“Não podemos imaginar o medo, o terrível medo (…) que envolveu Mzilikazi Wa Afrika quando ele foi levado na quarta-feira. Ele diz que pensou que seria morto. Um carro sem marca, homens com armas, recusando-se a ouvi-lo, irracionalmente violentos e agressivos. Depois o intenso combate para o dominarem. O interrogatório às 2:30 da manhã. As perguntas sobre se ele era parte de um grupo tentando desestabilizar o ANC provincial. Sim, o ANC, não a província ou o país”.
Caros patrícios, assim começo aquela que era suposto ser a minha crónica 13, hoje, sexta-feira 13. As palavras acima são do meu camarada de ofício sul-africano Stephen Grootes, repórter do Eyewitness News (o que quer dizer Notícias de Testemunha Ocular). Grootes foi, na passada sexta-feira, testemunha tal como outros colegas de profissão, da libertação de Mzilikazi Wa Africa, jornalista sul-africano.
Calhou que eu estivesse, nessa mesma semana, na África do Sul, com alguns colegas cá do País e de outros da região, reunidos pela Open Society Initiative for Southern Africa (OSISA), num seminário para traçar um plano de acção de combate jornalístico à xenofobia, em particular na África do Sul, em geral na África Austral, em global na África e em universal no Mundo.
Já repararam, caros patrícios e leitores, como trouxe um bom expediente para me desculpar da minha ausência semana passada, não é!?
esculpado que estou pela falta de comparência, deixem-me revelar-vos o seguinte: – Enquanto eu e os meus colegas éramos fechados no Indaba Hotel e escolarizados sobre Consciência Negra, Pan-Africanismo, História Negra e Origens e Natureza da Xenofobia, lá fora na África do Sul a Liberdade de Imprensa e de Expressão era sexualmente violada.
Fomos encavernados e doutrinados naqueles fundamentos para entender ou rebuscar o passado que enforme a base de valorização do que temos de Comum – e daí enaltecermos, nas nossas matérias, valores positivos que nos unam como Africanos e Negros no combate à Xenofobia. Caros patrícios, é verdade que Indaba significa problemas em Zulu, e aquele Hotel de Joanesburgo é suposto ser um local de discussão ou resolução de problemas, mas não estou a sugerir que “enquanto nós discutíamos o sexo dos anjos a nossa cidade da Liberdade era invadida”.
Ai de mim! Disse e sugeri, isso sim, que, na semana passada, a Liberdade de Imprensa e de Expressão era sexualmente violada nos aspectos que tornam sexy e sexualmente activos esses direitos consagrados universalmente na Declaração Universal dos Direitos Humanos e plasmados constitucionalmente nas Leis-Mãe de Estados de Direito, de facto, como a vizinhíssima África do Sul (nós ainda não passamos de um projecto de Estado de Direito).
Sim, o ANC, com a sua esmagadora maioria parlamentar, está a avançar para uma nova Lei de Protecção da Informação que pretende castrar o actual acesso que o público e os media têm ou é suposto terem à informação pública. Precisamente, porque a prisão de Mzilikazi Wa Africa é só um sinal do que está por acontecer…em breve, a concretizarem-se os desejos da Liga Juvenil do ANC, liderada pelo famigerado Julius Malema, de instituição de um Tribunal de Media dedicado exclusivamente a perseguir e a julgar actos de jornalistas e órgãos de informação.
É preciso imaginar que exemplo, que referência, que precedente tal significará na Região e no Continente, perante uma África do Sul em que a Lei, a Ordem e a Justiça funcionam, embora muitas vezes travadas ou desvirtuadas pela acção tentacular do polvo do Crime Organizado e dos Interesses dos Poderosos. O caso da prisão de Mzilikazi Wa Africa é tão grotesco que o próprio Grootes formula algumas perguntas pertinentes, na sua matéria no Daily Maverick: “Quem decidiu que Wa Afrika deve ser preso?”
“Foi um oficial da Polícia?” “Foi Bheki Cele (Comissário Nacional da Polícia Sul-Africana)?” “David Mabuza (Governador da Província de Mpumalanga)?” “Menzi Simelane (Director da NPA, a PGR Sul-Africana)?” “Todos eles acima?” “(…) No momento que isto realmente passou a uma ilegalidade não foi na altura da detenção, foi quando um procurador decidiu na Quinta-Feira que não havia evidência para sustentar o caso. Então os Falcões dizem-nos que houve compromisso.
Realmente?
Com quem?
Foi Pretória?
Ou Nelspruit?
Quem tem o pode de desautorizar um procurador?
Simelane deve estar envolvido (…) E quem foi o tal que lhe telefonou? Deve ter sido Mabuza, ou o seu representante. Nós dissemos (…), isto é uma intervenção do ANC. Isto é o que acontece quando um partido político não está feliz em apenas controlar todas as alavancas de poder, mas precisa de controlar absolutamente tudo. E então quando as coisas dão errado, e isso torna-se público, matar o mensageiro.”
A ser verdade o que escreve Stephen Grootes, é um must recitar os Fugees na sua música The Beast, do álbum de 1996 The Score: “Warn the Town, The Beast Is Moving” (Avisem a Cidade, a Besta Está a Movimentar-se). Como bem conclui Grootes: “O símbolo de hoje (sexta-feira passada) não foi Wa Afrika libertado, ou a furiosa multidão mal orientada fora do tribunal.
Foram os oficiais Falcões que vieram à sala do tribunal equipados para um tumulto. Com armas, gás lacrimogéneo e esses coletes que trazem a ameaça. E óculos de sol numa sala de tribunal. São eles, os soldados rasos que irão alegar um dia que estavam apenas a cumprir ordens que farão o pontapear, empurrar, bater e talvez matar. Precisamos de saber quem realmente os controla. Certamente que não é o povo deste país”. Certamente, como bem resume Grootes no fecho da sua crónica, esta é “de facto, a Forma das Coisas por Vir”.
Apesar do empréstimo dos argumentos do meu camarada de ofício, esta ainda é a minha crónica, por isso vou fechá-la assim: Mzilikazi Wa Afrika quer dizer a Grande Estrada de África…
