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Mercados de Inhambane em “maré baixa”

Mercados de Inhambane em “maré baixa”

Todas as mulheres vendedeiras – ou quase todas – dos mercados da cidade de Inhambane, são unânimes em afirmar que o negócio por estes dias não rende nada. “Não são poucas as vezes que ficamos um dia inteiro na expectiativa de vender alguma coisa, e no fim não conseguimos absolutamente nada”. Este desabafo pode ser ouvido repetidamente de cada vez que abordamos alguém para saber como vai a vida. “Isto está mal. Ninguém sabe porquê. O que podemos dizer é que já tivemos um tempo em que brincávamos com dinheiro, e hoje esse dinheiro desapareceu”. E estas palavras podem estar a constituir verdade, porque é fácil passar pelas bancas e encontrar as pessoas a dormir, no lugar de estarem a discutir os preços com os compradores.

O Mercado da Mafurreira já foi um forte concorrente do Mercado Central. Os fregueses (incluindo os de posse média) saíam da cidade para aquele centro comercial que fica no subúrbio, aliciados pelos preços e também pela qualidade dos produtos.

Era uma azáfama, particularmente aos fins-de-semana, que deixava ganhar, em última análise, as vendedeiras. Falava-se muito deste lugar, e não era por acaso. Mas hoje o azimute mudou. O ambiente de negócio tornou-se, na verdade, sombrio. Joana Khimbine, que trabalha aqui há mais de 20 anos, afirma que já foi uma mulher próspera, no sentido de que o seu negócio fluía.

“Construí uma pequena casa com os rendimentos deste mercado, e o meu plano agora era evoluir para uma vivenda de qualidade. Já fiz as fundações, levantei as paredes até metade, mas agora, com as coisas a correrem mal, as obras estão paradas”. Joana diz que os compradores baixaram de frequência. “Os produtos que comercializamos aqui chegam a deteriorar-se por ficarem dias e dias sem serem adquiridos. Ninguém sabe explicar porquê.

A verdade é que o dinheiro sumiu”. Outra mulher que já “navegou em maré alta”, durante anos, é Lídia Guifutela. De uma simples banca, evoluiu para uma pequena loja, construída no espaço do mercado. “Eu comecei por vender tomate e cebola e pequenas coisas. O negócio corria tão bem que a minha ambição aumentou. Comecei a viajar para Maputo onde eu comprava batata e fruta para vir revender. Fiz isso e o meu negócio florescia. Então percebi que podia chegar mais longe.

Meti-me, em simultâneo, no negócio de carne de porco, que era muito comprada aqui na Mafurreira, e logo a seguir a razão mostrou-me que sozinha não podia aguentar na gestão e venda de tudo isto. Chamei o meu marido, que vivia de pesca artesanal. Começámos a trabalhar juntos. Enquanto eu ia a Maputo “gwevar” (comprar para revender), o meu companheiro ficava a comercializar. E assim o nosso crescimento apareceu”.

Este mar de rosas de Lídia deu muitos frutos. Visíveis. “Construímos esta loja que o senhor está a ver. Enchemos de produtos, mas hoje já ninguém vem comprar. Pedi um empréstimo ao banco quando tinha confiança no meu negócio, e hoje estou a ter dificuldades para pagar. Não sei o que vai acontecer comigo amanhã. Se não conseguir dinheiro, vão penhorar a minha casa”.

O cenário no mercado central não difere do da Mafurreira. Há muita banana a apodrecer nas bancas. A maçã fica tempos infindáveis sem compradores. Pior a pera. As hortícolas também não rendem nada. Em tempos as mulheres deste lugar vibravam, porque os preços que praticavam eram de ouro, proporcionados pela demanda de turistas. Porém, hoje já não há muito negócio. As bancas apinham-se, lutando, os proprietários, por conseguir o mínimo para a sobrevivência. As mulheres daqui, a maior parte delas, já não lutam por grandes voos, porque o terreno de aterragem diminuiu.

É frequente chegar-se a uma banca e a dona dizer assim: “Senhor, pode levar os produtos que quiser, depois vem pagar”. É uma atitude que não era tomada dantes, porque o negócio deslizava como um carro bem oleado. Hoje as mulheres dão essas facilidades por uma questão pragmática, ou seja, é preferível ter dinheiro em mãos que virão pagar amanhã, do que ter os produtos a deteriorar-se. É uma frustração generalizada. Uma espécie de desesperança.

“Não podemos ficar em casa porque isso seria pior. É difícil acordar e estender as pernas e olhar para as crianças. Muitas de nós, que o senhor está a ver aqui, não têm maridos, e se ficarmos em casa como é que vai ser? O melhor é vir para aqui, quem sabe, um dia as coisas vão mudar!”. E enquanto não mudam as coisas, o panorama que paira é de incerteza.

Mercado do Peixe

Está localizado na zona da Fonte Azul, e este também perdeu o seu símbolo, ou está quase a ficar sem ele, se as coisas não mudarem. Não faz sentido – como se diz, e pode ser verdade – que alguém esteja em Inhambane e recorra ao consumo de peixe congelado, quando esse marisco sai daqui. Só que, na verdade, acontece muito disso. No mercado do peixe é frequente verem-se colemans com diversas espécies, o que significa que o produto pode ser congelado e descongelado várias vezes até acabar. E as pessoas exigentes tornam-se relutantes em comprar algo naquelas condições. Zulmira Sechene vende marisco há cerca de quatro anos.

“Esta é a minha fonte de sobrevivência. Compro peixe com os pescadores e venho revendê-lo aqui. Mas agora somos muitos a fazer esse trabalho, e nem sempre conseguimos fazer bom negócio. Se o meu produto não acabar hoje, não posso deitar fora, tenho de o congelar, para amanhã voltar a descongelá-lo e continuar a vendê-lo”. Dessa forma o seu marisco não perde qualidade. Zulmira encolheu os ombros e disse: “fazer o quê?”.

Na verdade, “fazer o quê?” numa situação em que a luta pela sobrevivência atinge índices de desespero? Não pode faltar pão em casa, mas, vezes sem conta, este alimento não é consumido por não haver, à semelhança do que Maria Maphaphu espera possa vir a acontecer nas horas seguintes. “Há dois dias que não vendo nada, e se as coisas continuarem assim como estão, só Deus é que sabe”. E assim vai a vida nos mercados da cidade de Inhambane.

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