A BP e os ‘paraquedas’ dourados. Apesar do alarido, a saída de Tony Hayward de chefe da BP foi habilmente gerida. E outras empresas estão a tentar com mais afinco não recompensar a má gestão.
Quando, no dia 30 de maio, Tony Hayward disse “quero a minha vida de volta”, certamente que perder o emprego como chefe da BP não seria o que tinha em mente. Mas, a 27 de julho, aceitou o inevitável. À sua conta, um número incalculável de litros de petróleo derramados no Golfo do México. Quando os microfones eram ligados, as gafes brotavam dos seus lábios. Em relações públicas era um desastre total, e tinha mesmo de ir embora.
O seu substituto será outro veterano da BP, Robert Dudley, um americano que cresceu no Mississípi. Dudley também já teve os seus problemas de relações públicas. Enquanto chefe da BP-TNK, uma joint-venture na Rússia, teve um desaguisado com os sócios russos da BP e saiu do país no meio da confusão que se seguiu à busca que os serviços de segurança russos fizeram ao escritório da BP em Moscovo. Contudo, não será isto que fará com que os americanos pensem mal dele. A
BP escolheu judiciosamente o momento para agir. O poço está selado. Chegou a um entendimento com o Governo americano. Se a administração tivesse chamado uma cara nova demasiado cedo podia atrair lama. Em vez disso, Dudley está bem colocado para conduzir a BP para fora do buraco.
No dia 27 de julho a empresa anunciou um prejuízo recorde de 13 mil milhões de euros, consequência de uma despesa excecional de 24,5 mil milhões de euros para limpar o derrame de petróleo, compensar as suas vítimas e pagar as multas. A empresa terá que vender mais de um décimo dos seus ativos para cobrir o prejuízo, mas vai sobreviver.
Hayward receberá uma indemnização equivalente a um ano de salário (cerca de 1 milhão de libras ou 1,23 milhões de euros) e o direito de começar a levantar dinheiro de um fundo de pensões avaliado conservadoramente em 13 milhões de euros. (Pode também tornar-se diretor não-executivo da BP-TNK, que é talvez o mais próximo a que a BP pode chegar de o mandar para a Sibéria).
Este “pagamento por fracasso” suscitou indignação: “Compensação de 14 milhões para o ‘capitão ignorante'”, indignava-se um cabeçalho igual a muitos outros. Edward Markey, congressista, lamentou as “generosas indemnizações de muitos milhões de dólares” (os “paraquedas dourados”, na expressão dos americanos). Isto é injusto. Hayward trabalha na BP há 28 anos, a maioria deles com sucesso. Pelo menos metade da sua pensão foi ganha antes de se tornar presidente. E a queda abrupta do valor das ações da BP fez desaparecer do seu prémio de rescisão como CEO a parte correspondente ao seu património financeiro em ações – um castigo significativo.
Não obstante, a história suscitou uma discussão necessária sobre como evitar recompensar a má gestão. A crise financeira revelou que os banqueiros de topo recebiam remunerações fabulosas por fazerem aquilo que se descobriu ser um péssimo trabalho. Alguns embolsaram gratificações desmesuradas quando falsamente pareciam estar a trabalhar bem e depois ficaram com grande parte do espólio quando as suas empresas entraram em colapso. Por vezes, outras indústrias também pagam generosamente o fracasso. Não são só os políticos críticos destes negócios que acham isto escandaloso.
“Se eu mandasse”, resmungava em janeiro o investidor Warren Buffett, “quando um banco tivesse de ir pedir ajuda ao Governo, o CEO e a sua mulher perderiam todo o seu património líquido”. Tal poderia satisfazer o apetite do público pelo sangue dos executivos. Mas é altamente improvável que aconteça. “Os conselhos de administração sentem grande embaraço em despedir o presidente e como o dinheiro não é deles, têm tendência a ser generosos”, diz Nell Minow, da Corporate Library, uma empresa de análise da política de governo das sociedades.
É raro que os presidentes incompetentes sejam despedidos. Em vez disso, é-lhes normalmente permitido que se reformem ou se retirem com dignidade, e em geral com muito dinheiro. Esta cultura de solidariedade será difícil de anular, principalmente porque a maioria dos membros dos conselhos de administração são atuais ou antigos diretores-gerais e sentem que também pode chegar a sua vez. Mais importante ainda, levar à ruína os chefes incompetentes é uma má ideia. Quem quereria aceitar um emprego a que estivesse associado o risco sério de destruição financeira?
Quem o aceitasse, certamente que iria gerir as coisas de forma a minimizar o risco de falência catastrófica. Isto soa otimamente até nos lembrarmos de que o capitalismo depende da aceitação do risco. “Se o fracasso for penalizado com demasiada dureza, o risco é criarmos burocratas”, diz Ira Kay, da Pay Governance, uma consultora de remuneração de executivos.
Os paraquedas de bronze também servem Abolir todos os “paraquedas” dourados seria uma burrice. Muito melhor é planeá-los de forma inteligente. Devem ser suficientemente generosos para levarem um chefe sem valor a sair sem criar confusões nem processos judiciais, mas nada mais do que isso. O presente de despedida da BP para Hayward parece mais ou menos justo. Se fosse presidente de uma empresa americana, teria certamente partido com muito mais.
Ken Lewis obrigou o Bank of America a engolir os produtos tóxicos da Merrill Lynch, mas ainda assim embolsou quase 96 milhões de euros quando saiu no ano passado. Bob Nardelli depositou na sua conta bancária cerca de 160 milhões de euros em 2007, após um reinado de seis anos a desvalorizar a Home Depot. Na Grã-Bretanha, o abuso de “paraquedas dourados” foi drasticamente reduzido na década de 1990 com as reformas na política de governação das sociedades, anunciadas pelos códigos Cadbury e Hampel para as sociedades anónimas.
“A norma na Grã-Bretanha para as indemnizações em caso de demissão é um ano de salário, dois em casos excecionais, o que é muito menos do que a norma na América”, diz Paul Hodgson, da Corporate Library. Também não existe o direito às opções de compra de ações como parte do processo de afastamento, como sucede nos Estados Unidos.
Durante a crise financeira, Hodgson calculou que o despedimento dos grandes patrões dos bancos britânicos teria custado apenas alguns milhões de libras cada, ao passo que despedir os titãs da Wall Street teria custado centenas de milhões de libras por cabeça. Na sequência da crise financeira, estão em curso esforços para tornar mais difícil que os maus gestores recebam uma fortuna pelo seu afastamento. Alguns contratos incluem cláusulas de “restituição” que permitem que pagamentos relacionados com o desempenho sejam recuperados, caso o desempenho que foi recompensado se revelar pior do que parecia na altura da rescisão.
Contudo, até agora não foi registada qualquer restituição por parte dos grandes patrões mal-sucedidos de Wall Street, embora titãs como Richard Fuld, da Lehman Brothers, tivessem levado consigo fortunas que agora parecem injustificadas, salienta Hodgson.
Uma segunda alteração poderá ter mais impacto: a exigência, que consta da recente lei americana sobre reforma financeira, de que os acionistas votem a remuneração dos executivos, incluindo os paraquedas dourados. Não seria má ideia se obrigassem as empresas americanas, pelo menos a este respeito, a copiar a denegrida BP.