Milena Orlova não pensou duas vezes quando ouviu falar sobre o golpe, 20 anos atrás, que ameaçava um retorno ao regime comunista linha-dura da União Soviética. Ela rapidamente pegou o comboio para Moscovu, a partir da sua casa fora da cidade, e juntou-se a outros manifestantes que haviam se reunido ao redor do Parlamento russo para defendê-lo.
“Quando escutamos sobre o golpe, o meu pai disse-me para não ir ali sob nenhuma circunstância. Mas assim que pude eu escapei e juntei-me aos protestos”, disse Orlova, que tinha na época 23 anos e era estudante de história da arte. “Não pensei no perigo. Eu era jovem e tola. Uma revolução estava em andamento e eu queria ser parte dela”.
Do anúncio do golpe em 19 de agosto até o seu colapso dois dias depois, os moscovitas aglomeraram-se em redor do prédio da Casa Branca, que então abrigava o Parlamento da Rússia, desafiando tanques e as forças de segurança soviéticas. A resistência, liderada pelo presidente russo Boris Ieltsin, foi vital para derrotar os golpistas e evitar que eles revogassem as reformas que já haviam provocado enormes mudanças sob o líder soviético Mikhail Gorbachev.
“Havia todo tipo de rumores, sugestões de que os tanques estavam a caminho, mas nós todos apenas demos as mãos quando escutamos isso”, disse Orlova, que hoje é crítica de arte. “Nós resistimos porque achamos que essa era a última esperança que tínhamos. Nenhum de nós queria voltar ao estilo de vida soviético”.
ATMOSFERA FESTIVA
Os manifestantes incluíam pessoas de todas as classes sociais, jovens e velhos. Orlova deu o seu quinhão pela causa copiando folhetos que davam aos manifestantes as últimas notícias do golpe, durante o qual Gorbachev foi mantido preso em sua casa na Crimeia. Os simpatizantes forneceram alimentos. Alguns trouxeram hambúrgueres, mulheres idosas levavam tortas e uma floricultura enviou cravos vermelhos. Músicos vieram e tocaram para a multidão, disse Orlova. Três homens foram mortos durante os distúrbios em Moscou, e padres foram ao local para abençoar os manifestantes que temiam ser mortos, mas Orlova recorda-se sobretudo na atmosfera festiva.
Ela lembra-se de Ieltsin, que subiu num tanque em frente à Casa Branca para apelar ao Exército que não se voltasse contra a multidão. “Ele foi tão comovente, essa figura corpulenta, de cabelos brancos, que estava tão determinada, empurrando os guarda-costas para fora de seu caminho para que ele pudesse falar com as pessoas”, disse ela. Orlova lembra de um sentimento de euforia quando ficou claro que o putsch havia fracassado, um sentimento de que uma vida nova estava a abrir-se para ela e que a Rússia tinha um novo começo.