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Mozambical: Estado de Arte, por Niosta Cossa

3. Enquanto se continuar a amarrar a arte a manifestações culturais e pretender-se que seja educadora da sociedade, teremos arte medíocre neste país. E as consequências destas tendências/comportamentos para com a arte estão no facto de, por exemplo, musicalmente, não termos produzido um ícone nacional excelentíssimo ao ponto de se tornar um ícone internacional.

Poderia falar de muitos países africanos, todavia, para reduzir a humilhação e o texto, vou cingir-me aos nossos irmãos PALOPs. Angola teve Bonga. Cabo Verde teve Cesária Évora. Até Guiné-Bissau, que vive em constante instabilidade política, teve os Super Mama Djombo, por exemplo. E Moçambique? Quem teve? Estabelecendo-se comparações, é inegável que a música dos angolanos seja muito melhor e muito mais viva do que a dos moçambicanos.

O mesmo acontece com a comparação entre a música dos cabo-verdianos e a dos moçambicanos. Idem com a música dos guineenses de Bissau e a dos moçambicanos. E, também, a produção dos artistas desses povos é supe- rior à dos nossos artistas: se lá os grandes artistas produziram/ produzem obras durante décadas, os nossos grandes artistas só produziram 1/2/3 álbuns, no máximo.

A Música Moçambicana tem os seus grandes momentos, é inegável, porém, é medíocre. Principalmente quando compa- rada com a música dos outros povos. É muito provinciana. Falta universalidade à Música Moçambicana.

E esta – a universalidade – só pode ser alcançada através de um Grande Estado de Arte, aquele estado em que o artista rompe com todas as barreiras e produz uma obra que, ainda que seja nacional, é inovadora e poderosa o suficiente para se tornar universal. E o crítico desempenha papel fundamental para conduzir, ou elucidar, ou contribuir para que o artista alcance ou, no mínimo, tenha a noção da existência de um Grande Estado de Arte.

4. Entretanto, os que escrevem sobre música em Moçambique, no lugar de dizerem se o álbum sobre o qual escrevem é um Estado de Arte ou não, ficam a descrever que o mesmo é ou o contributo de Moçambique na cultura do mundo (Inocêncio Albino, sobre o álbum Massone, de Carlitos Gove) ou uma ruptura com o senso comum da sociedade patriarcal (Amosse Macamo, sobre “Bava Anga Psvalanga de Zeburane) ou que com o álbum o músico pretende elevar a cultura nacional aos mais altos padrões de qualidade e chamar a atenção para a valorização da cultura moçambicana (Jornal Notícias também sobre Massone, de Carlitos Gove).

Só mesmo em Moçambique os álbuns dos artistas, que era suposto que fossem elevados Estados de Arte, são para chamar a atenção para a cultura, neste séc. XXI!!!

5. Os que escrevem sobre música vão prolongando e repercutindo e patrocinando estas insanidades e inanidades. Por um lado, é possível que seja pela ignorância sobre o que um álbum de música devia ser bem como, por outro lado, é provável que seja por falta de coragem, devido ao Estado de Covardia Contínua em que o país vive – estado em que nin- guém tem a coragem de dizer a alguém que o que fez/faz não presta – que estas assistências à mediocridade se têm repetido sistematicamente.

Eu vou pela segunda hipótese, pois, em ambientes íntimos e entre um cochichar e outro, os moçambicanos vão dizendo que o álbum do fulano não presta para coisa alguma e/ou que o álbum do sicrano devia ser usado nos bares para se colocar copos de cerveja sobre o mesmo. Em última instância, a conclusão é óbvia: nunca houve críticos de música em Moçambique.

O que houve até hoje foram sociólogos adaptados para críticos de música, antropólogos adaptados para críticos de música, historiadores adaptados para críticos de música, jornalistas adaptados para críticos de música, carpinteiros adaptados para críticos de música, políticos adaptados para críticos de música, músicos adaptados para críticos de música.

Entretanto, tudo termina aqui. Nós que realmente entendemos de música, e que nos assumimos como críticos de música, assumimos daqui em diante a crítica da música. Os sociólogos, antropólogos, historiadores, jornalistas, carpinteiros, políticos e músicos podem voltar para as suas funções.

Niosta Cossa

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