“…. e aí eu expliquei-lhe: eu (também) estou teso mas ainda não sou gay, portanto, lixa-te!”
Eu acho que já devia estar morto e moribundo. Nenhuma vítima, como eu, pode permanecer vivo, são e saudável. Eu sou estranho, sim, assumo! Na verdade, eu suspeito da sanidade mental das pessoas que convivem comigo algumas das quais, de forma teimosa e melancólica, nutrem afecto e carinho por mim enquanto outras, para piorar, dizem que me amam. Que coisa mais grotesca! Ninguém pode amar um leproso como eu.
Esse amor, que me é dispensado, é uma injúria, uma atrocidade. Eu, pelo menos de forma intencional e consciente, nunca subjuguei ninguém, apesar de amar todos os meus próximos. Eu sei que tudo isso é uma falsidade, ou melhor, reitero, é uma hipocrisia.
Ninguém me ama! Ninguém, numa sociedade materialista em que vivemos, pode amar uma vítima improdutiva, esperta e desperta, como eu. Assim não dá! Para a minha sensibilidade, o seu amor é um duro golpe. Ora, eu já estou farto de todas essas barbaridades.
Como se devem recordar, no outro dia acordei teso. Encontrava-me num autêntico e estranho cio de tal sorte que certos orifícios deste meu corpo maduro precisaram de que se lhes ministrassem uns objectos eriçados e vibrantes.
Aliás, apesar de eu não me acostumar a esta realidade, já é voz comum que da minha tesão ninguém mais se alarma. Ela constitui o meu dia-a-dia. Eu sou um carente de verdade! Se calhar é por essa razão que, sem vergonha nenhuma, todos os dias eu masturbo-me em espaços públicos. Algumas pessoas chamam-me demente, outras simplesmente ignoram-me, mas para mim isso não faz diferença nenhuma – eu vou masturbar-me na mesma.
Os incomodados que se retirem! Eu quero que isto fique bem claro: Se se tratasse de um problema sexual acho que, a uma hora dessas, uma tal Rua de Bagamoyo – numa dita nostálgica cidade das acácias – já estaria órfã daquilo que lhe glorifica como a prostituta dos moçambicanos. Que pena, nem tenho como experimentar novas sensações voluptuosas.
No outro dia, um pouco depois de eu ter regressado do Brasil – em Maputo, geralmente, eu vou para aquele país latino-americano sempre que sinto saudades ou vontade de falar com o Senhôu – eu, cidadão brasileiro no País de Marrabenta, recebi um telefonema de um irmão moçambicano que me explicou que eu devia dirigir-me a uma “Automated Teller Machine” (ATM, ou simplesmente um balcão automático) para, em conformidade com as suas orientações, resolver o problema.
Na verdade, como o sujeito me esclareceu, a minha conta bancária – cuja sua existência não tenho consciência, obviamente porque não a criei – havia sido “cativa” e/ou “congelada”. Portanto, era importante que eu resolvesse imediatamente aquele problema sob pena de eu perder todo o meu saldo, o bancário. Assim, recomendou- -me veementemente o sujeito.
A partir daquela tarde, em diante, a sorte começou a bafejar-me tanto que, no dia seguinte, no in box do meu celular – cujo número acabava de adquirir na mesma semana de uma operadora de telefonia local – recebi uma mensagem em que se me explicava que, em resultado das chamadas acima de 10 mil meticais que eu havia efectuado naquele mês, eu havia sido premiado com uma viatura de marca Fiat, duas geleiras Westpoint, uma motorizada acelera Hyundai, e um valor monetário de 500 mil meticais.
Com este prémio, além de a minha tesão começar a desaparecer, eu comecei a perceber que não precisaria mais de fazer aquela consulta no médico tradicional cujo panfleto me explicara que ele resolvia os problemas relacionados com “o azar no trabalho, no amor, no sexo, e que recuperava a sorte e o amor perdidos, ao mesmo tempo que reunia uma capacidade invulgar para fazer o pénis crescer (…) – tudo isso num estalar de dedos –, bastando para o efeito marcar uma consulta por apenas 200 meticais.
A história complica-se quando, no fim de tudo, se esclarece que a cerimónia da entrega dos ganhos não seria pública. Ou seja, eu tinha de contactá-los em fórum privado. Putz, fiquei teso novamente, são malandros!
Naqueles dias, não sei por que razão, o dinheiro corria ao meu encontro. Que pena, não me alcançava. Por exemplo, mesmo sem querer, eu conheci uma tal Mirabel, uma belíssima figura, órfã de pais, originária da Serra Leoa que – em resultado da guerra civil no seu país – se encontrava refugiada em Senegal, onde estudava Medicina.
De nada, eu havia-me tornado no seu amor e, em resultado disso, devia casar-me com ela para poder beneficiar de um valor 500 mil dólares, uma fortuna que o seu pai deixara guardado em qualquer banco estado-unidense, cujo acesso dependia do casamento que me propunha.
A Mira, como eu a tratava, era linda – se ela aceitasse residir em Moçambique, talvez, a uma hora dessas eu me tivesse casado – mas o problema é que ela queria que eu fosse ao Senegal. Eu estava teso, meu, não tinha como comprar as passagens de avião. Por isso perdi-a, como também perdi a sua fortuna.
Por causa do metical, as peripécias pelas quais passei – nesta vida e neste país – são inesgotáveis, muitas das quais são inenarráveis. Portanto, não contestem que eu diga que sou vítima do metical. Mas a verdade é que, em relação aos homens do banco e da telefonia, expliquei-lhes que naquele dia efectivamente eu estava teso – como aliás continuo –, mas ainda não sou gay, portanto, vão à merda! Nos dias que correm, eu mantenho a mesma posição em relação a todos os corruptos e exploradores desenfreados deste país. Lixem-se!