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Porque é que a África engorda

Modificação de hábitos alimentares, urbanização, ingestão de alimentos nocivos para a saúde… A obesidade ganha terreno no continente africano. Os médicos fazem soar o alarme, porque os riscos estão longe de ser negligenciados. Thiep bou dien (prato nacional do Senegal), alloco (prato dos Camarões) molho óleo de palma…Na África subsaariana, comese gordura e faz-se gala disso. O tradicional “Olá, estás em grande forma física!” é muitas vezes substituído por um firme “Engordaste!”

Num continente onde dormir com a barriga vazia é a sina de grande parte da população, ser gordo é um sinal exterior de boa saúde e de estatuto social. As primeiras preocupações dizem respeito às mulheres, uma vez que culturalmente em muitas sociedades africanas a gordura é, não só uma prova de maturidade e realização, mas também um revelador de beleza.

Na Mauritânia, no Níger e no norte do Mali as raparigas em idade de casar, ao engordarem, tornam-se mais belas aos olhos dos pretendentes, sendo mais fácil atraí-los. Na zona leste da Costa do Marfi m, as novas mamãs são mimadas pela família adoptiva como reconhecimento pelos seus “belos e leais serviços.” “Ser redondinha – não quer dizer ser gorda – faz parte dos valores africanos”, reiteram os fãs incondicionais da beleza negra. “Afugente a tirania da magreza! Saia da estética ocidental que pretende que a mulher seja um arame!” são slogans do “Poog-Beêdré” no Burquina Faso, “Nana Benz” no Togo, “Rainha Hanan” no Benin ou do “Miss Mama Kilo” nos Camarões, concursos de beleza para senhoras de assumido excesso do peso, suscitando tanto entusiasmo e interesse como um desafi o de futebol da Taça das Nações Africanas.

Problemas respiratórios

Para os médicos, é tempo se soar o alarme. Possuir excesso de peso pode provocar graves problemas de saúde. “Um jogador de râguebi e um trabalhador normal podem ambos pesar 120 quilos. Mas se no primeiro caso esse peso é todo em músculos, já o segundo acumula muita gordura, facto que favorece o aparecimento de doenças”, explica o Dr. Léonce Zoungrana, gastrenterologista e nutricionista em Ouagadougou, no Burquina Faso.

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), 44% das diabetes, 23% dos problemas cardíacos e 7 a 41% dos cancros estão directamente relacionados com o excesso de peso e obesidade.

“Actualmente, oito em dez pessoas apresentam problemas de tensão arterial ou insufi ciência cardíaca tendo um peso superior ao normal. Sem contar com doenças como a artrose, a gota…”, explica o médico Kouadio Kouakou, encarregue das pesquisas no Instituto Nacional de Higiene Pública de Abidjan, na Costa do Marfi m. “Grande parte dos meus pacientes tem problemas respiratórios ou tem insufi ciência renal”, refere o médico Zoungrana. Estas patologias que se desenvolvem no continente não podem ser negligenciadas na esperança de vida, que ainda carece de uma grande escassez de especialistas e de infra-estruturas sanitárias.

A África subsaariana é a região do mundo onde proporção de pessoas subalimentadas (265 milhões em 2009) relativamente à população total é a que apresenta números mais signifi cativos: 32%. Os esforços dos governantes estão concentrados na fome e nas doenças relacionadas com uma alimentação insufi ciente, deixando de parte outros aspectos da malnutrição. Durante anos considerado um mal exclusivamente ocidental, estas doenças só há pouco tempo foram incluídas nos programas de saúde pública e desenvolvimento. “A luta contra o HIV/SIDA ou contra a tuberculose monopolizam a atenção dos dirigentes africanos”, adianta o médico Allel Louazani, responsável pelas doenças não transmissíveis no gabinete regional da OMS para África. “Presentemente, esta situação tende a alterar-se.”

Acções de Sensibilização

Esta consciencialização peca por tardia, uma vez que os planos de acompanhamento levados a cabo em 49 países africanos apresentam resultados inquietantes. Na África do Sul, 50% das mulheres com uma idade superior a 29 anos possuem excesso de peso ou são obesas. No Burquina Faso, no Congo, na Mauritânia ou na Suazilândia, as taxas de prevalência vão dos 8 aos 50%, de acordo com um estudo recente da OMS. As primeiras vítimas são as mulheres que representam em certos países cerca de 80% dos afectados por este mal. Embora a África Ocidental já tenha começado a tomar alguma consciência do fenómeno, as iniciativas são ainda muito tímidas.

Diante de elevado aumento de casos de doentes diabéticos e de hiper-tensão arterial, o Ministério da Saúde da Costa do Marfi m lançou recentemente um programa nacional de luta contra as doenças metabólicas, na gaveta desde 2002.

Nos Camarões, associações de mulheres estão a organizar acções de sensibilização, particularmente nos mercados. Esta “crise de excesso de peso” é um fenómeno que se regista principalmente nas cidades – estas concentram 40% da população africana, ou seja, 400 milhões de pessoas – e sobretudo na classe média.

A alteração dos hábitos sociais, económicos e demográfi cos que se registou no decurso dos últimos 20 anos mudou radicalmente os hábitos alimentares dos citadinos africanos. “A urbanização e o crescimento económico conduziram a uma grande diversidade e um acesso muito maior aos alimentos. Esta abundância relativa prejudicou a saúde.

A isso acrescente-se o efeito da SIDA, que se caracteriza por um emagrecimento. Para fugir a esse estigma verifi ca-se uma valorização dos redondinhos”, explica Bernard Maire, director do Instituto de Pesquisa para o Desenvolvimento.

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