É uma figura bastante mencionada nos dias que se seguiram às explosões do paiol, não só por ter salvado 34 doentes mentais que estavam internados no Hospital Psiquiátrico do Infulene, mas pelas circunstâncias em que o fez. Felisberto Mariano – enfermeiro de serviço no dia da tragédia – no lugar de entrar em pânico quando as bombas caíam sobre o próprio hospital, desafiou o perigo e ajudou os enfermos a fugirem da morte.
Hoje, passados dois anos, recordamos este verdadeiro herói que não se esqueceu do juramento que fez ao ser graduado, pois a prioridade número um do pessoal da saúde é salvar vidas.
Vamos recordar, também, neste dia – olhando para trás – a enfermaria onde ele trabalhava, destruída e posteriormente devorada pelo fogo que se apoderou também de todos os bens do enfermeiro, das camas e de tudo o que estava perto. Mariano via toda essa morte à sua volta, mas, mais do que a sua vida, estava a vida dos doentes, aos quais, com a ajuda dos colegas, foi retirando, um a um, para lugar seguro.
Na altura das explosões, Mariano contava – falando aos órgãos de informação – que foi um dia horrível. Segundo o mesmo, as explosões começaram por volta das 16.20 horas e, passados cerca de 20 minutos, é quando ele se apercebeu da magnitude daquilo que viria a ser um caos. Ele tinha 34 doentes na enfermaria, dois quais cinco, devido ao seu estado grave, não podiam sair pelos seus próprios pés.
Felisberto Mariano quase que desespera. Já tinha retirado a maioria dos doentes, agrupando-os no pátio. Mas os que não se podiam movimentar mantiveram-se nas camas, como que esperando pela morte, que cirandava todo o edifício do Hospital Psiquiátrico do Infulene, em particular a enfermaria onde ele se encontrava. Foi um momento dramático, segundo contava na altura aos órgãos de informação, o enfermeiro elevado à categoria de herói.
Quando tudo isto começou, o dilema caíu sobre Mariano, porque, contrariamente a todos os outros colegas que estavam lá fora, ele mantinha-se na enfermaria, olhando para os doentes e pensando no que podia fazer. Os estilhaços dos vidros caíam para o chão como granizo, as paredes estremeciam, o tecto ameaçava ruir. Foi, então, que este homem tomou uma decisão importante na atitude que já havia abraçado: desceu a correr lá “para baixo”, mobilizou os colegas e subiu para levantar os doentes e com eles correr para lugar seguro.
Lembramo-nos hoje deste episódio de Felisberto Mariano, que marcará a sua vida por muito tempo. Segundo relatava na circunstância, depois de retirar os doentes, teve que tomar outra medida bastante pergiosa: apagar o fogo que destruia a enfermaria. Pegou num balde, subiu duas vezes ao segundo andar para acarretar água, numa operação que ele próprio veio a perceber ser de elevado risco. Ele pensou rapidamente que no chão podia haver um fio de electricidade que poderia pôr em perigo a sua vida e, sendo assim, desistiu de apagar o fogo e foi juntar-se aos colegas.
Teodósio Ângelo, jornalista do Notícias, numa entrevista que fez a Felisberto Mariano nessa altura, perguntava-lhe aonde é que ele tinha ido buscar tanto sangue-frio para Fzer face àquela operação. Mariano respondeu que ele também não sabia, tanto é que, para além dos doentes que devia cuidar, tinha a sua família que, pelos vistos, vivia no bairro do Malhazine (um dos locais atingidos pelos bombardeamentos).
Felisberto Mariano já havia vivido, antes deste desastre, uma situação horrorosa. Foi a 25 de Maio de 2002, aquando do acidente de Tenga, que resultou em 200 mortos e mais de 250 feridos, muitos dos quais ficariam mutilados pelo resto da vida.
Quando aquela tragédia aconteceu, enquanto muitas pessoas se preocupavam em procurar os meios para o prosseguimento da viagem, Mariano entragava-se ao trabalho de salvamento.
Este homem tem no seu sangue o amor pela profissão que abraçou. Ele lida com doentes mentais, o que torna o seu trabalho ainda mais delicado. Todavia, já afirmou que o doente mental é um doente como outro qualquer.
Completa no corrente 2009 56 anos de idade. É natural de Homoíne, na província de Inhambane, é casado e pai de sete filhos. Fez a instrução primária na Escola da Missão de Homoíne e, em 1969, veio para a capital onde reside e trabalha até hoje.