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SELO: Aparente auscultação pública sobre o ProSavana: Mais um diálogo fantoche – por Organizações da Sociedade Civil

O Centro de Conferências Joaquim Chissano, em Maputo, acolheu no passado dia 12 de Junho de 2015 um encontro referente à fase nacional de “auscultação pública” do programa Prosavana, à semelhança do que aconteceu nos meses de Abril e Maio ao nível dos distritos e capitais das províncias de Nampula, Niassa e Zambézia. O encontro foi dirigido e moderado pelo ministro da Agricultura e Segurança Alimentar (MASA), José Pacheco. Ora, compulsados os preceitos sobre a consulta pública em apreço, incluindo a “Directiva-Geral para o Processo de Participação Pública no Processo de Avaliação de Impacto Ambiental” aprovada pelo Diploma Ministerial nº 130/2006 de 19 de Julho, é deverás notório que os mesmos não têm sido respeitados em todo este processo de auscultação pública do Programa ProSavana.

Importa destacar que pelo menos dois princípios fundamentais foram violados no contexto da sessão de auscultação pública moderada por José Pacheco:

1. O Princípio de Independência, que defende que “no processo de auscultação e consulta devem ser criadas condições para que o resultado possa reflectir as preocupações reais dos afectados e interessados e não seja dominado por nenhum interesse particular alheio ao processo” e;

2. O Princípio da Responsabilidade, que defende que “o processo de auscultação e consulta públicas deverá representar de uma forma fiel e responsável as preocupações de todos os intervenientes no processo”.

Embora questionado pelos camponeses e representantes das organizações da sociedade civil sobre a legalidade da “auscultação”, o ministro ordenou que a sessão prosseguisse e que os que não quisessem participar se retirassem.

O senhor ministro criou um ambiente tenso, desconfortável e de suspeição ao declarar de forma perentória que a agricultura é um dos pilares de desenvolvimento do País que o Governo prioriza, tendo sido nesta vertente que o ProSavana foi desenhado. “Estamos firmes nesta missão, qualquer obstáculo vamos atropelar e avançar”, intimidou o senhor ministro.

Pior ainda, de forma arrogante e prepotente, o Sr. Ministro, em jeito de ameaça, ordenou aos participantes que fizessem apenas comentários patrióticos, declarando que não seriam tolerados comentários obstrucionistas ou agendas obscuras. Tal acto constituiu uma violação grosseira do Princípio Universal dos Direitos Humanos sobre o Consentimento Livre, que defende a participação livre de coerção e intimidações, e que integra quase todos os tratados e convenções internacionais de que Moçambique é signatário, incluindo as Directrizes Voluntárias para a Governação Responsável da Posse da Terra, Pescas e Florestas.

Assim iniciou mais um processo de debate sobre um programa polémico que tem dividido opiniões em todos os sectores da sociedade moçambicana, não só devido à forma secreta e irregular como tem sido levado a cabo, mas sobretudo pelo facto de o programa não se adequar à nossa realidade e expectativas. Foi notória a presença de vários quadros seniores do MASA, fazendo vénias ao programa com discursos claramente ensaiados.

O modo como decorreu a sessão de Maputo fez, indubitavelmente, denotar que esta aparente auscultação pública foi orquestrada como se de uma encomenda se tratasse para, uma vez mais, tentar legitimar o Programa Prosavana, desprezando as opiniões, as expectativas e a efectiva participação da sociedade civil e das comunidades afectadas. Talvez seja por imperativo dos Governos Brasileiro e Japonês, cujas instituições democráticas, entre as quais os respectivos Ministério Público e Parlamento, têm exigido o cumprimento das mais elementares regras para a continuidade dos dois países nesta parceria triangular problemática. Por exemplo, sabe-se que o Ministério Público Federal do Brasil instaurou um inquérito à Agência Brasileira de Cooperação (ABC) e à Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) – duas instituições através das quais aquele País participa de forma directa na execução do Prosavana – para apurar a veracidade de várias denúncias de irregularidades que têm vindo a ser feitas pelos camponeses e organizações da sociedade civil destes três países.

Apesar de criadas as condições para, uma vez mais, manietar o processo de auscultação pública, o plano não surtiu o efeito desejado, na medida em que os camponeses e a sociedade civil não se deixaram enganar, nem intimidar, tendo contestado vigorosamente tais pretensões. No entanto, face às infundadas ameaças do Ministro e em resultado deste ter restringido o direito à palavra a alguns participantes, os membros da sociedade civil, incluindo os camponeses, retiraram-se da sala em protesto às irregularidades em todo este processo. Assim, em bom rigor, não houve consulta pública nos termos agendados e em conformidade com a Lei.

O Programa Prosavana não tem legitimidade devido ao incumprimento da lei e pelo facto de ser fundamentadamente rejeitado por amplos sectores da sociedade moçambicana, sobretudo por comunidades e organizações de camponeses do Corredor de Nacala, e dadas as graves irregularidades e potenciais consequências negativas que o mesmo poderá causar em caso de vir a ser efectivamente implementado.

Lamentamos e repudiamos que o Governo moçambicano insista em violar a Lei, opondo-se de forma intolerante aos direitos e conquistas sociais e constitucionais e esteja agora a impor uma parceria triangular com o Brasil e Japão, cujos graves impactos negativos atingirão, directamente, cerca de 4.5 milhões de moçambicanos, sobretudo as populações e comunidades camponesas.

Assim, vimos a público denunciar todo o processo de auscultações públicas do Draft Zero do Plano Director do ProSavana, incluindo a violação dos direitos humanos dos participantes e

– Denunciamos igualmente a forma perversa como o Programa Prosavana tem sido conduzido desde a sua concepção.

– Condenamos a contínua e persistente violação dos preceitos de um processo de construção conjunta de um verdadeiro programa de desenvolvimento da agricultura.

– Rejeitamos a importação de um programa inadequado à nossa realidade que coloca em risco a agricultura familiar camponesa, a soberania alimentar, o equilíbrio ecológico e os direitos das comunidades locais sobre a terra.

Portanto, exigimos que, por um lado, a auscultação pública em questão seja declarada nula e de nenhum efeito pelos fundamentos supramencionados à semelhança das de nível provincial e distrital que já foram realizadas, e que, por outro, todos os documentos metodológicos que orientaram a concepção do Plano Director sejam colocados no domínio público em respeito ao direito à informação e aos princípios da transparência e participação pública nos termos da lei.

Resistiremos sempre!

Por Organizações da Sociedade Civil

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