À medida que a Cimeira Rio + 20 chegava ao fim, pairava no ar um sentimento de tristeza. A primeira Cimeira da Terra tinha sido realizada exactamente à 20 anos atrás no mesmo local no Rio de Janeiro. No passado, em Junho de 1992, os líderes mundiais reuniram e afirmaram o que agora são chamados Princípios do Rio.
Alguns destes incluíam princípios importante e progressistas, tais como a protecção do meio ambiente, o direito ao desenvolvimento, o acesso à informação, a participação das comunidades nos processos de tomada de decisões, estabelecimento de avaliações de impacto ambiental (EIA) para determinar os impactos dos projectos, prioridade especial para os países vulneráveis e em desenvolvimento, e, mais importante, “responsabilidades comuns mas diferenciadas” (CBDR ou RCMD).
CBDR significa que os países do Norte que prejudicaram o ambiente muito mais tem uma responsabilidade maior do que os países póscoloniais do Sul, que ainda não são extensivamente industrializados e cujas populações ainda vivem na pobreza.
Em 1992 o mundo precisava desesperadamente não apenas princípios fortes, mas de implementação eficaz e imediata. Precisávamos de parar urgentemente o desmatamento, a sobrepesca dos oceanos, a queima de combustíveis fósseis, a destruição da biodiversidade, a poluição de rios e solos.
Precisávamos de desactivar grandes barragens e estações de energia movidas a carvão. Nós precisávamos dar opções sustentáveis de energia e água para milhões de pessoas. Ainda assim, 20 anos depois, os danos ambientais são ainda muito maiores e os mais pobres dos pobres estão pior ainda, pelo menos os que conseguiram sobreviver os últimos 20 anos.
Porque é que a crise ambiental está muito mais severa quando a Cimeira da Terra deveria ter melhorado? E porquê, 20 anos depois, estamos agora confrontados com o fracasso da Cimeira do Rio+20? A comunidade mundial tem feito tão pouco progresso desde 1992 que a Cimeira deste ano deveria ter sido chamada de Rio menos 20 e não Rio +20. Parece que foram perdidos 20 anos.
Na verdade parece que foram roubados 20 anos. Roubados do meio ambiente. Roubados das comunidades. Roubados do futuro. Na Cimeira Rio +20, os governos falharam, as empresas reinaram, enquanto as comunidades viram serlhes retirado o chão sob seus pés. Mais uma vez.
Alguns dizem que a Rio +20 foi uma vitória parcial, já que, pelo menos, conseguimos proteger os princípios do Rio 1992, evitando que estes fossem postos em causa. Após 20 anos, será que isto é tudo que podemos desejar? A necessidade de acção em 1992 era imensa e hoje é.
No entanto, estamos felizes porque eles pelo menos reafirmaram as palavras que disseram há 20 anos. Os últimos 20 anos tem demonstrado dolorosamente que essas palavras eram na altura, obviamente, sem significado para os governos e grandes corporações, e hoje continuam sem significado. Será que estamos a ficar habituados a promessas quebradas?
Além disso, esta análise ignora que embora existam alguns princípios progressistas nos Princípios do Rio, há alguns princípios que são regressistas, como por exemplo o principio que dá aos países direitos soberanos para “explorar seus próprios recursos”. Países como Moçambique não se preocuparam com os outros princípios, mas com certeza têm utilizado este princípio. A evidência é a empresa brasileira Vale, que está a destruir terras e comunidades nos seus empreendimentos de mineração de carvão em Moçambique. Por favor, note que, a Vale foi um dos patrocinadores da Rio +20!
No entanto, nem tudo no Rio+20 era sombrio. Na noite de 22 de junho, enquanto a Cimeira Oficial das Naçoes Unidas Rio +20 foi se transformando rapidamente num espaço morto na área da Barra da Tijuca no Rio de Janeiro, onde os líderes mundiais permitiram que a terra fosse lançada por caminhos perigosos, do outro lado do cidade, no Aterro do Flamengo, a Cúpula dos Povos continuou a ser um espaço vivo e vibrante. A Cúpula não era apenas uma alternativa para a conferência oficial da ONU. Era uma alternativa para a forma oficial de pensar que não produziu soluções, somente palavras nos últimos 20 anos.
A Cúpula organizou milhares de diferentes eventos, desde de conversações sérias sobre a oposição a soluções de geoengenharia em grande escala ou grandes barragens ou ainda soluções agroecológicas para o planeta, a pequenos espaços culturais e musicais, barracas de venda de produtos sustentáveis de artesanato local. De 15 a 22 de Junho, dezenas de milhares de pessoas reuniramse no espaço da Cúpula.
Os assuntos principais da Cúpula foram divididos em cinco sessões plenárias: 1 – Direitos por Justiça Social e Ambiental, 2 Defesa dos bens comuns contra a mercantilização da natureza, 3 Soberania Alimentar, 4 – Energia e Indústrias Extractivas, 5 – Trabalho por uma Outra Economia e Novos Paradigmas da Sociedade.
Em cada uma destas sessões plenárias, as pessoas se reuniram a partir de todos os cantos do globo falaram sobre três pilares importantes: as causas estruturais da crise planetária, as falsas soluções vergonhosamente pressionadas pelos governos, empresas e a ONU, e em resposta as soluções e estratégias dos povos para se seguirmos em frente.
Toda esta energia incrível, em seguida, convergiu em três assembleias principais onde se discutiram cada um destes pilares. A última grande Assembleia exaltou as soluções apresentadas pelos povos e as formas para seguir em frente. A cena no Aterro foi eufórica, enquanto milhares se reuniram para marcar o final da Cúpula dos Povos e o início de um longo processo de construção de movimentos populares e de lutas para proteger o planeta.
A Justiça Ambiental (JA!) esteve envolvida na sistematização da plenária sobre Energia e Indústria Extrativa? sistematização significado captar a essência de todos os oradores e preparar os documentos, incluindo a declaração da cúpula. Foi um privilégio ouvir e sentir a força das comunidades afectadas por minas poluentes, extração e processamento de combustíveis fósseis, barragens, usurpação de terra e recursos e empresas brasileiras poluidoras como a Vale, em lugares como Chile e na nossa terra em Moçambique.
Como uma companheira (irmã camarada) da América Latina, disse, esta é uma situação de vida ou morte para muitas comunidades em todo o mundo.
A acumulação de capital e da ganância sem fim de 1% do mundo está a manter refém os restantes 99%.
A JA participou no processo dos organizadores, responsáveis por sintetizar as palavras destes povos fortes e dedicados que falaram na plenário sobre Energia e Indústria Extrativa, e assim criar a nossa visão do nosso futuro.
Apesar da Cimeira Oficial Rio+20 estar já morta à chegada e desiludir por completo o planeta e as nossas gerações futuras, a JA! sentese revigorada por ter participado no espaço vivo do povo e comprometese a continuar as lutas e os esforços para construir o movimento de justiça ambiental global.