O boxe na província de Nampula é, dentre as várias modalidades desportivas praticadas nesta parcela do país, a que ainda subsiste no meio de tantas intempéries. Apesar de ela ter menor expressão a nível nacional, é das poucas nesta região que consegue arrastar centenas de praticantes, mesmo sem competições locais.
Nesta semana, o @Verdade conversou com Mussito Júnior, presidente da Associação Provincial de Boxe de Nampula (APBN) que, dentre vários assuntos abordados, revelou a sua satisfação pela evolução do pugilismo na sua província, ainda que concentrado somente na cidade, sustentando que há mais atletas desta província a ocuparem um espaço privilegiado a nível nacional.
@Verdade (@V) – Qual é o estágio actual do boxe na província de Nampula?
Mussito Júnior (MJ) – Não tenho o receio de afirmar, de viva voz, que o boxe em Nampula está num bom caminho. Em funcionamento temos um total de quatro academias a movimentarem mais de cem pugilistas de todos os escalões. Estamos igualmente felizes porque todas elas estão a ser geridas por antigos praticantes da modalidade, que são pessoas com uma larga bagagem no que diz respeito aos conhecimentos do pugilato, nomeadamente Bebé Issufo, os mestres Cruz Sousa e Lucas José. Aliás, temos também a academia pertencente à Policia Militar.
@V – Quais são os indicadores que nos podem levar a concordar consigo quando diz que, de facto, o boxe está a evoluir em Nampula?
MJ – Já lá vão anos que a nossa província tem vindo a participar nos campeonatos nacionais de boxe e a trazer bons resultados, com excepção do último, realizado em Março deste ano, em que tivemos uma péssima prestação devido à agitação que se verificou antes da nossa ida a Maputo, tendo chegado lá um dia antes do arranque da prova.
A logística do certame, por sua vez, não esteve bem montada e os atletas foram derrotados psicologicamente. Por outro lado, posso mencionar que a cada ano que passa o número de pugilistas tem vindo a crescer, contando, actualmente, com mais de cem de todos escalões e de ambos os sexos, como disse anteriormente. Acredito que com mais trabalho contínuo no âmbito da divulgação e massificação do boxe, este número poderá alargar-se ainda mais nos próximos anos.
@V – Quais são as competições organizadas pela APBN?
MJ – Infelizmente, nesta componente, estamos aquém do ideal. Não temos ringue em condições. Em 2010, depois do término do Campeonato Nacional de Boxe, em que fomos anfitriões, os organizadores, refiro-me ao pessoal da Federação Moçambicana de Boxe (FMBoxe), recolheram todo o material de volta à cidade de Maputo. Tivemos de “repensar” na modalidade, visto que aquele equipamento era uma mais-valia para nós e já contávamos com o mesmo.
@V – Não reclamaram junto às autoridades competentes?
MJ – Tentámos mas não conseguimos. A Direcção Provincial da Juventude e Desportos de Nampula, na pessoa da própria directora, havia prometido ajudar na reposição do ringue tendo, naquela altura, mandado efectuar o levantamento das nossas reais necessidades e dos respectivos custos.
Entregámos todo o dossiê e, até hoje, aguardamos pelos passos subsequentes que são do desembolso de fundos e da compra do material requisitado. Falamos, igualmente, com o presidente da FMBoxe, Big Ben, que também nos prometeu apoiar na reposição do ringue mas, até hoje, ainda não há sinais de avanço desse projecto. Lembro-me de que no ano passado tentámos organizar um torneio interno e tínhamos todo o orçamento pronto, contudo, por falta de espaço, tivemos de cancelar.
@V – Não tendo competições por falta de ringue, quais são as outras actividades programadas pela ABPN?
MJ – Ainda este ano vamos dar início à realização de combates em espaços livres e abertos, através de uma espécie de ringue móvel. Os locais foram devidamente identificados e estamos, neste momento, em processo de tramitação da documentação para efeitos de autorização do projecto pelo Conselho Municipal da Cidade de Nampula.
@V – Não havendo competições internas, quais são os critérios usados para a selecção de atletas a fim de participarem nas provas nacionais?
MJ – Temos de ser honestos e afirmar que não temos provas oficiais para efeitos de apuramento. Só avaliamos os pugilistas através de treinos e alguns torneios que temos organizado entre atletas de várias academias de modo a seleccionar os melhores.
