Quando o assunto é a produção e exposição de peças teatrais, nos dias que correm, a cidade de Maputo impera. O problema é que a maior parte dessas obras exclui a criançada, gerando uma lacuna no entretenimento infantil. Para contrariar esta tendência, o Grupo de Teatro M’Bêu montou uma estória sugestiva. Chama-se “N´wampfundla – O Coelho Preguiçoso” e é exibida, nas manhãs de sábado e domingo, no Teatro Avenida.
“N´wampfundla – O Coelho Preguiçoso” é uma obra produzida pela actriz moçambicana Isabel Jorge e encenada pelo actor Félix Bruno, tendo como participantes os actores Horácio Guiamba, Arlete Guilhermina, Sílvia Mendes e o músico Mole.
A obra está inserida no projecto “N´wamfundla – Teatro para Crianças” cujo objectivo é a produção e promoção de peças teatrais para o público infantil com base nos contos tradicionais moçambicanos a fim de se resgatar a tradição oral e preservar-se, por essa via, os traços da identidade cultural moçambicana, criando-se o gosto pelas artes cénicas no seio da pequenada.
De acordo com os produtores do espectáculo, a promoção de iniciativas culturais vocacionadas para a criança surge da constatação de uma lacuna no meio teatral moçambicano, em que mais se privilegiam criações teatrais para os adultos em detrimento das crianças. Recorde-se de que a mais recente experiência do grupo M’Bêu, na exposição de peças para as crianças, foi a produção da obra “Nós Matámos o Cão Tinhoso”, inspirada no livro homónimo do escritor moçambicano Luís Bernardo Honwana.
O grupo associou na criação elementos da dança Mapiko como, por exemplo, os gestos, os movimentos e as máscaras para ilustrar aspectos peculiares da narrativa perante a audiência. Com o projecto “N´wamfundla – Teatro nas Escolas”, outra iniciativa, o colectivo pretende fazer o mesmo tipo de pesquisas e aplicar os seus resultados no teatro, construindo, assim, um modelo de encenação com motivos e elementos da cultura moçambicana para os alunos.
O que se sabe sobre a peça
“N´wampfundla – O Coelho Preguiçoso” é uma peça rica em termos de espaços lúdicos, cantos e brincadeiras infantis. Há uma briga salutar entre as crianças, em que algumas exigem que a diversão seja a base de brincadeiras masculinas, enquanto as meninas advogam o contrário.
Por exemplo, a peça mostra, por um lado, que determinado tipo de entretenimento como, por exemplo, os filmes de acção em que se exibem cenas de violência e combate não são apropriados aos petizes. Por essa razão, “eu acho que os nossos pais deviam proibir-nos de assistir a esse tipo de filmes”, diz uma personagem.
Por outro lado, mesmo nas brincadeiras masculinas, como as que envolvem os carrinhos, os actores demonstram as consequências que podem advir da condução ofensiva, sobretudo à alta velocidade, que muitas vezes resulta em acidentes de viação, “aumentando os números de mortes por atropelamento e outros acidentes rodoviários no nosso país”. Diante de todos esses impasses, as crianças, em consenso, procuram o seu avô a fim de lhes contar estórias.
É interessante notar as artimanhas, desde a chantagem de fazer chichi nas calças até a renúncia de realizar os Trabalhos Para Casa, inventadas pelas crianças para convencê-lo a dizer fábulas. Em contrapartida, o avô explica-lhes sobre as consequências que podem decorrer da adopção desses comportamentos, focalizando o mau cheiro que se pode ter, o desconhecimento da história nacional do país, bem como a geografia local.
Por outro lado, como se explica na estória, nessa manifestação de birra, aconselha-se às crianças a não ameaçarem os pais recusando-se a alimentar-se sob pena de ficarem mal nutridas e, em resultado disso, contraírem doenças. Além do mais, o vovô elucida que se elas não comerem devidamente e não estudarem, quando crescerem, não poderão ser professores, médicos, advogados, jornalistas, muitos menos pilotos de aviões e navios prejudicando, assim, os seus sonhos.
Por fim, o avô decide expor a narrativa do Coelho Preguiçoso para controlar a rebeldia das crianças que se manifesta na recusa de irem à Igreja no domingo. “Vocês não sabem que o vovô gosta de acordar de manhã, nos domingos, falar com os seus netos e levá-los à Igreja? É para ele pensar o quê sobre a vossa atitude?”, questiona intrigado e sem outra alternativa senão a de satisfazer o pedido dos petizes.
Entretanto, quando as crianças pensavam que haviam conseguido alcançar os seus objectivos, surge um imprevisto. O avô, novamente, não pode dizer o conto – o problema é que naquela noite não havia lua, para iluminar o espaço a fim de que ele pudesse ver os seus netos à medida que narrasse a estória. Por outro lado, tratando-se de uma zona rural, apesar de que os animais ferozes já não existiam, o idoso que utilizava o fogo para afugentá-los precisava da fogueira por puro capricho.
A verdade, porém, é que de uma ou de outra forma, o velho acaba por dizer a estória. Como? De que ela, essencialmente, trata? O estimado leitor irá descobrir levando as crianças para verem a peça aos sábados e domingos, no Teatro Avenida, em Maputo, a partir das 10 horas.