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“Só espero que o BI não caduque antes de chegar às minhas mãos”, um dos 20 milhões de moçambicanos que aguarda Bilhete de Identidade

“Só espero que o BI não caduque antes de chegar às minhas mãos”

É preciso mais do que paciência para obter o Bilhete de Identidade (BI) na cidade e província de Nampula. Há mais de um ano, várias pessoas aguardam pelos respectivos documentos que já deveriam ter sido emitidos ao fim de 15 dias, facto que cria embaraços quando se dirigem a uma instituição bancária, estabelecimento de ensino ou mesmo quando interpelados pela Polícia. Agastado com a morosidade e com o receio de os BI’s caducarem sem tê-los em mão, os populares exigem a reformulação dos métodos de funcionamento da Direcção de Identificação Civil naquela parcela do país.

Decorridos dois meses, tempo que foi estipulado para a entrega do documento, Belmiro Amisse, de 24 anos de idade, residente do bairro de Carrupeia, arredores da cidade de Nampula, não se lembra do número de visitas que teve de fazer à Direcção de Identificação Civil (DIC) de Nampula para se inteirar da data de entrega da sua identificação. No princípio, a demora não incomodava o jovem, até porque nunca teve necessidade de apresentar o BI em alguma ocasião. Porém, a situação começa a preocupá-lo quando viu o talão que comprova a espera daquele documento rejeitado no momento de inscrição para a prestação de provas de exame de admissão a um estabelecimento de ensino público, não obstante o mesmo possua fotografia e carimbo oficial.

“Fiquei perturbado com a situação, pois eu desejava tanto concorrer a uma vaga no Instituto de Ciências de Saúde. Tive de arranjar a certidão de nascimento e quando a consegui já era tarde para fazer a inscrição”, disse Amisse, tendo acrescentando que “esse não foi o primeiro caso, lembro-me de que também me foi negada a abertura de uma conta por apresentar o talão”.

Presentemente, prestes a completar dois anos – o que acontecerá em Setembro próximo – à espera do Bilhete de Identidade, ele aguarda, sem esperança, pelo referido documento. “Só espero que o BI não caduque antes de chegar às minhas mãos”, comentou.

O caso de Belmiro Amisse não é isolado. Matias Ussene, de 23 anos de idade, residente da Unidade Comunal de Naculue, no bairro de Muahivire-Expansão, em Nampula, é também um dos lesados. Depois de expirar a validade do seu primeiro BI em 2012, ele dirigiu-se à DIC de Nampula para renovar o documento, tendo-lhe sido atribuído um talão, com a promessa de que teria o seu documento 45 dias depois. Passado este período, o jovem regressou à instituição, onde viria a ser informado de que o seu Bilhete de Identidade ainda não estava pronto e que deveria, mais uma vez, aguardar, desta feita sem data marcada.

O acesso aos documentos de identificação, particularmente o BI, constitui um dos princípios constitucionais em Moçambique, mas o mesmo está a ser relegado para último plano, supostamente por imperativos de ordem burocrática na Direcção de Identificação Civil de Nampula.

Centenas de cidadãos que, nos últimos dois anos, se dirigiram à DIC para fins de obtenção ou renovação daquele tipo de documento pessoal, andam agastados com aquela instituição. Alguns não conseguiram sequer obter esclarecimentos sobre as verdadeiras causas da demora e outros foram aconselhados a preencher os formulários pela segunda vez, porque os seus processos sumiram das gavetas.

Embora o comprovativo de espera de BI possua fotografia e carimbo oficial, o mesmo está longe de substituir o referido documento – que o diga Manuel João Alberto, residente na cidade de Nampula, que há dois anos espera por aquele documento. Com o talão número 30135578, ele viu-se impossibilitado de efectuar qualquer tipo de movimento na sua conta bancária. A última revalidação do vulgo “espera bilhete” foi feita no dia 09 de Agosto de 2013 para um período de 90 dias. “Já perdi a esperança de obter o BI, porque os funcionários da DIC não sabem dizer ao certo quando estará pronto”, afirmou.

A demora também está a causar danos efectivos na vida de Deolinda Mendonça Paulo, de 15 anos de idade, que tentou, pela primeira vez, obter o Bilhete de Identidade no início de 2012. Em 11 de Outubro do mesmo ano, o talão com o número 31809512 foi renovado para mais um período de 90 dias, mas, volvidos dois anos, ela continua à espera do documento.

O cenário tem sido recorrente não só na capital provincial, onde tem havido relatos de desaparecimento de quantidades consideráveis de Bilhetes de Identidade, mas também nos distritos, onde alguns cidadãos ameaçam amotinar-se nas instalações daqueles serviços em Nampula para protestar contra o mau desempenho dos funcionários da instituição.

A demora

Para obter o BI, os cidadãos passam por inúmeros sacrifícios e são obrigados a madrugar para conseguirem a senha que possa lhes permita a tramitação do seu processo. Alguns chegam a dormir na DIC, devido às enchentes que se registam.

O período da manhã é o mais movimentado. Aqueles que conseguem senha são atendidos quase no fim do expediente. Os demais utentes são obrigados a regressar no dia seguinte. Segundo a instituição, o documento fica pronto entre 60 e 90 dias depois do pagamento da taxa – 180 meticais.

A cidade de Nampula conta apenas com dois cartórios da DIC, especificamente para a emissão de BI’s, e quase todos os distritos daquele ponto do país têm delegações onde os cidadãos podem dar início ao processo de obtenção daquele tipo de documento.

Além da demora, os lesados acusam os responsáveis daquele sector de actividade de nada fazerem no sentido de corrigir o comportamento de certos funcionários indiciados de estarem a desviar o dinheiro dos emolumentos e outras taxas no processo de emissão daquele documento.

Uma investigação do Centro de Integridade Pública (CIP), publicada em Maio último, denuncia que os crescentes atrasos na emissão de Bilhetes de Identidade devem-se à incapacidade do Governo de controlar adequadamente as parcerias público-privadas. Além disso, o CIP mostra que, em seis anos, desde que o contrato de Parceria Público-Privado para a produção de documentos de identificação foi assinado com uma empresa belga, denominada Semlex, sem concurso público, o tempo de espera pelos documentos de identidade aumentou de 15 para mais de 90 dias e a quantidade de documentos emitidos tende a diminuir.

Estiveram a frente do negócio cheio de irregularidades entre a Semlex e o Governo o antigo ministro das Finanças, Manuel Chang, em representação do Governo, e o director geral da Semlex Europe, Albert Kazariwan, cidadão de origem síria, assistidos por José Pacheco, actual ministro da Agricultura e Segurança Alimentar.

Presentemente, cerca de 17 porcento da população possuem Bilhete de Identificação biométrico, mas, segundo o Plano Quinquenal do Governo, espera-se que até 2019 pelo menos 52,90 porcento dos moçambicanos tenham o documento de identificação.

DIC de Nampula não quer falar do assunto

O @Verdade tentou sem sucesso ouvir os responsáveis da DIC de Nampula, devido à burocracia instalada naquele sector. Porém, uma fonte que não quis ser identificada disse que a fraca capacidade institucional, aliada à grande procura demanda, faz com que o atendimento e o processo de emissão de BI’s sejam morosos, e com mais de um ano de espera em determinados locais. Por dia, em média, 500 pessoas fazem-se à DIC para obterem aquele documento de identificação pessoal.

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