanto não viesse essa ordem, o trabalho dela era encarar o olhar da criança que parecia de um morto que a interrogava, e limpar sempre o pus que não parava de sair. Numa manhã – depois de cerca de dois meses de tentativas vãs para salvar a enferma – o chefe da equipa médica, de forma resoluta, disse: “Já não há mais nada a fazer”.
É isso, já não há mais nada a fazer e o cheiro horrível está a invadir outras enfermarias. Algumas pessoas que passam por ali, indo visitar os seus parentes, atacadas pela frieza, ousavam: “Que matem essa criança, não vêem que ela está a sofrer? Matem-na!”. No fundo muitos que assistiam ao espectáculo macabro, queriam que a criança morresse, no lugar de tanto sofrimento. Mas matar é crime! A mãe também começou a ficar doente. Já não podia continuar a limpar o pus que saia da ferida que envolvia o pescoço da criança.
Os enfermeiros e os serventes também já estavam cansados de fazer aquele trabalho. E agora?! O cheiro intensificava-se. A criança estava lívida, parecendo um cadáver de tempos remotos. E só se falava dela em todo o hospital e em todos os lugares para onde regressavam, depois, as pessoas que iam para ali visitar os seus parentes e amigos. Entretanto, diante deste drama todo, era necessário que se tomasse uma medida, por mais dura que fosse. Foi quando uma ordem médica manda a criança para casa, transportando-a numa ambulância lá para as bandas de Marracuene.
Chegada a zona, foi recebida com repulsa, mesmo pelos próprios irmãos. A mãe já não podia fazer nada porque também ficou doente, exalando ela também um cheiro execrável, que se fazia sentir em toda a casa. Então, perante este dilema, os curandeiros, que foram chamados a decifrar o mistério, decidiram enterrar a criança viva.