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O “salvador” de Mutauanha

O “salvador” de Mutauanha

Carlos Rafael é, diga-se de passagem, um agente exemplar da Polícia Comunitária da cidade de Nampula. Movido apenas pela necessidade de garantir a segurança dos moradores do bairro de Mutauanha, arredores da urbe, o jovem de 34 anos de idade tem vindo a desmantelar quadrilhas de assaltantes considerados perigosos. Apesar de não auferir remuneração pelo trabalho prestado, “Nadjamo”, como é carinhosamente tratado, diz que o seu objectivo é levar a tão almejada tranquilidade aos residentes daquela zona residencial.

Carlos Rafael é um dos poucos agentes do policiamento comunitário que ainda se interessa na segurança pública, apesar de não auferir qualquer remuneração. Antes de abraçar a actividade, ele era um dos poucos jovens do bairro de Mutauanha que ganhavam a vida graças ao seu próprio esforço, numa altura em que os moradores daquela zona residencial eram obrigados a recolher às 18h00 para o interior das suas habitações.

Nessa época, circular pelas ruelas de Mutauanha durante o período nocturno era praticamente impossível, devido à acção tenebrosa dos malfeitores que rondavam o bairro. Todavia, o grito de socorro que as vítimas emitiam quando fossem surpreendidas pelos meliantes despertou a atenção de Carlos Rafael. Numa urbe onde a criminalidade tende a ganhar contornos alarmantes, o jovem desempregado optou por garantir a segurança dos moradores.

Ele e outros jovens do mesmo bairro uniram-se com o único propósito: tornar aquela circunscrição geográfica a mais tranquila e ordeira da cidade de Nampula. Para o efeito, o grupo apresentou-se às estruturas do bairro e às autoridades policiais, mostrando interesse em vigiar aquela zona residencial.

A iniciativa foi deveras aplaudida. Em 2004, o conjunto constituído por 10 indivíduos liderado por Carlos Rafael iniciou os trabalhos de patrulhamento na calada da noite. Com o incentivo da população que já estava saturada de tanto vandalismo e criminalidade, o primeiro dia de trabalho foi bem-sucedido: pelo menos 10 malfeitores ficaram fora de acção.

A missão de desmantelar as quadrilhas prosseguia sem sobressaltos e cada vez que os integrantes do patrulhamento comunitário entravam em acção, dezenas de malfeitores eram recolhidos às celas das esquadras e postos policiais. Por se terem mostrado eficientes, apesar de não receberem ordenado, os jovens tornaram-se parceiros dos agentes da Polícia da República de Moçambique (PRM).

As recentes apreensões

O caso mais recente deu-se na noite do dia 02 do corrente mês, em que dois indivíduos considerados perigosos, que se dedicavam ao assalto às residências e a cidadãos indefesos na via pública, foram capturados.

“O meu bairro era considerado o mais perigoso da cidade de Nampula. Ninguém podia circular nas imediações da sua residência quando escurecesse. Por conta disso, tive de me oferecer para trabalhar em prol do bem-estar do povo. Mesmo sem salário, aceitei perder noites e, na companhia dos meus colegas, estamos a desmantelar quadrilhas de assaltantes”, refere Rafael.

Segundo o agente da Polícia Comunitária, o trabalho que decorria sem sobressaltos viu-se colocado à prova num dia cuja data não se lembra, quando um grupo de assaltantes munidos de catanas e objectos contundentes conspirou contra os membros do policiamento comunitário que defendiam estudantes do período pós-laboral.

A noite em que se deu o acto foi marcada por um confronto entre os membros do policiamento comunitário e os malfeitores, tendo culminado com a captura do chefe da quadrilha que promoveu o conflito.

“Naquele dia, ficámos praticamente impossibilitados porque eram mais de 10 homens munidos de catanas e objectos contundentes. Durante a acção, eu contraí ferimentos ligeiros na cabeça e um dos meus homens ficou uma semana sem trabalhar devido à gravidade da lesão”, conta Rafael.

Porém, como consequência disso, vários jovens acabaram por abandonar o patrulhamento, deixando Rafael com um efectivo reduzido. Isso não o desmotivou, pelo contrário, criou nele a vontade de continuar a lutar para garantir a segurança dos moradores.

Situação similar veio a acontecer dias depois, tendo Rafael contraído ferimentos graves em consequência de um confronto com outra quadrilha de assaltantes. “Foi um dia marcante para mim, pois recebi vários golpes com catana”, afirma.

Noites perdidas

Carlos Rafael é um dos poucos agentes do policiamento comunitário que tem uma esposa pouco exigente e por isso considera-se um homem de sorte. Ela não se opõe ao trabalho que o seu cônjuge vem desenvolvendo em prol da ordem e tranquilidade no bairro de Mutauanha, o segundo mais populoso do município de Nampula.

O trabalho de patrulhamento comunitário na calada da noite faz com que Rafael passe as noites em claro. Diga-se, em abono da verdade, que a sua relação com os seus descendentes tem sido das melhores, apesar de a maior parte do tempo se dedicar ao policiamento e à procura de recursos financeiros para sustentar a família.

População não sabe agradecer

Um facto avançado pelo nosso entrevistado é a ingratidão dos populares que, ao invés de louvarem o trabalho daqueles profissionais, se limitam a dizer que os jovens são desempregados. “Ficamos indignados ao ouvir a população a chamar-nos marginais, mas não damos ouvidos a isso porque é do nosso conhecimento que aquele que faz o bem, sempre recebe o mal em troca”, lamenta.

Rafael defende ainda que é a própria população que protege os malfeitores. Segundo ele, um pai deve preocupar-se com os passos dados pelos filhos, de modo a certificar-se do seu comportamento.

Policiamento comunitário: um trabalho sem remuneração

Na calada da noite, a segurança de vários munícipes da cidade de Nampula tem sido garantida pelos agentes do policiamento comunitário. O @Verdade soube dos seus membros que a detenção de malfeitores considerados perigosos e o desmantelamento de quadrilhas, na sua maioria, tem sido possível graças àquele grupo que dispensa as suas actividades para manter a tranquilidade dos citadinos.

Portanto, a falta de remuneração, ou simplesmente um subsídio de motivação para garantir o sustento das famílias, leva a maior parte dos agentes da Polícia Comunitária a abandonar a actividade.

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