Partidos políticos e outros intervenientes nas matérias eleitorais em Moçambique já podem iniciar os preparativos para as próximas eleições autárquicas, a ter lugar em 2013. Esta é a posição da Comissão da Administração Pública, Poder Local e Comunicação Social (CAPPLCS) da Assembleia da República (AR), entidade que foi responsável pela revisão da Lei Eleitoral, um processo iniciado em Setembro de 2010 e que foi concluído há duas semanas.
A nova legislação eleitoral, aprovada há duas semanas, ainda deverá ser promulgada pelo Presidente da República, antes de entrar em vigor.
“Há dois princípios do Direito Administrativo; primeiro, neste momento não há vazio legal ou constitucional para a preparação das eleições; e que os órgãos cessam funções com a tomada de posse de novos membros”, disse, Quintq-feira (27), o presidente da CAPPLCS, Alfredo Gamito, falando num encontro de divulgação da nova legislação eleitoral realizado em Maputo.
A legislação eleitoral foi aprovada na primeira quinzena de Dezembro corrente e espera-se que seja promulgada em Janeiro ou Fevereiro próximo, cerca de 10 meses antes da realização das eleições autárquicas.
Gamito referiu na ocasião que existem várias acções que os partidos políticos e os órgãos eleitorais – nomeadamente a Comissão Nacional de Eleições (CNE) e o Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE) – podem realizar no âmbito da preparação das autárquicas de 2013.
“A questão da composição e organização da CNE, mesmo a elaboração dos mapas de localização das mesas das assembleias de voto para as eleições autárquicas. Há uma série de coisas preparatórias que podem ser feitas”, explicou.
No encontro da Quinta-feira, organizado pelo Observatório Eleitoral – uma organização da sociedade civil ligada a questões de processos eleitorais – a CAPPLCS apresentou aquilo que considera de alterações profundas da legislação eleitoral.
Constituída por um total de 747 artigos, a legislação eleitoral inclui cinco leis, nomeadamente a Lei da Eleição do Presidente da República e dos Deputados da Assembleia da República; a Lei da Comissão Nacional de Eleições (CNE); a Lei das Assembleias Provinciais; a Lei das Eleições Autárquicas; e a Lei do Recenseamento Eleitoral.
Na Lei da Eleição do Presidente da República e dos Deputados da Assembleia da República – considerada lei mãe porque também tem efeitos sobre as leis das Assembleias Provinciais; e das eleições autárquicas – uma das grandes inovações é o artigo seis, que consagra a marcação da data das eleições com um prazo de antecedência mínima de 18 meses.
Actualmente, a lei estabelece a marcação da data das eleições com uma antecedência mínima de 120 dias. Contudo (por causa do atraso na aprovação da legislação eleitoral) para o caso concreto das eleições autárquicas de 2013, a actual lei estabelece um prazo excepcional de 180 dias.
Outra grande inovação desta presente lei tem a ver com a eliminação do artigo 85, o que vulgarmente se chamava “artigo de enchimento das urnas”, que estabelecia que “em caso de discrepância entre o número de boletins de votos existentes nas urnas e o número de votantes, vale, para efeitos de apuramento, o número de boletins de votos existentes nas urnas, se não for maior que o número de eleitores inscritos”.
Segundo explicou Gamito, com a eliminação deste artigo, foram criados outros tantos detalhando os procedimentos a serem observados na contagem dos votos.
Outras inovações têm a ver com a obrigatoriedade da lugar da assembleia do voto coincidir com o da realização das eleições; com o alargamento dos requisitos (documentação) para o exercício do voto (antes só se usava o bilhete de identidade); a obrigatoriedade da votação decorrer ininterruptamente (antes havia intervalos para refeições); entre outras.
Além disso, esta lei tem um artigo que consagra a prática (antes omissa) de distribuição de senhas enumeradas aos eleitores que estiverem nas filas a hora do fim da votação; um outro artigo (novo) que determina que as operações de apuramento parcial dos votos devem ser efectuadas no local da assembleia de voto. Outra inovação refere ainda que o candidato a Presidente da República deverá apenas ter a nacionalidade originária moçambicana.
Por outro lado, o artigo 127 acrescenta a ilegibilidade aos candidatos a Presidente da República quem tiver cumprido dois mandatos presidenciais. Alfredo Gamito explicou que este princípio esta(va) apenas patente na Constituição da República, mas não constava como um artigo da lei eleitoral.
Com a nova lei passa também a não ser ilegível a Presidente da República o candidato que tenha cumprido um mandato presidencial e, por alguma razão, tenha interrompido um segundo mandato.
Esta lei só não mereceu consenso das três bancadas parlamentares porque a Renamo – a maior na oposição – exigia a introdução de um artigo que obriga a distribuição de cadernos de recenseamento eleitoral aos delegados dos partidos políticos candidatos as eleições, uma proposta que foi recusada pelas restantes formações politicas com assento na AR, nomeadamente a Frelimo, partido no poder, e o Movimento Democrático de Moçambique (MDM), bancada minoritária.
Entretanto, as maiores divergências registaram-se na lei da Comissão Nacional de Eleições, particularmente no que concerne a composição e formas de designação de membros deste órgão; e formato e formas de recrutamento do pessoal do Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE).
Novamente, nesta área o maior perdedor foi a Renamo, que viu as suas propostas recusadas pelas bancadas da Frelimo e do MDM. Na sua proposta, a Renamo queria uma CNE com 14 membros e totalmente partidarizada.
“Estas divergências foram a mãe de todas”, disse Gamito, argumentando que estas propostas contrariavam as recomendações das missões de observação que sempre defenderam a criação de órgãos eleitorais com pessoal reduzido, profissionais e menos partidárias.