“O Governo por si dirigido [Filipe Nyusi] pode contar com todo o nosso suporte na implementação do Programa Quinquenal do Governo e nos planos que ao logo do mandato aprovaremos”. Estas palavras, ditas por Margarida Talapa, chefe da bancada Parlamentar da Frelimo, no seu discurso de abertura da primeira sessão ordinária da Assembleia da República (AR), a 31 de Março de deste ano, “assentam como uma luva” em tudo o que o partido no poder fez no Parlamento nas duas sessões da oitava legislatura. Levou a mal a oposição e, descaradamente, deu palmadinhas nas costas do Executivo. A vassalagem do partido em relação ao Governo vincou, uma vez mais. Não foram sessões para esquecer, mas para uma oposição deve ser arrasador ver tudo quanto é sua proposta a ser chumbada, uma a uma, com recurso à ditadura de voto.
Aliás, durante o encerramento das actividades da AR, na quinta-feira (17), o Primeiro-Ministro, Carlos Agostinho do Rosário, teve uma atitude própria de quem pretendia acabar com as dúvidas dos incrédulos: arrastou consigo os membros do Governo presentes na sala, todos ficaram de pé e bateram palmas em ovação a Margarida Talapa no momento em que se dirigiu ao pódio. Afinal, quem fiscaliza a quem, ou tudo não passa de uma farsa?
A casa do povo observa, desde esta sexta-feira (18), um interregno, até Março próximo. Para atrás ficam os mesmos problemas de que o povo se tem queixado. A tensão político-militar, por exemplo, prevalece como um barril de pólvora que a qualquer momento pode rebentar. Pelo tempo que transcorreu sem nenhuma solução eficaz para a manutenção da almejada paz efectiva, parece que quer o Governo, quer o Parlamento, sentaram-se sobre este assunto como quem acredita que “o tempo cura tudo”.
Alguns deputados, os da Frelimo, por exemplo, retornam aos seus círculos eleitorais com a sensação de dever cumprido. Sem evasivas, aprovaram tudo que lhes foi remetido para apreciar e, assim, cabe a quem eles prestam contas atribuir-lhes o certificado de verdadeiros obreiros do Governo. Os outros, os da oposição, que consideram que muitas coisas que podiam ter sido feitas em prol da paz e da estabilidade não aconteceram, certamente que estão desiludidos.
Ivone Soares, chefe da bancada parlamentar da Renamo, disse que “em 2015, aconteceram muitas coisas boas que se tivessem sido acolhidas positivamente pelo regime da Frelimo e evitaríamos o clima de instabilidade que vivemos em Moçambique. (…) A nossa bancada propôs um conjunto de leis e emendas” para permitir que haja “paz, aprofundamento da democracia, desenvolvimento e consolidação da unidade nacional”, mas, “infelizmente, a Frelimo reprovou tudo porque quer o poder a qualquer custo”.
No que tange a este ponto, Margarida Talapa, explicou que relativamente à revisão pontual da Constituição, um dos assuntos chumbados pelo seu partido, este defende que a revisão seja global para que se “incorpore a vontade do povo e não para acomodar os interesses de um grupo” cujo intuito é assaltar o poder. “(…) Assistimos nesta Casa [do Povo] a um grupo cujo discurso opunha-se a tudo que fosse coerente e legal”.
O discurso de Margarida Talapa foi literalmente uma cópia ao informe sobre a situação geral da Nação proferida na quarta-feira. Em Março último, ela sugeriu que “as vontades individuais ou de grupo” não se sobrepusessem, em momento algum, “aos princípios constitucionais. (…) A Frelimo prometeu ser aberta ao diálogo para a busca de soluções para a consolidação do Estado, mas na prática viu-se o contrário. Os “consensos” de que falou para a “construção do diálogo”, mesmo que fosse no meio de divergências, não concretizaram.
A deputada da “Perdiz” reiterou que o posicionamento dos “camaradas” denota uma pretensão de “empurrar a Renamo para a guerra, e agora estão aflitos para saber qual será o nosso próximo passo”.
Ainda sobre a crise política que torna o futuro dos moçambicanos incerto, na abertura da primeira sessão, em Março, Ivone Soares afirmou que os representantes do povo deviam assumir a responsabilidade de adoptar um “compromisso político inteligente e patriótico” para o “alcance da paz e estabilidade no país”. Nesta legislatura é possível realizar alguns anseios mais prementes dos moçambicanos”.
Na sua intervenção, Ivone Soares foi igual a si própria. Sem medi as palavras, ela atacou o seu adversário politico a acusou-o novamente de intentar matar o seu líder. E prometeu que a sua formação política vai bater-se duro com o regime para garantir o bem-estar do povo.
Em Julho passado, aquando do encerramento da primeira sessão ordinária da oitava legislatura, a deputada mostrou-se indignada com a situação de miséria de uma larga maioria dos moçambicanos e lançou achas à tensão política resposta àquilo que tem considerado provocações da Frelimo e manobras dilatórias para aniquilar Afonso Dhlakama.
Na ocasião, afirmou que o seu partido e “os seus homens fortes, que a Frelimo chama de homens armados, vão continuar com as suas armas em punho, firmes e conscientes” de que as mesmas são supostamente para “defender os interesses do povo” e avisou: “não brinquemos aos soldadinhos. (…) Quem é esse que vai ter força para desarmar a Renamo sem diálogo? Quem é esse?”
MDM decepcionado
A para da “Perdiz”, Lutero Simango, chefe da bancada parlamentar do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), disse que “muitos dos nossos concidadãos estavam ansiosamente esperançados de que seria nesta sessão ordinária que a magna casa chamaria a si a responsabilidade de reconquistar a paz e renovar as esperanças dos moçambicanos face à difícil situação política e socio-económica que o país enfrenta”.
Num outro desenvolvimento, o deputado deixou transparecer que a exclusão ainda impera. “Moçambique precisa de políticas inclusivas, abrangentes e actuantes para dinamizar a participação de todos no desenvolvimento nacional, sem qualquer discriminação”.
No que à aplicação das leis e ao funcionamento das instituições públicas diz respeito, o MDM entende que a carga ideológica partidária, resultante do monopartidarismo, continuará a ser responsável pela má actuação da administração pública por conta de um Estado enraizado no partido. “É preciso resgatar a nação, eliminar o espectro da guerra (…) e desencadear um debate profundo para a reconciliação nacional e inclusão efectivas”.
Para Lutero Simango, o enquadramento legal da eleição do governador provincial, nas eleições de 2019, é um imperativo nacional, pois, aprofunda e torna operacional a descentralização.” Não poderemos dar-nos ao luxo de nos dividir por questões acessórias”.