Antigamente, quando existia apenas uma academia, o apuramento para o Campeonato Nacional de Boxe era muito fácil. Hoje, devido ao elevado volume de praticantes e com o surgimento de novas escolas, também pela nossa experiência, estamos a pensar em introduzir uma eliminatória provincial para os certames nacionais.
@V – E quando é que pensam em implementar este sistema?
MJ – Dentro em breve. Estamos a correr contra o tempo pois, em Outubro próximo, temos de estar presentes no Campeonato Nacional de Boxe que vai decorrer na cidade de Quelimane.
@V – Existe equipamento suficiente para os atletas nas competições?
MJ – Não temos razões de queixa. Muito recentemente recebemos das mãos do presidente da federação diverso material para os pugilistas que depois distribuímos de forma equitativa por todas as academias que movimentam o boxe em Nampula. Com isto não quero dizer que não temos falta de meios. É que, com o pouco que temos, por vezes custeado pelos nossos próprios fundos, vamos remediando algumas carências.
@V – A ABPN tem pessoal técnico e árbitros qualificados em número suficiente?
MJ – A componente da formação e do acompanhamento de técnicos e árbitros é desenvolvida pelas academias, sabido que todos os proprietários e/ou dirigentes das mesmas são antigos pugilistas e, por isso, pessoas conhecedoras da modalidade.
Para não entrar em graves equívocos prefiro não falar em números e quantificar o trabalho por eles desenvolvido. Mas é um facto que temos de formar mais quadros. Em coordenação com a FMBoxe há, em manga, um seminário de formação e capacitação de árbitros e treinadores, agendando para a cidade da Beira, ainda que sem datas.
@V – Quais são os parceiros da ABPN?
MJ – Em termos de predilecção, apesar de existir uma certa distância, contamos apenas com o apoio da FMBoxe, mais concretamente do respectivo presidente, Big Ben. Mas antes da chegada dele, a relação entre a nossa associação e a federação era de pai e enteado, ou seja, não era saudável.
Viu-se isso na falta de integração dos nossos atletas na selecção, mesmo sabido que eles eram capazes de orgulhar o país. O que sucedeu logo após o Campeonato Nacional de Boxe que nós organizámos, em que recolheram todo o material, foi prova da má relação que existia entre o elenco passado da FMBoxe e o nosso organismo.
@V – E com o Governo?
MJ – Uma parceria com o Governo para nós é impossível. Num passado recente tentaram convencer-nos a organizar um torneio no distrito de Meconta, por ocasião da passagem do dia dos heróis moçambicanos, 3 de Fevereiro. Porém esqueceram-se de criar as devidas condições para o efeito.
A própria Direcção Provincial da Juventude e Desportos já fez várias promessas que até hoje nenhuma delas foi cumprida. Por isso reafirmo a posição de que uma parceira com o governo provincial, para nós, é pouco sustentável, pelo que continuaremos a fazer devidamente o nosso trabalho sem contar com eles pois o que nós queremos é ver esta modalidade a ser movimentada.
@V – Quais são as aspirações da APBN?
MJ – As nossas atenções estão viradas para o próximo “Nacional” agendado para Quelimane em Outubro próximo. Estamos, neste momento, a trabalhar a todo o gás para inverter o cenário de Maputo em Março, ou seja, queremos usar esta competição para inverter a imagem deixada no último Campeonato Nacional, trazendo mais medalhas para Nampula.
Continuaremos a trabalhar para que o boxe se torne uma realidade em Nampula, mobilizando os clubes para movimentarem a modalidade e para que surjam mais academias nesta parcela do país. Lutaremos para ter um ringue de modo a organizarmos as nossas competições internas. Depois de alcançarmos estes passos, vamos expandir a modalidade para mais distritos da província, visto que neste momento estamos concentrados somente na cidade de Nampula.
@V – A ABPN tem algum fundo próprio?
MJ – Não temos nenhum fundo. Trabalhamos com base em contribuições das academias e da FMBoxe que só intervém quando se trata de questões logísticas. Mas é preciso deixar claro que para movimentar o boxe não é preciso ter muito dinheiro. Basta-nos, apenas, material para os atletas e um ringue. É somente assim que se pode levar avante o boxe em qualquer parte do mundo.