Quando não estão na sala de aulas, Nelson e Jossias, residentes na cidade da Beira, dedicam-se à pesca. Ambos trabalham para um cidadão estrangeiro e ganham um baldinho de pescado no valor de 600 meticais. Além das despesas com os estudos, o dinheiro é usado para o sustento diário das suas respectivas famílias. Mas, diga-se de passagem, diante da imperiosa necessidade de ganhar a vida, a escola é colocada, frequentemente, no último plano.
Natural do distrito de Búzi, província de Sofala, Nelson Boaventura, de 21 anos de idade, frequenta a oitava classe. Mora com a mãe e dois irmãos mais novos. O seu pai faleceu há quatro anos, tornando-se, assim, o chefe da família. “O meu pai era a única pessoa que garantia o sustento da família. Quando ele morreu, vi-me obrigado a fazer algo para ajudar a minha mãe e os meus irmãos”, conta.
Com apenas 17 anos de idade e a sexta classe por concluir, Nelson começou a bater portas, porém, nenhuma se abriu. Primeiramente, pensou em começar um pequeno negócio de venda de produtos de primeira necessidade, mas faltou dinheiro para materializar o desejo. Mais tarde, conseguiu um trabalho como empregado doméstico, mas, duas semanas depois, perdeu o emprego por não saber engomar e cozinhar.
“Fiquei sem saber o que fazer. Além disso, era cada vez mais difícil conciliar o trabalho e a escola”, diz. Mas num belo dia, quando passava pela zona da Praia Nova, arredores da cidade da Beira, ouviu falar de que um cidadão de nacionalidade congolesa precisava de um pescador. O jovem não se fez de rogado, tendo aceitado o desafio, apesar de não dispor de nenhuma experiência no tocante à actividade pesqueira.
“Com a ajuda de Jossias, que já era pescador há um ano, conseguiu adaptar-me ao novo emprego”, explica. Ao contrário de Nelson, Jossias Teixeira, de 20 anos de idade, natural da cidade da Beira, é mais experimente na actividade. O jovem começou como ajudante do seu tio e, presentemente, já se sente um grande pescador.
“De vez em quando, eu saía com o meu tio para o mar. Além de ajudá-lo a lançar, puxar e costurar a rede, também vendia o pescado. Em troca, ele dava- me algum dinheiro para comprar os meus cadernos”, conta. Jossias frequenta a nona classe e mora com os seus pais e cinco irmãos no bairro da Munhava.
“O meu pai é desempregado, vende peixe seco aqui no mercado da Praia Nova. Senti a necessidade de contribuir na renda da casa, uma vez que o que ele amealha diariamente não é suficiente para garantir o sustento da família”, explica.
Os estudos em último plano
Nelson e Jossias não pensam em desistir da escola. Eles estudam no período da tarde e, durante as manhãs (e madrugadas), os jovens dedicam-se à pesca. Porém, nos últimos tempos, essa actividade tem vindo a ocupá-los demais e, consequentemente, os estudos são relegados para segundo plano. Devido à ocupação, Nelson reprovou a sétima classe por duas vezes, e Jossias uma vez. Cada um deles ganha um baldinho do pescado (o equivalente a 600 meticais) que conseguem capturar por dia. “Às vezes, quando apanhámos bons peixes, conseguimos mil a 1200 meticais”, diz Jossias. Porém, há dias em que a situação se torna difícil tanto para os pescadores assim como para o proprietário do barco.
“Há vezes em que o nosso patrão investe quatro mil meticais por dia em combustível e nós regressamos do mar sem nenhum pescado. Essa é uma situação complicada para todos nós, mas a culpa não é nossa”, afirma Nelson.

