No momento em que as conversas climáticas da ONU chegam aos últimos dias, o “Muro de Berlim” que há anos divide países ricos e pobres mais uma vez paira no ar, à medida que os negociadores correrem para traçar o texto preliminar de um acordo global cujo objectivo é derrubar esse obstáculo.
Na raíz do problema está uma convenção climática da ONU de 1992 que dividiu o mundo em países ricos e pobres e obriga apenas os ricos a cortarem emissões. Desde então, no entanto, as nações como Cingapura ou México cresceram, mas ainda são consideradas “pobres”.
Em Lima, os representantes de 192 países estão a tentar organizar um novo acordo que manterá as nações desenvolvidas responsáveis por suas emissões no passado, mas que também colocará responsabilidades sobre algumas economias emergentes que vão emitir mais carbono no futuro.
No mês passado houve progresso na superação de barreiras entre ricos e pobres – definidas no jargão da ONU como anexo 1 e não anexo 1 – quando os Estados Unidos e a China anunciaram uma acção conjunta para cortar emissões, dando um passo para transpor uma divisão que às vezes foi classificada como “Muro de Berlim”.
Os países estão a tentar redefinir em Lima essas distinções num acordo que será finalizado em Paris no próximo ano, cujo objectivo é conter ondas de calor, inundações, desertificação e aumento dos níveis do mar.
O comissário de Energia e Clima da União Europeia, Miguel Arias Cañete, alertou na quarta-feira que alguns países estão a reerguer as suas barreiras nos últimos dias das conversas.
“Algumas partes, infelizmente, reverteram-se para suas posições-padrão”, disse. O negociador-chefe da Arábia Saudita, Khalid Abuleif, salientou aos repórteres que a divisão entre países desenvolvidos e em desenvolvimento deve continuar, “mas que estamos abertos a discutir isso, para garantir uma participação mais ampla”.
O ministro indiano do Meio Ambiente, Prakash Javadekar, disse num discurso na quarta-feira que as conversas de Lima não estavam “na hora correcta para discutir essas questões”.
O enviado especial dos EUA para Mudanças Climáticas, Todd Stern, que também falou no passado sobre um “Muro de Berlim”, disse que manter as divisões definidas em 1992 era politicamente “inconcebível”, numa era na qual a economia mundial mudou tão radicalmente.
Enquanto isso, o Brasil tem tentado deixar a sua marca nas conversas da ONU ao sugerir um plano segundo o qual criaria um esquema mais fluído para permitir que os países em desenvolvimento gradualmente aumentem as suas obrigações.
“Na nossa proposta não há muros. Esta é uma maneira de romper o impasse, preservando a convenção, mas permitindo que, com o tempo, os países tenham mais obrigações”, disse o principal negociador brasileiro, Antônio Marcondes.
Segundo ele, a ideia está abganhar apoio entre outros países. Propostas como a do Brasil são um sinal de que o muro pode ser derrubado antes da reunião em Paris, disse Nathaniel Keohane, vice-presidente do Fundo de Defesa Ambiental. “Havia fissuras na parede e agora elas foram expandidas”, disse ele.