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Fuga ao fisco: o pão de cada dia

Fuga ao fisco: o pão de cada dia

A fuga ao fisco é um problema com “barbas brancas” e que se vai tornando uma prática reiterada como resultado da fraca capacidade de fiscalização, segundo alguns economistas. Dados existentes dão conta de que, em todo o país, os potenciais contribuintes não chegam aos 10 porcento.

O Governo, através da Autoridade Tributária de Moçambique (ATM), multiplica-se em iniciativas na tentativa de aumentar a arrecadação de impostos, através de estratégias de alargamento da base tributária que se circunscrevem “nas metas e programas de atribuição de NUIT, implementação do Imposto Simplificado para Pequenos Contribuintes e popularização do imposto”. Porém, do potencial que o país dispõe, apenas um número ínfimo é que cumpre com as suas obrigações fiscais enquanto grande parte opta pela fuga ao fisco alegando existir “numerosos impostos que incidem num único indivíduo”.

Este é um cenário que não só se verifica com os cidadãos comuns e vendedores informais, mas também existem comerciantes já estabelecidos que enveredam pelo mesmo caminho. Numa ronda feita por alguns estabelecimentos comerciais da cidade de Maputo, sobretudo na zona baixa, constatámos que os consumidores têm a prerrogativa de escolher se querem ou não pagar o Imposto sobre Valor Acrescentado (IVA). Ou seja, ao chegar a uma loja para a aquisição de quaisquer bens de consumo, na sua maioria aparelhos electrodomésticos, o comprador tem a liberdade de dizer que pretende fazêlo sem o IVA – o que significa não ter direito a um recibo -, valendo-lhe, assim, um desconto na ordem dos 17%.

Esta situação é vista como uma mais-valia tanto pelo consumidor assim como pelo comerciante, pois, para o primeiro é “uma forma de poupar algum dinheiro” enquanto para o segundo é uma “estratégia de fidelização e conquista de novos clientes”, ou melhor, ao agir daquela maneira – vendendo o produto a um preço aparentemente barato aos olhos do consumidor -, o comerciante tem em mente a ideia de que o cliente fará publicidade do estabelecimento junto a pessoas que, provavelmente, precisarão do mesmo bem.

Outra situação verificada pelo @Verdade é a crescente venda, ao longo dos passeios, de produtos retirados de algumas lojas ou armazéns estabelecidos. Certos comerciantes aproveitam- se da informalidade para enveredarem pela ilegalidade, diz o economista do Grupo Moçambicano da Dívida (GMD), Humberto Zaqueu. Para este, grande parte dos que vendem nas ruas não é proprietária dos produtos, facto constatado pelo nosso jornal.

Mário Zau é exemplo disso e encontrámo- lo ao longo da Avenida Guerra Popular a comercializar vestuário. Segundo nos deu a conhecer, vende peças de roupa retiradas de uma loja que deveria pagar imposto pelas mesmas. “Se fores comprar estas mesmas calças nessa loja, poderás pagar mais se pedires recibo”, afirma Zau. Também são vendidos nas ruas bens que poderiam estar pendurados numa prateleira de um supermercado ou de qualquer outro estabelecimento comercial como, por exemplo, discos, revistas, entre outros produtos. Tem sido esta a estratégia de venda mão em mão adoptada por alguns cidadãos, não passando recibo e escapando ao pagamento da taxa por actividade económica.

FALTA FISCALIZACAO

Apesar de Moçambique dispor de um potencial para gerar receita interna, continua a depender da ajuda externa e, por esta razão, torna- se vulnerável a qualquer tipo de choque externo. A título de exemplo, com a crise sem precedentes que fustiga a Europa, o país poderá vir a ser afectado por aquela “catástrofe económica”, prevê o economista do Grupo Moçambicano da Dívida. Aliás, a Espanha, um dos principais doadores que apoia directamente o orçamento do país, anunciou recentemente medidas de austeridade cortando o pacote de ajuda ao desenvolvimento de África em cerca de 700 milhões de euros.

