Funcionários da Companhia Industrial de Monapo, na província de Nampula, acusam o gestor da firma, Issufo Abdul Remane, de estar a protagonizar desmandos na empresa em prejuízo da massa laboral. Segundo contaram ao @Verdade, os trabalhadores não beneficiam de nenhuma regalia, e sofrem maus-tratos, entre outras irregularidades a que estes se encontram votados.
Aburaque Nunes, de 43 anos de idade, é operário da Companhia Industrial de Monapo desde 1988. Ele contou- nos que no ano de 2002, a empresa fechou e os trabalhadores foram indemnizados. No ano seguinte, isto é, em 2003, ele e outros colegas foram contratados pelos novos gestores da firma (grupo NUTASA).
Entretanto, volvidos cerca de quatro anos, ou seja, em 2007, o patronato abandonou a Companhia Industrial de Monapo, deixando os trabalhadores à deriva. Perante esta situação, a massa laboral não se deixou abater e as actividades decorreram normalmente, enquanto se aguardava que os patrões voltassem a fim de darem alguma satisfação, facto que não veio a acontecer.
No mesmo ano, apareceu outro proprietário que assumiu a empresa, designadamente o grupo COGENA. De acordo com o nosso entrevistado, os novos responsáveis desta unidade fabril prometeram arcar com todas as despesas sem, no entanto, demitir nenhum trabalhador. Para surpresa de todos, a direcção introduziu novas normas de funcionamento que não agradaram os operários.
Se um determinado funcionário se atrasar em cerca de uma hora é-lhe descontado o correspondente a cinco dias laborais. A direcção aplica multas, segundo os trabalhadores, injustas. As avarias que se verificam nos equipamentos são imputadas à massa laboral e é ela que deve fazer face às despesas para a reposição das peças.
Além dessas situações, os funcionários daquela firma deixaram de beneficiar de bonificações. Há algum tempo recebiam compensações no caso de trabalharem para além das oito horas de trabalho estipuladas por lei. Tinham também direito a bónus de antiguidade, a subsídio de férias e de alimentação, incluindo uma remuneração extra de dois meses. Neste momento, todas essas regalias passaram para a história.
A vida começou a ser um autêntico martírio. Na eventualidade de morrer um parente, os trabalhadores não são dispensados a fim de participarem nas cerimónias fúnebres, e não beneficiam do subsídio de morte. Segundo revelou Aburaque Nunes, com o actual patronato, os salários são recebidos em mão e foram canceladas as transferências bancárias. “Nas festividades do 1º de Maio, sofremos descontos nos nossos salários para a aquisição de camisetas, chapéus e um almoço de confraternização”, disse o nosso interlocutor. O comité sindical local não tem capacidades para a resolução desses conflitos laborais, sendo que ninguém deve desobedecer às ordens do director.
Denúncias que nunca resultaram
O nosso interlocutor disse que no dia 30 de Janeiro último, um grupo de três funcionários foi informado de que seria descontado dos seus salários um valor correspondente a dez mil meticais cada um, para a reposição de uma peça que teria avariado em plena actividade laboral. Achando-se cobertos de razão e querendo exigir justiça, os funcionários uniram- se e denunciaram o caso ao Instituto de Patrocínio e Assistência Jurídica (IPAJ) a nível do distrito de Monapo. A maneira como o assunto foi tratado não satisfez os trabalhadores, porque apareceu um juiz que disse: “Vão informar o vosso director para vir falar comigo”, e o caso morreu na gaveta.
Aliás, segundo soubemos, os magistrados afectos ao IPAJ de Monapo são parentes do director da referida empresa, razão pela qual os casos de injustiça laboral por si cometidos não seguem os seus trâmites legais. “Vão lá queixar onde quiserem, eu não tenho medo de ninguém”, é assim que o director da Companhia Industrial de Monapo, Issufo Abdul Remane, se expressa diante dos funcionários quando estes se queixam de alguma injustiça.
Outro trabalhador, identificado pelo nome de Armando Alassima, sofreu um desconto de 32 mil meticais, porque foi encontrado a prestar serviços numa residência alheia durante o gozo das suas férias. Este funcionário teve a sorte de lhe ter sido reembolsado o referido valor, mercê da intervenção da Procuradoria Distrital, que obrigou o patronato a devolver o valor.
Em retaliação contra o seu funcionário, o director encaminhou este à sua “cadeia pessoal”, localizada no posto administrativo de Nétia, no distrito de Monapo. Trata-se de uma loja abandonada no período colonial, onde o “prevaricador” permaneceu por um período de seis meses sem acesso a assistência alimentar, muito menos visitas, facto que revela uma autêntica violação dos Direitos Humanos.
Perante a inoperância da máquina da administração da Justiça no país, os trabalhadores não encontram nenhuma autoridade capaz de travar a situação a que estão votados. E, segundo os nossos interlocutores, desistir do exercício da sua actividade laboral que é o garante do pão de cada dia não é a melhor solução, daí que continuem a trabalhar no meio de incertezas e de um clima de medo. Apurámos, igualmente, que o director da firma possui uma arma de fogo que usa para ameaçar os seus funcionários, quando estes tentam insurgir-se.
Empresa muda linhas de produção e periga a saúde pública
Segundo apurou a nossa reportagem, antigamente a Companhia Industrial de Monapo fabricava óleo de cozinha, sabão, detergentes e outros produtos. Os novos gestores da empresa optaram por converter as linhas de produção. Actualmente, estão virados exclusivamente para o abastecimento de água potável ao Hospital Rural local e aos bairros circunvizinhos.
Entretanto, segundo denunciou Aburaque Nunes, o precioso líquido que se capta numa barragem local não oferece qualidade para consumo humano, facto que periga a saúde pública. “Dantes, a água tinha qualidade para ser consumida, porque era captada, tratada e depois distribuída aos clientes, o que, presentemente, não está a acontecer”, frisou o entrevistado, afirmando que, nos dias que correm, não se observam estes critérios.
Reacção do director
O director da Companhia Industrial de Monapo, Issufo Abdul Remane, negou todas as acusações que pesam sobre si. Quanto aos descontos sem justa causa, explicou que tal aconteceu porque os três funcionários abrangidos foram surpreendidos a roubar uma peça (rolamento de máquinas) – situação idêntica aconteceu com o trabalhador que sofreu o desconto no valor de 32 mil meticais também por ter sido encontrado a roubar um motor de uma das máquinas.
“E para não ser responsabilizado disciplinar e criminalmente, o funcionário desculpou-se com promessas de poder pagar, e o valor em causa foi acordado entre as partes”, Sublinhou.
Falando sobre a “cadeia pessoal”, o director esclareceu que se trata de uma loja pertencente a um grupo de estabelecimentos comerciais que fazem parte da Companhia Industrial de Monapo. Afirmou ainda que, no caso em que algum funcionário é enviado para Nétia, tal faz parte das normas e procedimentos da empresa e não significa que é um castigo. Para terminar, o director não se quis pronunciar sobre a água turva que a sua empresa fornece ao Hospital Rural e aos residentes dos bairros localizados na região.