Nos últimos tempos, quase todos os moçambicanos que vivem do salário, se queixando do elevado custo da vida, mas por aquilo que percebi são poucos os que sabem porque é que de repente passaram a ser homens e mulheres com bolsos ou bolsas furadas.
Que a vida está pesada para muitos é um facto inegável. Para tentar diagnosticar este problema que se reflecte pelo sumiço do dinheiro nos bolsos da maioria dos moçambicanos, decidi fazer uma aventura investigativa, valendo-me dos parcos conhecimentos económicos que aprendi na escola e de alguns dados visíveis mesmo para quem é leigo em questões económicas ou que não seja economista. Da minha análise apurei como sendo uma das causas o facto de a maioria dos moçambicanos pagar actualmente pelos mesmos produtos básicos quatro vezes mais comparativamente há 15 ou 20 anos. Este é o caso do arroz, cujo preço, há 15 anos, variava de 150 a 300 meticais, em função da sua qualidade, ou seja se era primeira, segunda ou terceira qualidades. Mas hoje o seu preço varia de 600 a 1.200 meticais.
O mesmo ocorre com a maioria dos produtos que integram a chamada cesta básica ou cabaz, e outros que, embora estejam fora deste grupo, são imprescindíveis à nossa dieta e saúde. Com este facto, chega-se facilmente à conclusão que mesmo para os que viram os seus salários aumentar quatro ou mais vezes, esse incremento salarial traduz-se naquilo que em teoria económica se chama de aumento nominal, porque em termos realísticos, o seu salário real é o mesmo que há 15 ou 20 anos.
Assim, para quem há 15 anos ganhava 5.000,00 meticais e que passou a auferir agora 20 mil meticais, continua a auferir o mesmo salário em termos reais, porque a diferença de 15 mil meticais que agora aufere a mais, gasta-os na aquisição do mesmo cabaz que comprava quando ganhava 5.000,00 meticais, ou seja, a mesma quantidade de arroz, óleo, sabão, amendoim, peixe, frango e outros bens básicos. Dito isto de um modo mais simples, este cidadão passou a ganhar mais 15 mil e que somados aos 5 mil que auferia antes, passou a comprar hoje os mesmos produtos que adquiria antes. Assim, apenas teve um aumento de massa monetária e não um aumento real que possa lhe permitir levar uma vida melhor comparativamente há 15 anos.
Na verdade, a vida hoje está um “pesadelo” para a maioria dos moçambicanos, porque sempre que ocorre um aumento do salário mínimo e, por inerência disso, os restantes salários aumentam também numa função exponencial, o que os nossos agentes económicos têm feito é aumentarem também os preços dos produtos básicos na mesma proporção, como se o incremento salarial desempenhasse o papel de catalizador do custo desses bens. Isto mostra que grande parte da nossa classe empresarial é desonesta, para não a rotular com outros nomes que a meu ver lhes seria bem mais merecido.
De resto, não é por acaso que temos hoje simples comerciantes a viverem em majestosas mansões e a coleccionarem luxuosas limousines e outros bens de luxo. É a revelação, isso sim, em ponto grande, do que tiram dos nossos bolsos. Estes comerciantes agem de uma forma oportunística e a prova disso é o aumento imediato do preço dos produtos no mercado sempre que ocorre uma revisão salarial no país, como se o incremento salarial seja um catalizador dos preços dos seus produtos.
O que é espantoso e revelador dessa sua tendência de roubar do bolso dos consumidores, é o facto de a maioria dos produtos a venda, tais como o arroz, ser importado de outros países, daí que não faz sentido que eles aumentem o seu preço logo que haja um incremento salarial, como se os exportadores ficassem sempre atentos aos incrementos salariais em Moçambique.
O dilema de ganhar o mesmo salario quando se tem novas despesas inevitaveis e outras evitaveis
Também cheguei à conclusão que não é apenas o salário real da maioria dos moçambicanos que é matematicamente igual há 15 ou 20 anos porque, como agravante, passaram a ter mais despesas inevitáveis e que não tinham naquela altura. Entre as referidas despesas contamse o pagamento das propinas dos filhos na escola e universidade privadas que há 20 ou 15 anos eram todas públicas e gratuitas, a despesa da consulta nas clínicas privadas e aquisição dos respectivos medicamentos que, nesse tempo das “vacas gordas”, eram levantados gratuitamente nas farmácias dos hospitais públicos, mas que agora são espécie difícil senão rara de encontrar.
Na verdade, esta lista de novas despesas inevitáveis é tão longa que me escuso de enumerar tudo o que agora temos que pagar, mas que nessa altura era de borla ou então pagávamos valores simbólicos, como é o caso das rendas das casas da defunta APIE que as alienou aos privados, e que já são arrendadas a preços de ouro pelas pessoas que as compraram a um preço insignificante. Outra despesa que faz das nossas vidas um verdadeiro inferno é a construção de casa própria, que antes era atribuída pela APIE em troca de uma renda condizente com o que se ganhava e não com o valor do imóvel.
