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Música nocturna está de volta

Música nocturna está de volta

Os primeiros “tiros de canhão” vão em saudação à Rahema: essa mulher que aprendeu a embrenhar-se nas noites musicais com o seu cúmplice, Zé Maria – que a levava quase no regaço para todos os locais. Mas Rahema recusou – ia recusando aos poucos, em cada trabalho e em cada palco – estar eternamente (em termos artísticos, claro) na “mama” do seu companheiro. Até porque ela tem tudo, ou quase tudo, para caminhar sem sicerone.

Apareceu na semana passada no “Gil Vicente”, cheia de sangue na voz e disse a toda a gente que “foram me chamar, eu estou aqui, o que é que há?” Encheu a sala de jazz, pisando o mesmo palco que foi de João Paulo, onde até hoje ainda se sente o cheiro desse bluesman. Indelével. Será, provavelmente, esta actuação da Rahema, um dos marcos mais importantes na abertura da boémia dos notígavos. Daqueles que têm, na sua maneira de viver, outra forma de festejar a vida. E o “Gil” já é por demais um santuário valioso para essa vertente da vida.

Rahema é uma mulher que se foi deixando forjar pela música, pelo som e pelas desenfreadas batucadas de Zé Maria, outro louco que será lembrado, um dia, pela história. Foi um ponto de partida muito importante, porque Rahema soube dar este sinal. Possivelmente homenageando a figura de elevado porte que é João Paulo.

A presença da Rahema foi também para renovar o conhecimento de que as casas de pasto que nos oferecem música à potes nas noites com desregras regradas, são importantes para alimentar a alma.

Lembrando Georg Benson

Georg Benson – nunca é redundante dizer isso – saía da sua casa nas noites e ia aos cabarés, onde se deixava enlear pela boa música, destilada com a alma regada pelas fortes emoções e pela necessidade urgente de viver. Ver mulheres e depois voltar inspirado para dormir com sonhos. E hoje Georg Benson é aquilo que todos nós sabemos: um dos maiores guitarristas do mundo e um dos maiores intérpretes do soul e do jazz.

É isso: as casas como o “Gil Vicente” devem ser estimuladas, porque é em sítios como aqueles, onde se cometem as maiores loucuras do amor à música.

Ainda no “Gil”, na semana passada, passou por lá esse vulto, que balança sem medo: Wazimbo. Quando esta figura evolui e passa, não teremos outra saída senão falar dela e, por aquilo que Wazimbo fez até aqui e fez no “Gil Vicente” e noutros lugares, não encontraremos outra saída senão falar dele. Naquele espaço ele voltou a lembrar-nos que, ou faz as coisas como deve ser, ou não faz. E “Ti Wazy” quando faz as coisas, fá-las sempre bem. Indubitavelmente!

Outros lugares

Como o “Gil Vicente” teremos, por exemplo, na periferia da cidade, o “Bar dos Amigos”, no bairro Magoanine CMC. Por onde passaram, no ano transacto, nomes importantes da música do nosso país, incluindo o Wazimbo, Tony Django, Nanando, as irmãs Domingas e Belita, Kaliza, Xidiminguana, Xidiminguana Júnior e muitos outros.

É um lugar que Maputo merece, porque os subúrbios – chamados guettos por uma boa franja da juventude – serão para sempre uma verdadeira libertação. Um regresso ao tempo em que muitos gigantes hoje transformados, começavam a dar os primeiros passos e fazem furor em várias latitudes do Globo. Falamos aqui, por exemplo, do Jimmy Dludlu (um dos maiores guitarristas do planeta), nascido no Chamanculo, de onde guardará para sempre, as maiores recordações. Lembram-se do “The Echoes Of de Past”? Obviamente!

Os subúrbios têm essa função: a encubação e criação de estrelas. O “Bar dos Amigos” também tem essa vocação. Localizado a cerca de 10 quilómetros do centro da cidade, aquele espaço começou a funcionar numa altura em que o acesso, por estrada, era quase impossível. Mas o jovem que o fundou, acreditava (acredita) no futuro). Aguentou durante muito tempo, levando os artistas quase às costas, para dar alegria ao bairro e àqueles que “rebentavam” as molas dos seus carros para ir até lá, saíndo da urbe.

Hoje os proprietários do “Bar dos Amigos” estão mais do que felizes. Aliás, o seu gerente, em conversa mantida connosco na semana passada, deixou patente a sua emoção, a convicção de que, fazendo coisas, podem-se construir pontes importantes.

“Eu sentia que a partir deste ponto podiamos ir longe. Os músicos pecisam de emprego. Eles têm necessidades na sua vida. Aquilo que eles gostam e sabem fazer muito bem é produzir música. Então, nós temos a nossa obrigação, como empresários, que é dar emprego à eles e entreter as pessoas”.

O “Bar dos Amigos” ainda não abriu as portas, esperando fazê-lo nos princípios de Fevereiro, com um programa bastante aliciante, que vai ajudar a descongestionar os palcos conhecidos da cidade, como o “Franco-Moçambicano”, o “África-Bar”, Ka Mpfumo, Water Front, Coconuts e o próprio “Gil Vicente”. Esta é uma aresta muito importante numa cidade cosmopolita que cada vez quer assumir e assume mais o seu papel de centro cultural. Quer dizer, essas casas relembram-nos que a música continuará sempre a ser o centro das atenções da vida.

Enquanto os verdadeiros espectáculos das massas continuam a acontecer cada vez pouco, as casas de pasto, que se transformam em centros de boa música nas noites – e que nunca entraram em colisão com os grandes palcos – vão mantendo a sua luz, necessária para iluminar essa outra aresta da vida. Ainda bem que tudo isto já começou neste ano que ainda é uma criança.

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