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SELO: Os caixões de Juga Juga – Escrito por Celsio Bila

Há muito tempo, nos tempos dos crocodilos, havia um terreno aparentemente baldio,naquela zona que hoje pertence ao posto administrativo da Machava. As aparências eram tais que indicavam para um total estado de abandono. Foi quando um senhorio pávido, vendo a situação, teve a brilhante iniciativa de requerê-lo ao município, mesmo que isso custasse-lhe fortuna. Afinal, o senhorio para além de crocodilo era burguês. Aliás, estás duas características juntas garantem poder eterno.

Não demorou, o seu pedido foi prontamente deferido, como que de magia, e passou a ostentar a titularidade do espaço. Entretanto, ao fazerem as limpezas os seus capatazes descobriram que no local havia inúmeras campas, algumas acabadinhas de fazer e outras, nem tanto. Estes foram de imediato informar ao senhorio o que viram. “E agora?” Pensou o senhorio em voz alta e tratou de ordenar os capatazes, no sentido de se encontrar o presumível “dono” das campas.

Mais tarde, os capatazes, em número de três, encontraram uma velhinha nativa, de rugas incontáveis no rosto, que de joelhos ornamentava alguma campa com flores, cantando canções típicas. Da interlocução havida, a mesma arrogou ser proprietária daquela parcela de terra, porquanto herdara dos seus ancestrais que ali jazem a anos, mas não apresentou título nenhum, pois não tinha. Acrescentou que há uma semana atrás enterrou seus familiares ali, 5 membros jovens, vítimas de acidente de viação, transporte semi-colectivo, que vulgarmente chamavam “chapa”.

“Meus senhores, eu não sei como as coisas são agora? Ninguém controla a ninguém e o resultado é este. Desgraça para as famílias! O pior de tudo é que a informação só choca as pessoas quando sai na mídia. Dois dias depois todo mundo esquece e os chapas voltam as suas gincanas!”. Dizia a velhinha toda melancólica e em cólera a aqueles senhores que a questionaram sobre a titularidade daquele terreno.

“Sobre o terreno, se querem saber mais venham a minha casa mais tarde, porque os meus filhos, aqueles que herdarão também este cemitério familiar e cuidarão dele tal como eu, estão neste momento nos serviços.” Continuou a velhinha e tratou de explicar o seu endereço. Face ao conflito iminente, os capatazes foram a correr informar ao patrão do que estava a acontecer.

“Eu não falo com o cão mas com o seu dono”. Disse o senhorio aos mesmos e tratou imediatamente de recorrer a entidade que lhe atribuíra o título e ao tribunal, que foram unânimes quanto ao reconhecimento de que o direito de uso e aproveitamento da terra pertencia a este. Na verdade, não se vislumbrava outra solução, até porque ele contratara os melhores advogados da praça que anteviram junto da teia a viabilidade do caso.

“Não se preocupe, caso ganho, pois, para além de que nós temos o título, os decisores somos nós.” Dizia um deles e seguiram-se gargalhadas, brindando com o melhor do whisky que podiam.

Ora, de galho em galho a saga seguiu, e como forma de pressionar a Ré (foi assim apelidada nos autos judiciais), achando ele e seus advogados que todos mecanismos se mostravam pouco céleres para o tão almejado despejo dos usufrutuários, numa bela manhã, trataram de ir deixar caixões ao local, em número de tantos iguais aos das campas que ali estavam. Foi ai que, perante tal situação, o caso veio a ribalta e a comunidade em geral dividiu-se entre moralistas, populistas e legalistas, para se digladiarem aos montes.

“A justiça é corrupta. Ora, é de lei, cumpra-se na íntegra. Ora, isso que se fez é imoral, etc.” E assim se discutiu na busca da razão, mas o certo é que o terreno, para o desgosto de uns e delírio de outros, foi entregue a quem tinha o título, através de uma execução da sentença. NB: Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência!

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