Hoje temos de construí-la por nossa própria conta com o mesmo salário real que se ganhava há 15 ou 20 anos, ou então com base num crédito bancário que nos custa uma pesada letra entre 10 e mais de 20 anos a pagar. Entre as novas despesas que há 20 anos não faziam parte dos nossos gastos, conta-se a compra dos celulares e respectivos créditos que nos permitem falar, combustível para a viatura que antes não tínhamos e que, em muitos casos, adquirimos também através de um empréstimo bancário que nos consome mensalmente o já magro salário.
Na verdade, a letra que resulta de um empréstimo para o chamado consumo é dos piores “cancros” que enfrentamos hoje, porque é o mesmo que passarmos a ganhar menos do que devíamos. Um empréstimo só não é pesado quando se destina a investir num negócio lucrativo e que nos ajuda a amortizar. De contrário, torna-se num fardo para quem se endivida para a compra de um bem, pior para um carro que, além da letra que se tem de pagar, consome combustível e exige uma manutenção periódica.
Mas para que este estudo seja o mais completo possível ou abrangente, há que incluir outros gastos que embora sejam caprichosos, são uma das causas que deixam alguns de nós sem “taco” no bolso, como é caso dos nossos Zumas confessos e não confessos, porque para além das despesas já enumeradas, eles têm outros encargos extras, porque têm de comprar outros celulares e créditos para todas as suas esposas e as suas “catorzinhas”, havendo os que vão muito mais além, a ponto de as comprar também carros e combustível para os terem sempre em movimento.
Mas há 20 anos, as “alfas” e “pitas”, como se chamavam então as concubinas e as “catorzinhas” de hoje, custavam apenas um par de sapatilhas plásticas da marca Melissa, que se compravam então em dólares nas chamadas lojas francas. Contudo, as concubinas e as “catorzinhas” exigem hoje mesadas, propinas, construção de uma casa condigna para elas ou pelo menos uma alugada. Se somarmos as antigas e novas despesas, acabam nos deixando os bolsos totalmente vazios e sem sabermos o que fazer da vida. Isto porque, o que aqui enumerei é apenas uma pequena parte do que temos de pagar todos os dias e meses. Por exemplo, há 20 anos, as pessoas não tinham o desgastante fenómeno do encurtamento das distâncias pelos chapeiros. Só este caso fura os bolsos de muitos moçambicanos, principalmente para os que pagam para si e para os filhos menores que têm de ir à escola todos os dias. Há 20 anos, podia-se viajar com o mesmo valor de um ponto para outro da cidade do Maputo nos autocarros dos TPM, e no caso dos operários e estudantes, desfrutavam de um forte desconto ou tarifa especial que os “chapeiros” agora nem querem sequer ouvir falar.
Que saida perante este beco sem saida?
Na verdade, de um modo geral, não há saída que nos ilibe totalmente da carestia de vida, mas de qualquer modo, é possível reduzir os gastos, limitando o que se tem de comprar. Tudo passa por fazer contas à vida como se sói dizer. Uma das despesas que se pode evitar é a dos celulares, em que um pai ou mãe podem não comprar celulares para todos os seus filhos. Outra saída, no caso dos celulares, é fazer poucas chamadas e optar sempre pelo envio de sms´s ou mesmo voltar a dar preferência ao telefone clássico, o chamado fixo. Para o caso dos bens básicos de consumo, deve-se optar pelos mais baratos mas sem descurar a qualidade.
Por exemplo, o molho de amendoim pode ser um substituto à caríssima carne de vaca e do peixe. Outra das formas de evitar gastos desnecessários é evitar fazer festas onerosas, tais como as de aniversário. Para isso, devemos adoptar o estilo dos ocidentais em que uma festa é mais um convívio de pessoas da família e amigos para celebrar juntos uma data especial e não para esbanjar, e assim evitam incorrer em gastos exorbitantes como é prática em muitas famílias moçambicanas.
Pessoalmente, já estive em festas que me fizeram recordar as famosas ceias dos tempos do Império Romano, em que os convidados tinham de ir aos vomitórios para vomitar o que haviam comido, para abrir mais espaço nas suas barrigas para poderem continuar a comer porque a comida nunca mais acabava. No lugar de fazermos festas sempre que o pai, a mãe ou os filhos completarem anos, poder-se-ia optar por uma única festa de aniversário e nele se fazer a festa de cada um e todos os membros do agregado familiar.
De certa forma, esta prática até dá mais um tom de graça e um ambiente mais festivo do que se gastar muito dinheiro numa única festa de aniversário. Outrossim, em vez de cada membro da família pegar no seu carro mesmo quando todos vão para a mesma direcção e sentido, há que se passar a optar por usar o mesmo carro, para poupar o combustível e minimizar o desgaste da viatura.
Com este modo de vida, chega-se a poupar muito dinheiro num ano, que acaba servindo para aplicar em coisas mais úteis e prestáveis. É imperioso que cada um de nós saiba de cor e salteado a tese de Honeré de Balzac, de que só quem se priva de certas coisas pode poupar. “Vamos a isso gente”, como dizem os brasileiros, porque sem poupança, não há economia familiar e, sem economia das famílias, o próprio país não pode desenvolver, porque é do que se poupa que se pode fazer um investimento.