O crescimento impetuoso em diversas áreas a que se assiste, nos últimos dias, na capital provincial de Cabo Delgado, faz dela uma cidade de contrastes, onde a opulência coabita com a pobreza extrema. Se, por um lado, despontam mansões, resorts, hotéis e condomínios de luxo, por outro, à mesma velocidade, crescem os assentamentos informais em que centenas de pessoas se debatem com a falta de saneamento básico. Eis a nova imagem da considerada terceira maior baía do mundo
Da casa de Xadreque Abdurrazaque Jamal, de 38 anos de idade, tem-se uma vista esplêndida para o mar, mas as límpidas águas e a imagem de navios a passarem não atraem a sua atenção, como o amontoado de lixo com o qual convive lado a lado. Jamal reside no bairro de Paquitiquete, um dos mais pobres da cidade de Pemba. No seu quintal, cercado por estacas de bambu, é impossível permanecer-se mais de 10 minutos, devido ao cheiro intenso dos resíduos sólidos, cuja recolha não se tem feito há bastante tempo.
“Não é só o problema com o lixo, há vizinhos, sobretudo as crianças, que fazem as necessidades maiores à beira da praia”, disse. Aliado à defecação a céu aberto, está o problema relacionado com a falta de água potável e o difícil acesso ao interior daquela zona residencial.
A província de Cabo Delgado é, presentemente, um complexo gigantesco de extracção de gás natural. Devido a esse facto, a realidade na cidade de Pemba começou a mudar, principalmente com a chegada de inúmeras empresas que investem em diversos sectores de actividade, abrindo, assim, perspectivas de melhoria de vida para a população. Contudo, a abundância de recursos minerais não alterou a qualidade de vida dos moradores. “A cidade recebeu e continua a receber muito investimento e, à mesma velocidade, os problemas sociais agudizam-se”, afirmou o economista e docente Casimiro Salvador Sumbane.
De acordo com aquele docente, da mesma forma que os investimentos se foram multiplicando, também cresceu a criminalidade, a prostituição e o comércio informal. “Quem sofre com o impacto deste movimento de grandes capitais é a população mais carenciada, uma vez que não tem sido feito nenhum investimento nas áreas sociais da cidade”, disse Sumbane.
A construção civil é o sector de desenvolvimento mais visível da cidade. Em menos de cinco anos, os espaços vazios da urbe “acordaram” transformados. Um pouco por todo o lado é possível ver obras de construção de hotéis, centros comerciais e habitação, além da reabilitação de alguns espaços de lazer, num ritmo deveras acelerado.
A título de exemplo, no bairro de Expansão, sobretudo à beira da praia, despontam resorts, vivendas e algumas mansões de uma elite emergente, enquanto do outro lado da cidade crescem os assentamentos informais que reúnem todos os problemas que uma zona residencial de construções arbitrárias pode ter, desde a falta de saneamento básico, passando pelo desordenamento territorial até a ausência de centros de saúde. São contrastes de uma das cidades moçambicanas que mais recebem investimentos.
A principal via de acesso ganhou semáforos – outras estão em processo de reabilitação. O tráfego rodoviário ficou mais intenso, até porque a quantidade de veículos aumentou: o número de viaturas triplicou nos últimos anos.
O custo de vida não poupa os moradores
A cidade tem enormes potencialidades para o desenvolvimento do turismo de excelência; porém, este ainda é subaproveitado. O dinheiro que circula pelo efeito do turismo e dos megaprojectos atraídos pelo gás natural arrastam consigo problemas com os quais Pemba terá de lidar nos próximos anos. A subida de preços é um exemplo disso.
Nos últimos dias, o preço de produtos alimentares de primeira necessidade agravou-se. “Uma cesta básica, composta por 25 quilos de arroz, três de feijão, cinco de peixe carapau, dois litros de óleo, um quilo de sal, 10 de farinha de milho, tomate, frango e cebola não custava mais de cinco mil meticais há alguns anos. Hoje, as famílias precisam de, pelo menos, 10 mil meticais para a aquisição da mesma quantidade de produtos”, comentou o economista e docente Casimiro Sumbane, tendo acrescentado que Pemba concorre à categoria de “cidade mais cara do país”.
O sector de restauração não fica atrás. Por exemplo, um frango assado, num restaurante com o mesmo nível de qualidade, que em Nampula não custaria mais de 350 meticais, em Pemba é adquirido a 500.
A informalidade ainda impera
A azáfama nos passeios, ao longo das principais avenidas da cidade, revela diversas actividades informais, praticadas maioritariamente por pessoas oriundas da periferia. “Em qualquer parte do mundo em que uma grande empresa aparece, há sempre muita expectativa por parte da população. Em busca de oportunidades, muitas vezes ilusórias, dezenas de indivíduos migram para a cidade e acabam por engrossar o mercado informal”, disse Sumbane.
Movido pelo aparente desenvolvimento que é apregoado no país inteiro, Chavi Isac, de 26 anos de idade, abandonou a cidade de Quelimane em busca de um trabalho num dos megaprojectos em Pemba. Mas é nas ruas da urbe onde ele ganha a vida, vendendo vestuário e calçado.
O caso de Isac não é isolado. Existem milhares de indivíduos que vivem do comércio informal. À semelhança dos anos anteriores, um pouco por todos os cantos da urbe é comum encontrar pessoas a ganhar a vida recorrendo à venda de diversos produtos como bolinhos fritos, recargas de telemóvel, alface, amendoim, vestuário, entre outros.