Os especialistas apontam como uma das razões da vulnerabilidade do país o facto de existirem megaprojectos que, desnecessariamente, receberam benefícios fiscais, isentando-os de pagar a Contribuição Industrial, ou seja, o impostos sobre os lucros. Segundo os economistas, esta é “uma grande receita que o Estado perde”, pois, os megaprojectos chegaram a duplicar o volume de exportações. Esse ambiente de alta dependência do exterior é resultado da “nossa débil capacidade de mobilizar as receitas internas”, diz o economista.

De acordo com Zaqueu, o país deve procurar formas alternativas de tributação e não se deve aumentar a taxa dos impostos porque esta medida desencorajaria os produtores, o consumidor e a economia no geral, uma vez que incidem sobre o mesmo grupo de contribuintes. “Não bastam apenas campanhas de massificação do NUIT e de sensibilização da população, é preciso uma série de medidas sobretudo de fiscalização”, comenta. O economista vai mais longe ao afirmar que neste país a “fiscalização não funciona”, razão pela qual se asssiste à “fuga sistemática ao fisco”.

“É necessário fazer com que os que não pagam impostos passem a pagar, mas a fiscalização é a função- chave e o cidadão deve ter a consciência do cumprimento da responsabilidade social que tem com a sua pátria”, afirma. “Os que fogem ao fisco são pessoas que nem um nem outro imposto pagam e é o mesmo grupo que se faz a um estabelecimento comercial e diz querer pagar sem o IVA”.

HA IMPOSTOS DEMAIS

Procurámos ouvir a opinião dos leitores acerca dos impostos. Na sua generalidade, afirmam que o sistema fiscal moçambicano é constituído por muitos impostos, o que faz com que os potenciais contribuintes optem pela fuga ao fisco. Dentre as opiniões colhidas, merece destaque a de Alberto Nobre que diz o seguinte: “São muitos impostos para uma só pessoa e até então ainda não vi o benefício de pagar”. Já Acácio Sulemane reconhece ser importante dar a sua contribuição fiscal, mas confessa “haver impostos demais” e “querendo ou não acabo por pagar o IVA e a segurança social”.

O sistema tributário nacional integra impostos directos e indirectos, actuando a diversos níveis, designadamente a tributação directa dos rendimentos e de riqueza, e a tributação indirecta, incidindo sobre os níveis de despesa dos cidadãos.

Os impostos são, nomeadamente: Contribuição Industrial, o Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), Imposto sobre Consumos Específicos, Imposto Complementar, Imposto sobre os Rendimentos do Trabalho (IRT), Segurança Social, Imposto de Selo, Direitos Aduaneiros, Contribuição de Registo (SISA), Imposto sobre Doações e Sucessões, Imposto Predial Autárquico (IPRA), Imposto Pessoal Autárquico (IPA) e Taxa por Actividade Económica (TAE).

MAS PORQUE SE DEVE PAGAR IMPOSTO?

Os impostos devem ser pagos por todos os cidadãos porque é através da cobrança dos mesmos que os recursos chegam aos cofres do Estado, possibilitando ao Governo a implementação das suas políticas nas áreas de saúde, educação, segurança, transporte, infra-estrutura, entre outras. Ou seja, o Estado, criado pelos indivíduos para atender ao bem comum, tem várias funções e atribuições, que vão desde a execução de obras públicas passando pela prestação de serviços até à garantia da justiça.

A tributação é um meio para a obtenção dos recursos necessários à satisfação das necessidades colectivas, pelo que a cobrança de impostos tem uma finalidade social de natureza jurídica, económica, administrativa ou política. No entanto, pagando impostos, o cidadão cumpre com o seu dever cabendo ao Estado cumprir as suas obrigações fornecendo-lhe serviços básicos a que tem direito. Em síntese, pagar o imposto é uma das maneiras de participar na construção do país.

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